PEDRO MALTA - A HORA DA POESIA

ATITUDE – Jenário de Fátima

Talvez amor, talvez certo não desse…
O que sonhamos pra nós dois um dia.
Talvez apenas fosse Fantasia,
Destas de quem ama borda e tece.

Contudo amor, a gente envelhece
(… decerto envelhecer não se podia)
E a vida vai ficando mais vazia
Justo quando do amor se mais carece

E vem a noite amor, então sozinho
Ficamos a pensar quantos caminhos
Não fomos por faltar-nos Atitude.

E o preço caro agora que pagamos
É este de achar sempre que estamos
Num mundo em que já nada mais ilude.

Colaboração de Pedro Malta

PEDRO MALTA - REPENTES, MOTES E GLOSAS

GRANDES MOTES, GRANDES GLOSAS

Oliveira de Panelas, grande poeta cantador pernambucano da atualidade

* * *

Oliveira de Panelas glosando o mote:

Na porta do cu do dono

Essa rôla antigamente
Vivia caçando briga
Furando pé de barriga
Doidinha pra fazer gente
Mas hoje tá diferente
No mais profundo abandono
Dormindo um eterno sono
Não quer mais saber de nada
Com a cabeça encostada
Na porta do cu do dono.

Já fez muita estripulia
Firme que só bambu
Mais parecia um tatu
Fuçava depois cuspia
Reinava na putaria
O priquito era seu trono
Trepava sem sentir sono
E sem precisar de escada
Mas hoje vive enfadada
Na porta do cu do dono.

Nunca mais desvirginou
Uma mata vaginosa
Há muito tempo não goza
A noite de gala passou
Vive cheia de pudor
Sonolenta e sem abono
Faz da ceroula um quimono
E da cueca uma estufa
Vive hoje à cheirar bufa
Na porta do cu do dono.

* * *

Carlos Severiano Cavalcanti glosando o mote:

Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

Fui ao silo e tirei toda a semente
que restava guardada há mais de um ano
e saí a plantar em solo plano
na esperança de inverno consistente.
O trovão ribombou e de repente
envolvi-me no som da trovoada.
O riacho rosnando na enxurrada,
o meu milho pouquinho semeado.
Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

Trinta dias depois da plantação
eu gostava de ver meu milharal
verdejante, brilhando, colossal,
alegrando meu frágil coração.
Fiz a limpa primeira na intenção
de arrancar todo o mato usando a enxada,
começava a limpar de madrugada
sem contudo sentir-me mais cansado.
Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

O pendão começou a tremular,
quando o sol assumiu a dianteira,
a trocar chão molhado por poeira,
a neblina deixou de borrifar,
a lavoura teimava em não murchar,
mas a haste do milho, já envergada
pendurava a boneca atrofiada
enquanto eu contemplava amargurado.
Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

Perdi tudo o que tinha de semente,
não deixei transformá-la no cuscuz,
carreguei cabisbaixo a minha cruz,
enfrentei a dureza do sol quente,
vejo agora o sofrer da minha gente
sem destino na terra desolada,
transeunte nas margens de uma estrada
indo à toa, sem rumo, em qualquer lado.
Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

Vejo a barra ao quebrar e fico atento,
para ver se a invernada inda retorna,
entretanto, a manhã já nasce morna,
o que traz para mim um desalento,
desespero ante a dor desse momento,
minha casa sem luz, vive apagada,
o sertão vendo a flora incinerada,
o seu povo sem rumo e flagelado.
Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

Já não ouço o cantar dos rouxinóis,
não escuto o arrulhar das juritis,
raramente ouço poucos bem-te-vis,
saltitantes nos galhos do cipós.
No horizonte tem mais pores de sóis
inundando de luz toda a chapada,
a paisagem cinérea iluminada
quando a lua esparrama o seu dourado.
Eu plantei em janeiro o meu roçado,
mas a chuva faltou, fiquei sem nada.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

VIOLANTE PIMENTEL - CENAS DO CAMINHO

“E O DESTINO DESFOLHOU”

Esse é o título de uma linda valsa, uma das preferidas do meu pai. Quando eu era menina, sempre o ouvia solfejá-la. Descobri agora, pesquisando, que é da autoria de Gastão Lamouner (1893-1984) e Mário Rossi (1911-1981) – gravação de Carlos Galhardo (ODEON- 1938).

Houve uma época, quase na década de 60, em que estava na moda as moças estudarem acordeon (sanfona). Em Nova-Cruz, foi uma verdadeira “coqueluche”. Minha mãe comprou uma sanfona para a minha irmã Ana Maria e contratou o Mestre da Banda de Música de Nova-Cruz, para ministrar aulas a ela e à outra minha irmã, Valéria. Elas estudavam pelo “Método de Acordeom”, de Mário Mascarenhas”. Nesse Método, entre inúmeras músicas, também constava a valsa “E o Destino Desfolhou”, de que meu pai tanto gostava.

Por ser eu a caçula, ou talvez por economia, não fui matriculada na aula de sanfona. Tampouco, podia chegar perto dela, com a desculpa das minhas irmãs de que eu iria desafiná-la.

Irmã caçula sofre muito…Todos achavam que eu era muito criança para estudar acordeon. Sentindo-me injustiçada, quando eu me via sozinha em casa, a primeira coisa que eu fazia era colocar a sanfona no colo e tentar aprender a tocar de ouvido. E aprendi a tocar, quase com perfeição, todas as músicas que minhas irmãs estudavam pela partitura,com aulas diariamente, das 13 às 14 horas. Eu me “babava” de inveja, mas não tinha coragem de reclamar. Só não entendia por que não me foi dado o direito de também estudar acordeon. Seria pecado ser caçula??? Mas isso não me impediu de aprender a tocar, mesmo de ouvido.

Conheço pessoas que só tem orelha. Mas tenho certeza de que, além de orelha, eu também tenho “ouvido”. E dei prova disso. Aprendi a tocar sozinha. Aliás, o Nordeste é berço de excelentes sanfoneiros, que aprenderam a tocar sozinhos, de ouvido. São coisas de Deus…

Certa vez, no Cinema Éden, do meu tio Paulo, foi organizado um “showmício”, em homenagem a um determinado candidato a governador do Estado do Rio Grande do Norte. Luiz Gadelha, conhecido político de Nova-Cruz e marido da minha tia Nazinha, foi o organizador. Pensando que eu também estudava acordeon, perguntou-me se podia incluir meu nome na pauta das atrações musicais que fariam parte do show. Eu disse que sim, só por danação, e que só não poderia levar a sanfona. A música que eu escolhi para tocar foi “E o Destino Desfolhou”, que minhas irmãs tocavam por partitura e eu aprendi “de ouvido”. Mas, na nossa casa, ninguém sabia disso.

Pois bem. No dia do “showmício”, o cinema do tio Paulo ficou lotado.

Luiz Gadelha, fazendo as vezes de apresentador, começou a anunciar diversos números artísticos. Houve poesias, cantorias, e chegou a minha vez de tocar. E ele anunciou:

“Ouviremos, agora, um número de acordeon!!! Com a garota Violante, a valsa “E O DESTINO DESFOLHOU”. Silêncio total…

Subi no palco pela entrada lateral e sentei-me em uma cadeira que já me esperava. Luiz Gadelha me acompanhou, trazendo a sanfona de um dos músicos e colocou-a sobre o meu colo.

Toquei calmamente, como se estivesse sozinha em casa. Não enxerguei ninguém na plateia. Nem meus pais, que estavam nas cadeiras da frente. O Mestre da Banda de Música , professor de acordeon das minhas irmãs, levantou-se e me acompanhou com o Saxofone, numa verdadeira apoteose interiorana. Sinal de que eu estava tocando bem. Só dei por mim, quando estrondaram os aplausos do “respeitável público”.

Desci do palco por onde eu tinha entrado e corri para junto de Dona Lia e Seu Francisco, que me abraçaram fervorosamente. Meu pai estava chorando, emocionado com a surpresa de me ver tocar, e ainda por cima, a música que ele adorava, “E O DESTINO DESFOLHOU”.

Minha mãe ainda estava tensa, com a surpresa de me ver subir ao palco e tocar, sem ainda ter sido aluna do Mestre da Banda de Música, como minhas duas irmãs.. Ela comentou que, ao ouvir Luiz Gadelha anunciar o meu nome, pensou que ele houvesse se confundido. Com certeza, quem iria apresentar o número de acordeon seria Ana ou Valéria, alunas do Mestre da Banda de Música .E quando me viu entrar no palco, com Luiz Gadelha atrás de mim trazendo uma sanfona, gelou… Esperou que a apresentação fosse um fracasso, coisa de menina danada. Mas foi um sucesso…

Dona Lia adorava contar essa história…

PENINHA - DICA MUSICAL