XICO COM X, BIZERRA COM I

MEUS FRANCISCOS

A todos chamo Chico,
os santinhos do meu altar.
Está sempre ao lado de um bichinho:
cachorro, gato ou carneiro.
Em seu terreiro,
um passarinho, sempre
(acho que ele gostava de música) …

Assim são meus Santos.
Uns de barro, ou de madeira,
até de papel machê,
alguns pintados, na parede pendurados,
e outros mais nem sei do quê …
Mas todos meio carecas
e de roupa marrom que,
não sei a razão, atrai o canto dos pássaros
(acho que ele gostava de música, sim!) …

Tem uns que dormem, preguiçosos.
outros, de seus ofícios ciosos,
mas nunca sós,
cuidando dos bichos e de nós …

Dizem que viveu em Assis. Sei lá!
Não me importa de onde veio,
Se da Italia, ou de Canindé,
Nos cafundós do Ceará.
Basta-me sua proteção,
tê-lo aqui junto de mim.
Qualquer que seja seu canto
será meu Francisco santo …

São todos Xicos, como eu …
É o Santo que me acode
Quando a vida ‘dá um bode’ …
(A propósito, nenhum tenho ao lado de um bode.
Acho que ele gostava mais
do cantar dos Passarinhos que do berrar dos bodes.
Não fosse o meu Santo tão Santo
ia pensar que ele é preconceituoso).

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SAFADEZA EXPLÍCITA

Cansado de tanta grosseria, ameaça e cadeirada, Zé desliga a TV e vai à banca da esquina comprar uma revistinha de safadeza. Não tão explícita quanto a vista naquele ‘debate’ político.

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MEUS BREVES CONTOS – CONTO 6

O PILOTO

Era um piloto promissor, ainda que imensamente sem sorte.

Em seu breve currículo constam 17 decolagens e apenas 16 pousos. . .

* * *

Todos os Livros e a maioria dos Discos de autoria de XICO BIZERRA estão à disposição para compra através do email xicobizerra@gmail.com. Quem preferir, grande parte dos CDs está disponível nas plataformas digitais. 

Nossos CDs estão nas plataformas virtuais e, em formato físico, na Loja Passadisco do Recife.

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O VOTO É SECRETO, MAS MEU BUCHO É DE PIABA …

Minha mais recente música, um samba composto em parceria com o amigo Bráulio Medeiros, fala das dificuldades do ser humano diante da necessidade de tomar decisões no decorrer da vida. Diz assim, em sua primeira estrofe:

‘Não sei se vá de sandália ou calce um sapato,
Nas férias se vou pra Itália ou fique no Crato
A vida é feita de escolhas
A gente tem que escolher
Pra onde ir e o que fazer …
Se peço uma feijoada ou coma um sushi,
Se beba uma cerva gelada ou tome um açaí’

E por aí vai …

A ideia é reforçada no período eleitoral. Voto no Recife e na pesquisa para escolher meu candidato, dei-me ao trabalho de pesquisar os 1.311 nomes dos concorrentes, não apenas no Recife, mas também em Jaboatão e Olinda e descobri algumas preciosidades na identificação dos disputantes:

AFONSO QUE FAZ, CÓ DO POVO, LU DO PRU, TADINHO JOÃO, BLACK CELL, CIDA A BRUXA, FAZ TUDO, MANÉ MAGO, ARUÁ DO GÁS, ELAS NO PODER, EDINHO DOIDO e ME AJUDE POR FAVOR.

(restringi a citação a apenas 4 exemplos por cidade para não tornar demasiadamente grande este meu escrito, evitando mencionar partidos e números dos pleiteantes).

Chamou minha atenção o número exorbitante de ‘discípulos de Cristo’ querendo uma ‘boquinha’ na Câmara: Acho que ser político está dando mais dinheiro que explorar a fé alheia usando a religião. Está sendo mais lucrativo ‘servir ao Povo’ que ‘servir a Deus’. Nos três municípios, 88 concorrem à vereança utilizando suas funções litúrgicas precedendo o nome: Irmãos e irmãs, missionários e missionárias, pastores e pastoras, além de 1 bispo e um diácono, sem contar filhos e filhas dos que já desfrutam de mandato ou outros que apenas se denominam ‘Fulano(a) da Igreja’. Há família que já conta com até 4 membros desenvolvendo atividade política e ainda querem mais 1 na lista.

Outro fato curioso é o número elevado de militares pretendentes a trocar a caserna por um gabinete refrigerado nas Câmaras Municipais (são 21 casos). Um verdadeiro ‘batalhão’, de Soldado a Coronel, pleiteando uma vereança. Deve ser bom ser Vereador.

Não fica só aí: A utilização de ‘do Povo ‘ após o nome é prática usual. São 25, ao todo, nos três municípios. Certamente, é a certeza de que o povo gosta de quem usa seu nome em vão nas campanhas. Merece, para deixarem se ser bestas, que esses falsos ‘populares’ sejam eleitos.

De minha parte está resolvido. Vou exercer meu direito de votar … Ante todo o fisiologismo, o clientelismo, a corrupção brabíssima e a prevalência dos interesses pessoais em detrimento do coletivo, meu voto deixa de ser secreto e é aqui revelado: resta-me apenas optar entre o Pastor BRANCO, o Capitão NULO ou o Abstenção DO POVO …

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MANÉ PEREBA ou ATELIER CAPILAR DU MANET

Fiquei estarrecido. Meu amigo pagou 120 reais pra fazer barba e cabelo em uma dessas barbearias modernas que estão na moda. E ainda teve que agendar o horário com uma semana de antecedência. Deus me defenda. Mané Pereba, no mercado público perto de minha casa, cobra $8 – se o cliente ficar em pé e $10 – se sentado em confortável tamborete. Agora ‘tá cobrando uma taxa extra de 1 real por conta do ventilador, última geração, instalado no salão. E ainda tem o brinde de aparar o excesso de cabelo nas sobrancelhas, nas orelhas e na venta, como cortesia. Sem esquecer que para os carecas o serviço é grátis.

O apelido se deve a uma pereba crônica em sua mão esquerda, decorrente de um corte de sua própria navalha, quando se iniciou na profissão. Ressalte-se que em nada o fato interfere no bom desempenho de seu ofício. Faz 19 anos que corto o cabelo com Mané e não me arrependo, apesar de eventuais cortes desnecessários ao longo da trajetória. Mas faz parte.

Tentei convencer meu amigo a experimentar Mané, mas até agora ele resiste. Besteira dele, ‘tá gastando dinheiro à toa. Fui lá, paguei a menor taxa e conheci Mané Perebinha, herdeiro profissional do pai, iniciante no metier, mas já demonstrando talento. Cortei com ele e fiquei satisfeito. Mais teria ficado se não tivesse saído de lá com dois caminhos de rato na minha já não tão vasta cabeleira. Mas é do jogo. Afinal de contas, economizei 110 contos. Na média, uma economia de 55 contos em cada um dos cortes, cabelo e barba.

O salão de Mané fica vizinho ao do senhor que conserta relógios e em frente ao do sapateiro. O alfaiate, que ficava ao lado, fechou as portas. Hoje tem lá um consertador de celular. Tomara que Perebinha resista aos avanços modernos atuais, siga os passos do pai e que não exija agendamento para futuros cortes.

Registro que Mané faz jus, com todas as honras, aos dizeres de Amara Brotinho, uma puta que ganhava a vida honestamente, dando duro nos cabarés de Palmares nos anos 60, personagem de Luiz Berto no seu Romance da Besta Fubana: “Pra adular macho melhor do que eu, só se for barbeiro, que raspa, alisa a ainda bota perfume.”

Em minha última visita, enxerido como sou e lastreado por quase 20 anos de freguesia e milhares de fios de cabelo lá deixados, sugeri a Mané uma expansão de suas atividades, em bairro nobre do Recife, instalando as modalidades UNISSEX –para cortes femininos e a KIDS, para atendimento do público infantil. Até o nome tive a audácia de aconselhar, baseado em troca de ideias com a Inteligência Artificial: seria ATELIER CAPILAR DU MANET. Ele olhou para mim, com cara de pouquíssimos amigos, e retrucou:

– Não tem quem faça eu atender ao seu pedido. Isso é coisa de francês com a testosterona fraca. Permanecerei, até Deus permitir, com a placa aí de fora: SALÃO DO MANÉ.

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O QUARTO JESUS

Bem feito para mim. Quem mandou passar na calçada da Igreja? Por castigo, fui abordado por uma jovem, cabelos presos, vestido escondendo os joelhos, sem decote, mangas nos cotovelos, perguntando se eu queria conhecer Jesus. Meio por maldade, meio por vingança, antecipei a conversa e disse-lhe, com o maior malfazejo:

– Quero não, moça. Já conheço três cabras com esse nome. Suficienta-me (acho que ela sequer entendeu minha mania besta de usar neologismos).

Um, o irmão do Cauby, filho de seu Júlio da bodega da esquina lá de casa. Ele, o pai, bruto e grosso que só papel de embrulhar prego, óculos fundo de garrafa, não-parecido, nem de longe, com o Carpinteiro José. Seu filho, entretanto, uma doçura de pessoa, elegante e solícito, às vezes toca violão e faz serestas. De incomum com o Jesus de verdade, é ateu convicto.

O outro, Jesus Santiago Frazão, foi quem me deu posse no Banco Central, em Fortaleza, longínquo 77, século passado. Baixinho, careca, imberbe, em nada se assemelha ao homem de Nazaré, do ponto de vista fisionômico. Mas é um sujeito bom, decente, do bem. Aos sábados, jogávamos futsal na quadra do Colégio Cristhus.

E o terceiro é um de Acari, filho de dona Ritinha de Miúdo e dela herdou o nome – Jesus de Ritinha de Miúdo. Este, nunca fez milagres na vida ou proferiu parábolas, mas é um Poeta imenso, dos grandes. Suas curas se dão através da Poesia, seus ensinamentos vêm dos versos, incontestáveis milagres.

Foi quando a moça demonstrou não estar gostando de minha conversa, deu-me as costas, numa rabissaca humilhante e partiu em sentido contrário ao meu, com seus cabelos presos, vestido escondendo os joelhos, sem decote, mangas nos cotovelos e, só aí percebi, carregando um livro de capa preta embaixo do sovaco. Acho que falando desse outro tal Jesus … Bem feito para mim.

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DA SÉRIE: MEUS BREVES CONTOS

CONTO 5 – POSTES BÊBADOS

Estava tão bêbado que até os postes mais sóbrios cambaleavam à sua frente, bêbados que pareciam estar. Ainda assim, seguiu ao encontro dela, daquela que lhe fazia beber. Sua alma não era pequena – veio-lhe Pessoa à mente. Jogaram as farpas e senões na lixeira mais próxima e viveram uma noite feliz. Dia seguinte, ele e os postes, não mais bêbados, acordaram de ressaca …

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A PIPA COLORIDA

Acordei com o barulho do vizinho reclamando de algo que pousara em frente a sua casa. Era Ícaro na ponta dos dedos de uma criança das redondezas. Seu objeto voante ia alto, como que viajando, estendido ao vento, rumo ao sol. Sem cerol, para que mais leve fosse, levava o menino ao infinito do céu. Seguia agarrada pelo barbante dos sonhos. Aos seus olhos, a pipa passeava alto como se passarinho fosse. E quase era. Apenas não sabia cantar. Nem precisava, tão bela era aquela coisa colorida e voadora. Até que, fantasia interrompida, linha cortada, veio pousar, distraída e lentamente, nas plantas do jardim de meu vizinho chato e implicante … Pior: sequer estava florado o seu pé de manacá em que aquela arraia aterrissou. Recolhi-a, à espera que o seu dono a procure. Jamais permitirei que se imiscua da grosseria e brutalidade adulta esse tão puro sonho infantil.

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VIDA: DÁDIVA ou DÍVIDA?

(Assim Miró Mirava a Vida)

Ouvi dizer que a vida é uma dádiva de Deus.
Ou seria uma dívida a saldar com o Divino?
Precavida, minha amiga,
vivida e ávida por saber, pergunta:
– Há vida no pós-vida?
– Qual o PIX de Deus?
– Essa dívida pode ser dividida?
Dúvida válida, devida.
Alguém duvida de minha atrevida amiga?

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O BURRINHO AZUL DE CECÍLIA

O menino, finalmente, encontrou o burrinho azul com que tanto sonhara. Do jeitinho que ele queria: um animalzinho manso, que nunca aprendeu a correr ou a pular e, como que engasgado com uma matraca, conversador que só. O bichinho pequeno e belo sabia tudo, como tudo se chamava e ensinou ao menino o nome dos rios, dos pássaros e das flores … Não bastasse tanto, na hora de dormir o burrinho azul contava histórias bonitas e o menino sonhava com anjos também azuis bebendo água em taças de paz. E no jardim longo e florido em que se transformou sua estrada, o menino, agora também azul, contava aos quatro cantos do mundo a alegria de ter encontrado aquele amigo com quem Cecília Meireles um dia sonhou, azulzinho ora da cor do céu, ora da cor do mar. Ele existe, sim. Basta sonhar e todos os burrinhos se tornam azuis, todas as estradas se enchem de flores e todas os homens bebem água em taças de paz. E não faltarão histórias bonitas na hora de dormir. Ainda bem que existiram Cecília e seu burrinho.

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