Em março de 2003 desembarquei no aeroporto de Detroit, Michigan, para um trabalho de uma semana em uma empresa fabricante de ferramentas que ficava em Troy, ao norte da grande e famosa cidade. Era um domingo e o então presidente George W. Bush tinha mandado bombardear Bagdá, a capital do Iraque, no dia anterior, limpando o terreno para a invasão terrestre.
Do aeroporto até o hotel usei uma perua do próprio Holiday Inn que buscava os hóspedes que chegavam. O motorista era um esfuziante jovem de seus 20 anos, atlético, cabelo escovinha, saradão, sonho suspiroso dos moços de Pelotas, todo orgulhoso da demonstração do poderio aéreo dos americanos, mostrado para toda a nação ao vivo na noite anterior: o céu riscado de foguetes, as brilhantes explosões, o povaréu correndo, os carros pegando fogo – parecia o fim do mundo retratado nos filmes de Hollywood. O nosso rapagão estava quase explodindo de tão cheio de gás patriótico:
– O senhor viu na televisão? Despejamos um buzilhão de foguetes sobre esses terroristas iraquianos. Somos os maiores, os melhores, os mais poderosos, a maior nação do planeta! Vamos reduzir o Iraque e seus camelos a pó para que Saddam Hussein nunca mais se meta conosco!
Minha reação foi fria. Afinal, eu não era americano e nem a guerra do Bush me interessava. Não esbocei nenhum som a não ser um “arran”.
Era visível que eu não me entusiasmava com seu eloquente discurso. Ficou então sério e perguntou:
– O senhor por acaso é iraquiano?
– Não, respondi. Sou brasileiro.
– Ah!
E após uns cinco minutos de um silêncio constrangedor perguntou:
– E o Brasil fica perto do Iraque?
Disse-lhe que não, o Brasil fica mais perto dos Estados Unidos que do Iraque. Nosso jovem americano me parecia mais ignorante que a Benedita da Silva.
E após outros minutos de silêncio, com a cara mais idiota que a do Marcelo Freixo, observou:
– Continuo sem saber onde fica o Brasil. Meu conhecimento de geografia é muito limitado. Só sei que o Canadá fica ao Norte, porque de lá é que vem o frio, o México fica no Sul, porque de lá é que vem os imigrantes ilegais, e Cuba fica perto de Miami, porque aquela cidade está infestada daqueles malditos cubanos.
Felizmente chegamos ao hotel e, muito a contragosto, encerramos a nossa erudita conversação.