DEU NO X

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

DEU NO JORNAL

O QUE ACONTECEU NAS LOJAS AMERICANAS?

Leandro Ruschel

Deixa eu explicar o que aconteceu com as Lojas Americanas de uma forma que qualquer pessoas entenda: imagine que o Seu João tem o “Mercadinho do João” num bairro. Ele tem alguns fornecedores, como a Dona Maria, que vende a ele tomates…

Digamos que a Dona Maria vende ao seu João uns R$ 2 mil reais de tomate por mês, que ele acerta todo dia 30.

Digamos que as vendas não sejam boas, e seu João fica apertado num mês, tomando empréstimo no banco para pagar dona Maria e outros fornecedores.

Seu João vai fazendo isso por alguns meses, até que o banco se nega a dar mais empréstimos, pois Seu João já está endividado demais. Então, um gerente malandro do banco oferece uma solução para João: pare de tomar dinheiro desse jeito. Mude o seu balanço!

Ao invés de lançar no balanço essa dívida, coloque como “contas a pagar” contra fornecedores, e vá pagando os juros mensais, lançando no balanço tais pagamentos como redutor dessa conta “fornecedores”. Assim, o banco não identifica como “dívida” e você pode tomar mais recursos.

Multiplique isso por 2 milhões e você tem a situação das Lojas Americanas. Agora que a sacanagem foi exposta, a empresa pediu recuperação judicial para evitar que os bancos exijam vencimento antecipado da dívida.

Alguém será preso por isso? Claro que não, pois estamos no Brasil.

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PEDRO MALTA - A HORA DA POESIA

AS DUAS FLORES – Castro Alves

São duas flores unidas,
São duas rosas nascidas
Talvez no mesmo arrebol,
Vivendo no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
Das duas asas pequenas
De um passarinho do céu…
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.

Unidas, bem como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar…
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.

Unidas… Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rosas da vida
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor!

Antônio Frederico de Castro Alves, Bahia (1847-1871)

MAURÍCIO ASSUERO - PARE, OLHE E ESCUTE

REVANCHISMO, SIM!

Uma das coisas que falei sobre a volta de Lula ao poder foi o sentimento de vingança que ele iria exercer quando tivesse com o poder na mão e com os asseclas à disposição. Já eleito ele disse: “Não vou me vingar, mas não me peçam para esquecer”. Esquecer, certamente, não é o caso, mas quanto à vingança, os atos praticados desde nestes primeiros dias de governo indicam que não teremos paz e harmonia neste Brasil varonil.

Tenho dito, diversas vezes, que empresários como o “Veio da Havan” passariam a ser alvo fácil desse governo. Não será surpresa para mim se a Havan começar a ser visitada por fiscais da receita, do ministério do trabalho, etc. em busca do mínimo erro – repare bem: não precisa ser fraude, basta ser um erro – para que multas e mais multas sejam aplicadas. Salvo engano, a Havan empregou venezuelanos que fugiram do país e se abrigaram aqui na operação “Acolhimento”. Basta um desses não ter sua documentação legalizada com visto de trabalho para a Havan ser condenada. Francamente, no lugar desses empresários que apoiaram Bolsonaro, o caminho mais sensato é o aeroporto. Fecha tudo, paga indenização a todo mundo e pega o beco. Deixa o onipotente presidente empregar tudo mundo ou colocar todo mundo no “bolsa família”.

A vingança de Lula não virá da ação direta de suas mãos. Lula vai encomendar como se faz quando se contratam pistoleiros para eliminar adversários. A vingança não virá da ação direta dele, mas do apoio legal que ele terá para prender, investigar, mapear todos que em algum momento se colocaram contra sua pessoa ou de alguém de sua família. Vejam o caso da prisão do Anderson Torres. O cara estava fora do Brasil. Tinha um secretário em exercício e foi expedida uma ordem de prisão contra ele. Com base em qual preceito jurídico? Não importa. O que importa é que vamos colocar em polvorosa os seguidores, a partir da prisão das pessoas no entorno de Bolsonaro.

O lado negro da força está se revelando de uma forma sútil e absurda: qualquer pessoa que teça algum comentário a favor das manifestações, entendidas e divulgadas como atos antidemocráticos, é exonerada quando funcionário público e é nesse ponto que eu vejo o conflito do discurso vazio. Todo mundo diz que a importância do funcionário público é que ele pode denunciar sem correr o risco de demissão, mas eu estou vendo funcionários públicos sendo exonerados por participar dos atos “antidemocráticos”. Eu estou vendo parlamentares com a imunidade parlamentar jogada no lixo, estou vendo jornalistas, comentaristas políticos com suas redes sociais suspensas porque se colocaram contra as decisões judiciais das nossas cortes.

O mais irônico é que a volta de Lula será o “resgate da democracia”, seja lá o que porra isso signifique. Na sua megalomania onipotente, Lula falou sobre a guerra entre Ucrânia e Rússia dizendo que colocaria num bar os dois presidentes e depois de umas seis cervejas a guerra acabava. O cara está demonstrando ser incapaz de harmonizar o país porque seu pensamento está voltado para perseguir e não para governar a nação – que inclui aliados ou não.

Um congresso amoral, incapaz e colocado de joelhos perante decisões judiciais que vê, sem um mínimo movimento de protesto, o judiciário governar, ditar leis, invadir as prerrogativas dos outros poderes. Eu sinto vergonha disso tudo, mas não deixo de reconhecer que o maior culpado é o eleitor que vota em canalhas, em corruptos. Forma-se um congresso com deputados dos quais 2/3 possuem processos por improbidade administrativa. Qual a força que essa gente tem para se impor perante uma decisão, mesmo monocrática, do STF? Nenhuma. Proteste que seu processo anda. Um país que elege Renan Calheiros não é digno de porra nenhuma.

A sensação que tenho é que estamos sentados num barril de pólvora. Para mim, Lula continuará afastado do povo porque onde ele for será sempre chamado de ladrão. Contato apenas com plateias simpáticas, escolhidas a dedo como claque de auditório pronta para aplaudir qualquer comentário. Em fevereiro nós temos o início de uma nova legislatura. Temos uma disputa para a presidência das casas e gostaria de ver outro nome mais digno do que o de Rodrigo Pacheco na presidência. Precisamos de alguém que cumpra a constituição. Que seja capaz de pautar o impeachment de ministros do STF que há muito merecem isso, pelo desrespeito que causam ao país e a constituição. Não falo isso por revanchismo, mas os ministros violaram em diversos momentos, a constituição.

Os dias serão difíceis, mas talvez a implosão seja uma eventual prisão de Bolsonaro. Se foram capazes de prender Anderson Torres que estava licenciado do cargo, talvez imaginem que estender este ato a Bolsonaro seja fácil. Ele chamou Lula de ex-presidiário, então mesmo que não haja tipificação de crime, prendê-lo seria dar a Lula o gostinho de devolver a agressão. O Brasil não tem mais um sistema presidencialista. Tem um sistema de governo, revanchista.

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JOSÉ RAMOS - ENXUGANDOGELO

A CABAÇA E O POTE

Cabaça para carregar água no sertão

Meizinha, suvaco, adijutoro, rapariga, disculhambação, cabra besta, gaiudo, gabolice, catá coquinho, vacuá e tantas outras falas são, não apenas o linguajar da roça vivido pelo matuto. Existe um universo muito grande envolvendo tudo isso.

Traduzir a coragem e a persistência – às vezes, até por ter consciência da impossibilidade de solução para apenas um problema – do matuto, aquele que realmente produz riqueza pela força do trabalho na agricultura e afins, é algo muito difícil.

Madrugar – acordar e levantar, quando o novo dia começa a clarear – não é apenas uma necessidade, é um hábito.

E escutar o galo cantar, a vaca mugir ou o berro dos cabritos é rotina. É o despertador da roça – para os abastados, na “fazenda”.

Era assim em Queimadas – povoado de Pacajus, no Ceará – quando o sol avermelhava o céu mostrando aquele colorido encorajador para Raimunda Buretama e os netos. Muitos netos. Nas férias escolares, mais de uma dúzia deles.

– Levante meu fii, se avexe e vamos buscar água prumode fazê o café e o dicumê!

Caminhar 12 Km (6 na ida e 6 na volta) pelas veredas para apanhar uma cabaça d´água não era coisa que uma criança entrando na adolescência gostasse de fazer. Mas era preciso fazer. Tinha que acontecer.

Eram duas caminhadas, o que acabava significando 24 Km por dia – “apenas para buscar água” – para uma casa com nove moradores. O banho ficava para a segunda viagem ou no fim da tarde, com a possibilidade improvável da garupa do jumento do Avô, depois que esse voltava da roça e precisava banhar e “dar de beber” ao animal.

Cinco, seis e até sete anos fazendo isso. Chovesse ou fizesse sol.

E aqui fazemos uma pausa para uma indagação – será que a água tem importância para uma família dessas?

Será que a transposição do São Francisco significa alguma coisa para várias famílias que vivem esse dilema?

Pote de largo uso sertanejo

Na casa, com cenário antigo por longos e longos anos, o abrir as cortinas mostrava um pote sobre uma trempe, ou, uma forquilha com três braços. Coador de morim amarrado na boca, para evitar a passagem de gravetos ou de martelos na água de beber. Ferver a água, nunca. A água só fervia quando era colocada no fogo, na lata de fazer café com um pedaço de rapadura para dissolver e adoçar.

Nos raros invernos, uma terrina de cimento servia como cisterna da água da chuva aparada na calha feita do sabiá (mimosa caesalpiniaefolia), uma madeira de grande serventia e aproveitamento no interior. A água ali depositada servia para aplacar a sede dos caprinos, das galinhas e outros animais domésticos criados para o abate e consumo da família nos momentos difíceis.

Nos anos 50, 60 e meados de 70, nenhuma residência do interior do estado tinha água tratada e canalizada – e isso significava dizer que esgoto ninguém conhecia naquelas paragens.

Fazia-se as “necessidades” num buraco feito no chão e a “assepsia” era feita com sabugo de milho ou folha de marmeleiro.

Hoje, acreditamos, tudo é diferente. Já não se faz necessário caminhar mais 24 Km e a cabaça e o pote foram praticamente abolidos, embora as casas permaneçam quase sempre as mesmas: paredes de estuque, chão de barro batido, fogão à lenha; portas fechadas com tramelas, apesar da crescente e preocupante violência urbana.

E dá uma saudade danada relembrar a caminhada diária de 24 Km. Dá uma saudade danada do bom, da ingenuidade, da coisa boa e, principalmente, da convivência e da unidade familiar – coisa que a tecnologia exterminou, trazendo junto a evolução.

Felizmente ainda é comum, nos povoados do interior, a “roça familiar” – batata doce, macaxeira, feijão, maxixe, quiabo, tomate, coentro, cebolinha verde e, nas Queimadas os primos e filhos dos primos nunca deixaram de preservar as moitas de mofumbo, arbusto preparado para a reprodução dos capotes – galinha d´angola.

Ali a tecnologia também chegou. Felizmente não conseguiu acabar com a tradição e sequer foi motivo para impulsionar mais uma “Revolução dos bichos”.

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