Comentário sobre a postagem SONIA REGINA – SANTOS-SP
Kristina:
Lembrei de uma estória antiga do Patativa do Assaré, o poeta nordestino.
Estando preso numa delegacia por ter feito e cantado uma musica criticando o prefeito, viu um canário, preso numa gaiola, de propriedade do delegado.
Então escreveu essa jóia:
“Eu preso por cantar e o canário preso para cantar”
* * *
Nota da Editoria:
O passarinho a que se refere a leitora não era um canário. Era uma patativa.
Abaixo estão os dois poemas.
O primeiro é a crítica feita por Patativa do Assaré ao prefeito da sua cidade, Assaré, que o levou à prisão.
E o segundo foi feito quando ele viu uma patativa numa gaiola na sala do delegado.
Nesta vida atroz e dura
Tudo pode acontecer,
Muito breve há de se ver
Prefeito sem prefeitura.
Vejo que alguém me censura
E não fica satisfeito,
Porém eu ando sem jeito,
Sem esperança e sem fé
Por ver no meu “Assaré”
Prefeitura sem prefeito.
Por não ter literatura
Nunca pude discernir
Se poderá existir
Prefeito sem prefeitura.
Porém mesmo sem leitura,
Sem nenhum curso ter feito,
Eu conheço do direito
E sem lição de ninguém
Descobri onde é que tem
Prefeitura sem prefeito.
Ainda que alguém me diga
Que viu um mudo falando
E um elefante dançando
No lombo de uma formiga
Não me causará intriga,
Escutarei com respeito,
Não mentiu esse sujeito,
Muito mais barbaridade
É haver numa cidade
Prefeitura sem prefeito.
Não vou teimar com quem diz
Que viu ferro dar azeite,
Um avestruz dando leite
E pedra criar raiz
E um rio fora do leito,
Um aleijão sem defeito,
Um morto declarar guerra,
Porque vejo em minha terra
Prefeitura sem prefeito.
* * *
Patativa descontente,
Nessa gaiola cativa,
Embora bem diferente,
Eu também sou patativa.
Linda avezinha pequena,
Temos o mesmo desgosto,
Sofremos a mesma pena,
Embora em sentido oposto.
Meu sofrer e teu penar
Clamam a divina lei.
Tu, presa para cantar,
Eu, preso porque cantei
Patativa do Assaré (1909-2002)