DEU NO X

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DEU NO X

CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

INICIAÇÃO POLÍTICA

Sede da Câmara Municipal do Recife

Aos 10 anos comecei a perceber coisas de gente grande. As cortinas da vida estavam começando a se abrir.

Morávamos em Afogados, um dos bairros históricos do Recife, mais exatamente à margem da Estrada dos Remédios, numa das vilas populares projetadas por Agamenon Magalhães: a Vila dos Jornalistas.

Meu pai começou a entender que eu chegara a idade de saber de algumas coisas. Era chegada a “Idade dos Porquês”.

Nas redondezas do mercado municipal, (a parte mais antiga e pobre do bairro), residia um pequeno comerciante de frutas. Um senhor alto, forte, amorenado, muito educado, conhecido como “O Vereador”. Era Arnaldo de Carvalho Paes de Andrade. Um dos primeiros políticos da década 1940, na região.

Era um líder em Afogados e já estava vereando a alguns mandatos. Muito querido por todos. Quando ia trabalhar se apresentava de terno branco, de linho, sapatos de duas cores e gravata com uma pérola. Um personagem respeitável, pois distinto e afável.

Certo dia papai estava comigo no Café Lafayette, no centro da cidade, quando ele apareceu e puxou conversa. Fiquei então sabendo que sua função como vereador era fiscalizar as ações do Prefeito e sugerir melhorias para a cidade.

Não perdi tempo. Como todo menino enxerido, entrei na prosa e apresentei uma reivindicação:

– Por que o senhor não manda calçar nossa rua?

Seu Arnaldo, sem pestanejar, engatilhou resposta um tanto inconveniente para o menino que aproveitava a presença do ilustre representante do povo:

– Eu não consigo nem calçar a minha, meu filho!…

E logo pensei: “Então não adianta ser vereador!”

Dias depois desse encontro, dado às minhas indagações sobre o assunto, recebi explicações detalhadas do meu pai. Entendi um pouco do que se chamava “democracia” e fiquei sabendo de algumas coisas na área de políticas públicas. Sobretudo que a maioria dependia de votos, de prestígio popular e de conchavos.

Em suma, um vereador precisava fazer “arranjos” com outros para aprovar projetos e utilizar as verbas orçamentárias disponíveis. Teria que saber influir nos orçamentos quando chegasse o tempo de serem elaborados, a fim de incluir novos projetos de melhorias para a cidade.

À medida em que a Vila dos Jornalistas foi sendo ocupada a população do bairro foi se ampliando e outro senhor, Antônio Batista de Souza, funcionário do Departamento de Estradas de Rodagem, se candidatou a vereador, levantando como bandeira de luta o calçamento da Vila. Ganhou e cumpriu a promessa. Tornou-se o líder.

Acomodando-se à função de um fiscalizador da gestão pública, seu Arnaldo, embora com eleitores fiéis, bem poderia ter levado a sério a minha reivindicação e talvez continuar ganhando mandatos sucessivos. Mas se descuidou e lhe “passaram perna”. Não se tem conhecimento nem do projeto para calçar a Rua 3 de agosto, onde morava.

Seu Antônio foi mais além apresentando projetos de uma escola para o bairro, u’a maternidade e a pavimentação da Estrada dos Remédios, que deveria ligar o nosso bairro à Madalena. Todos projetos vitoriosos, porque ele soube circular entre os políticos de camadas superiores – os deputados estaduais – dentre eles o então Prefeito Antônio Pereira.

Seu Arnaldo foi ficando no esquecimento e perdendo eleições.

Teriam sido esses fatos – conhecer dois representantes do povo e lhes solicitar melhorias para o bairro – a minha iniciação política.

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