DEU NO JORNAL

ALEXANDRE GARCIA

PEDRA E VIDRAÇA

Lula e o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, durante cerimônia de posse

Lula e o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, durante cerimônia de posse

Essas pouco mais de três semanas do novo governo estão cheias de emoções. Para nós, jornalistas, para os de governo e para os da oposição, para investidores, empregados e patrões. Tempos extremamente difíceis para cartomantes, jogadores de búzios, detentores de bolas de cristal e afins.

Se “no Brasil, até o passado é imprevisível”, parece que estamos nas mãos do acaso, que vai armando a cada dia um quebra-cabeça em que seguimos animados pelo consolo de que “a esperança é a última que morre”. Tudo isso ainda sem o ingrediente mais barulhento da política, que se exerce principalmente dentro do Legislativo, que reabre quando janeiro terminar.

Na Argentina, repetiu-se o susto da moeda conjunta, tentando ligar o peso de quase 100% de inflação com o real de menos de 6%; e o BNDES vai ser de novo internacional – BIDES, talvez; em Davos, foi o medo de termos 120 milhões de pedintes famintos e a sugestão de não se comprar nem um palito de fósforo dos empresários direitistas.

Em Brasília, a surpresa de ter ao lado do presidente um comandante do Exército de inteira confiança numa sexta-feira e no sábado já tê-lo destituído por falta de confiança. E ainda temos a vergonha de Yanomamis vítimas principalmente de desnutrição – 20 mil pessoas que ocupam num território igual ao de Pernambuco, habitado por 9 milhões. E quem aplica suas economias no mercado, ganha um susto adicional ao saber que a Americanas deu uma pedalada de 20 bilhões. É chavão, mas não é um país para amadores; o problema é que faltam profissionais.

Isso sem falar nas consequências da catarse do dia 8, em que brasileiros destruíram seu próprio patrimônio, incluindo preciosidades históricas, artísticas e culturais. Agora a Justiça não quer saber se a pessoa vivia um sonho impossível com fuga da realidade, pois muitos ainda não entenderam o que está acontecendo. Nada de mal em haver idéias opostas; o problema é a radicalização, como se o oposto fosse sempre o mal. É o Deus e o diabo de religião transposto para a política. Não há debate racional possível.

O país está dividido e não é de agora. Quem estava contra o governo nos últimos quatro anos agora é governo; é vidraça. Quem era vidraça, agora é pedra. Só precisa manter a metáfora como uma imagem, e não sair apedrejando vidros do Supremo ou do Palácio do Planalto literalmente. Embora seja acaciano, oposição e situação são essenciais para o embate democrático. Nos últimos quatro anos os dois lados se queixaram. A tentação agora é dar o troco. Não nos deixeis cair em tentação, porque a carga de energia potencial está a ponto de transbordar.

DEU NO JORNAL

FAZ SENTIDO

A Petrobras anunciou nesta terça-feira, 24, que vai aumentar em 7,5% o preço da gasolina para as distribuidoras nas suas refinarias a partir de amanhã.

A última vez que o combustível derivado do petróleo tinha sido reajustado foi em 6 de dezembro, quando sofreu uma redução de 6%.

* * *

Em dezembro houve redução de 6%.

Com a mudança de ano e de governo, houve aumento de 7,5%.

Tem lógica.

Faz sentido.

DEU NO X

PEDRO MALTA - A HORA DA POESIA

SILÊNCIO – Medeiros e Albuquerque

Cala. Qualquer que seja esse tormento
que te lacera o coração transido,
guarda-o dentro de ti, sem um gemido,
sem um gemido, sem um só lamento!

Por mais que doa e sangre o ferimento,
não mostres a ninguém, compadecido,
a tua dor, o teu amor traído:
não prostituas o teu sofrimento!

Pranto ou Palavra – em nada disso cabe
todo o amargor de um coração enfermo
profundamente vilipendiado.

Nada é tão nobre como ver quem sabe,
trancado dentro de uma dor sem termo,
mágoas terríveis suportar calado!

José Joaquim de Campos da Costa de Medeiros e Albuquerque, Recife-PE (1867-1934)

DEU NO X

CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

POR UM PUNHADO DE DÓLARES (1)

Clint Eastwood em cena icônica de “Por um Punhado de Dólares”

Primeiro filme da Magna Trilogia dos Dólares ou Trilogia do Homem Sem Nome, estrelada por Clint Eastwood (o pistoleiro solitário), no papel principal, filmado na Itália, na Espanha e na Alemanha Ocidental. Dirigido pelo genial diretor italiano Sergio Leone.

Nesse primeiro filme da série, todos os atores, técnicos e diretores estão com os nomes americanizados. O diretor Sergio Leone consta como sendo Bob Robertson. A trilha sonora ficou a cargo do genial maestro Ennio Morricone, que usa a sensibilidade musical para marcar presença. Nos créditos do filme seu nome aparece como Leo Nichols. Cacoetes da época.

“Por um Punhado de Dólares” provoca uma forte impressão no telespectador. Dirigido com precisão, porém sem o rigoroso estalão empregado em O Bom, O Mau e O Feio (1966) ou em Por Uns Dólares a Mais (1965), Por Um Punhado de Dólares é uma espécie de crônica impiedosa que nos deixa em estado de atenção durante toda sua projeção e termina por nos fazer sorrir com amargura para a tela. A história é simples, transportada quase que de maneira integral do filme “Yojimbo – O Guarda-Costas”, de Akira Kurosawa. No caso específico desse início da Trilogia dos Dólares, temos um pistoleiro solitário e sem nome (Clint Eastwood), que chega a uma pequena vila na fronteira dos Estados Unidos com o México, um lugar dominado por duas famílias de bandidos e contrabandistas, os Baxters e os Rojos.

Apesar de não constar na apresentação, o filme cujo roteiro dispensa comentário, foi escrito por várias mãos, como sendo Sergio Leone, Andrés Catena, Jamie Comas Gil, Fernando Di Leo, Duccio Tessari, Tonino Valerii, com versão inglesa de Mark Lowell e Clint Eastwood.

Isso não desmerece em nada o filme, pois o roteiro original e a cópia italiana são perfeitos, com muita ação e belamente interpretados. A versão italiana é colorida. Quanto à versão japonesa é em preto e branco. A versão japonesa é considerada um clássico. Mas o filme “Por um Punhado de Dólares” tem uma interpretação muito convincente do ator Clint Eastwood, que foi dirigido magistralmente pelo diretor Sergio Leone, que desde este seu primeiro filme como spagheti western, demonstra a que veio e nos dá uma aula de como dirigir um filme com segurança e genialidade, isso com pouco recurso.

A História tem muito suspense, a direção é soberba e os atores são todos de primeiríssima qualidade, muitos são celebridades do cinema italiano, que confiaram no talento do diretor Sergio Leone, aceitaram o papel secundário e realizaram um belíssimo trabalho interpretativo.

Necessário faz-se chamar a atenção dos leitores para uma característica muito usada pelo diretor Sergio Leone em todos os seus filmes, sendo que neste ele usa e abusa inteligentemente dos closes. São praticamente centenas de closes em todas as cenas. O diretor procura mostrar aos espectadores a reação dos personagens com closes longos e repetidos a exaustão e os personagens reagem belamente com essa técnica com belíssimos e expressivos closes em quase todas as cenas.

As cenas finais são antológicas, principalmente o duelo final, no qual o personagem (sem nome) interpretado pelo ator Clint Eastwood, usa um escudo de ferro embaixo do seu ponche. Cena esta já histórica e sabiamente aproveitada pelo diretor Robert Zemeckis no filme “De Volta Para o Futuro nº. 3” com um resultado de muita criatividade.

A Trilha sonora é tão importante neste filme, como se fora um personagem vivo e testemunha presente dos fatos. A música pontua, chama atenção para pequenas cenas, pequenos gestos e segue os atores nas cenas em que há alguma expectativa, de modo insistente como a advertir os personagens do que está por vir. A música é um personagem do filme, coisas do maestro Ennio Morricone que já declarou que antes de fazer a música ele precisa conhecer toda história do filme e mais importante: acompanhar as principais cenas da filmagem, como ele fez no clássico “Era Uma Vez no Oeste” o que resultou naquela magnífica obra-prima do Western Spaghetti.

“Por um Punhado de Dólares”, apesar do pouco recurso para realizá-lo, nasceu clássico do oeste.

Por Um Punhado De Dólares (1964) Trailer#1 Com Clint Eastwood e Gian Maria Volonté

Como Surgiu o Faroeste Spaghetti?

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

MARCOS MAIRTON - CONTOS, CRÔNICAS E CORDEIS

CRÔNICA DE SEGUNDA-FEIRA: A SEGUNDA NA TERÇA E A MENTIRA DA LINGUAGEM NEUTRA

Nos últimos dias do ano de 2022, tracei minhas metas para 2023. Normal. Milhões de pessoas fazem isso no mundo inteiro. Mas desta vez me impus uma meta que soou como um desafio: escrever pelo uma vez por semana para minha coluna no Jornal da Besta Fubana.

Talvez isso não pareça muita coisa para grandes jornalistas, daqueles que têm colunas diárias, ou mesmo semanais, em grandes jornais, mas para mim, que não tenho a atividade de colunista do JBF como atividade principal, é.

Deu-se, porém, que o primeiro dia de 2023 caiu em um domingo. E, talvez pela educação religiosa que recebi, talvez por tradição, talvez pela preguiça que o domingo me inspira, escrever em um domingo não seria fácil. E teve a festa de réveillon, que havia durado até às sete da manhã daquele dia 1/1/2023 (na verdade, esse foi o verdadeiro motivo de eu não querer nem olhar para a tela do computador naquele dia).

Foi na noite daquele domingo que me veio a ideia da “Crônica de Segunda-Feira”. Recostei-me para dormir, no domingo à noite, sem a menor ideia do que escreveria no dia seguinte, mas com uma certeza: antes da meia-noite da segunda-feira teria um texto escrito para o JBF.

E assim fiz. Quem leu deve ter observado que o assunto da crônica foi minha caminhada matinal pelas ruas de Copacabana, onde havia passado a virada do ano. É óbvio. Por um lado, já acordei pensando na crônica; por outro, não faltavam fontes de inspiração naquele lugar incrível.

Repeti a fórmula nas duas segundas-feiras seguintes e – bingo! – texto concluído e enviado ao nosso patrão Luiz Berto com sucesso! Noutras palavras, a ideia da crônica de segunda-feira parece ter dado certo.

Acontece que Berto, observador como é, não poderia deixar passar um detalhe. E perguntou, via WhatsApp: “Por que danado você tá enviando crônicas de segunda-feira na terça?”.

Agora, vocês sabem o que o Berto já sabia: envio a crônica na terça porque escrevo na segunda. Como eu tenho mania de deixar o texto descansando algumas horas, antes de revisar, faço a revisão na terça-feira, bem cedinho, e só então envio para publicação.

E ficou assim: a crônica de segunda-feira sempre sai na terça-feira.

Hoje, por exemplo, eu aproveitei que não tinha acontecido nada de extraordinário durante o dia para passar essas explicações para vocês.

Aliás, não tinha nada quase até o final do dia, porque quando eu dava aquela última olhada no celular antes de me preparar para dormir, deparei-me com a seguinte manchete, em um site do governo brasileiro: PARLAMENTARES ELEITES REÚNEM-SE PELA PRIMEIRA VEZ EM BRASÍLIA.

É isso mesmo que vocês leram: ELEITES!

Eu já tinha visto uns vídeos que mostravam a posse de membros do governo que se instalou no Brasil neste ano, e neles a pessoa que ia discursar cumprimentava a “TODAS, TODOS E TODES”. Alguns invertiam, certamente para dar mais ênfase, pondo o TODES antes do TODOS.

Mas achei que era iniciativa da pessoa que discursava. Uma vontade de chamar a atenção, parecer inclusivo ou, como se diz nas redes sociais, simplesmente “lacrar”. Não imaginei que a comunicação oficial um dia viesse a maltratar a língua portuguesa dessa forma.

Diante da tal “vontade de lacrar”, imaginei se não seria o caso de ignorar o fato. Fazer de conta que não vi.

Mas não foi possível. A palavra TODOS já tem para mim um significado, e sempre foi suficientemente inclusivo. Bastava se dirigir a TODOS para ficar claro que todas as pessoas presentes eram destinatárias da nossa voz.

Antes de me tornar uma pessoa “de humanas”, a coisa funcionava para mim como um corolário da teoria dos conjuntos. TODOS significava a totalidade dos elementos de um conjunto. Assim, TODOS eram todos os seres humanos, todas as pessoas, todas as laranjas de um cesto, todos os planetas do universo.

Agora vem essa gente preconceituosa separar todo mundo (ou talvez eles prefiram “tode munde”).

Quer saber? Ainda que a intenção de vocês fosse se expressar de forma mais inclusiva, vocês estariam atentando contra a nossa língua portuguesa, e, consequentemente, contra a nossa cultura, contra a nossa história.

Acontece que vocês não estão sendo inclusivos. Vocês fingem que estão incluindo, mas estão, na verdade, dividindo as pessoas, como se, no fim das contas, não fosse todo mundo gente.

Fico triste ao ver o governo brasileiro apoiar esse tipo de coisa.

Enquanto não me ameaçarem de prisão por respeitar a língua portuguesa, esta crônica está disponível à leitura de TODOS.

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA