CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

TORTURA DE AMOR

O cantor Waldick Soriano

No jornalismo descobri muitas coisas e obtive respostas sobre fatos interessantes que poucas pessoas conhecem. Alguns deles aqui me reporto, para gaudio do público leitor.

Em Campina Grande, hospedado no Rique Pálace Hotel, solicitei ao Gerente uma mesa para instalar minha máquina de escrever portátil, a fim de começar a redigir uma reportagem para o Diário de Pernambuco.

O melhor lugar escolhido foi no restaurante do hotel, onde me arranjaram uma mesa ampla, em horário de pouco movimento. Estava em missão jornalística, a fim de cobrir eventos no Clube de Caçadores e numa Escola de Paraquedismo que ali existia.

Como se sabe, a “Rainha da Borborema” é rica em valores e pioneirismo. Espalhei a papelada com as anotações e fotografias e comecei a montar a reportagem.

Numa das mesas, bem afastado, olhando para a janela, estava um cidadão todo de preto e chapéu de vaqueiro, entornando uma bebida. Um tipo estranho. Mas fui cuidar do meu ofício.

Meti o sarrafo. Fiquei trabalhando de frente para o suposto viúvo. Depois de algum tempo, ao terminar a redação, comecei a arrumar a papelada e fechando a máquina, percebi que ele se levantara para vir até onde eu estava.

Perguntou se eu era escritor. Respondi ser apenas um aprendiz de jornalista; e pedi desculpas pelo ruído do teclado. Achou graça e bateu em meu ombro com afeição.

Pediu licença, puxou uma cadeira e sentou-se. Parei de trabalhar a fim de escutá-lo; mas na verdade havia concluído a tarefa. Ele começou a fazer perguntas sobre jornalismo, levando-me ao direito de fazer o mesmo com relação à sua estranha pessoa.

– Tenho muita vontade de ser artista; um cantor de fama. Estou tentando. – disse-me.

Saquei meu cartão-de-visita e entreguei, perguntando seu nome e se era fazendeiro.

– Não. Sou Eurípedes. Vivo do palco. Canto e vendo meus discos após os espetáculos nos cinemas, nos clubes e outros palcos. Vivo viajando por este Nordeste ensolarado.

Aí comecei a pensar que já conhecia o sujeito e não sabia de onde. Depois me lembrei que era das capas de discos!

– Por que está vestido de preto?

– Bem, quando eu era menino apreciava muito o cowboy do cinema, “Durango Kid”. Adulto, e já cantando em vários lugares, resolvi adotar seu traje e me apresento, inclusive, de chapéu, utilizando o mesmo estilo, para firmar minha imagem de marca. Meu nome como cantor é Waldick Soriano.

Surpreso, levantei-me respeitosamente e dei-lhe um abraço fraternal, citando várias de suas músicas que eu tanto apreciava, sobremodo: “Tortura de Amor”. Pedi-lhe desculpas por não o haver reconhecido logo, porque jamais o vira tão de perto. Somente através da voz e de capas de discos nas lojas.

Soltou os cachorros. Descreveu sua mini-biografia. Declarou que fora abandonado por sua mãe e a marca da solidão o acompanhava. Uma espécie de recalque, tornando-se a inspiração de cada uma de suas melodias. Naqueles anos já contava com mais de 400 canções gravadas em cerca de 30 discos long-play.

Fiquei admirado e seria outra reportagem para o jornal. Nunca fiz. Só agora me reporto ao fato porque será importante dizer aos leitores porque ele só se apresentava de preto.

Fora batizado Eurípedes Waldick Soriano, mas resumiu o nome por sugestão do empresário. Tinha história de luta. Depois de haver sido garimpeiro, trabalhou na roça e como caminhoneiro de seu pai. Mostrou-me as mãos calejadas pela enxada no garimpo.

Rindo, comentou que a buzina do caminhão tinha “três bocas” e dava pra representar três tons diferentes, como sendo o início de uma música. Quando chegava às cidades, a mulherada abria as janelas para saudá-lo logo que o som das buzinas se espalhava: “Waldick chegou!!!. Era uma alegria! Riu-se em gabação e continuou:

– Houve um tempo em que meu pai achou que eu, com quase 30 anos, estava parado na vida. Só queria cantar, tocar violão e namorar…, e isso não sustentaria uma família. Fui pro garimpo e ganhei o suficiente para ir fazer fortuna em São Paulo. E disse ao meu velho: Se eu não obtiver sucesso não voltarei mais. Todavia, quando buzinar na esquina da rua no meu “possante”, pode crer que estou no auge.

Em tom de galhofa, contou que certa feita, nas suas doidices de “juventude retardada”, pegou um cavalo e desfilou nas ruas de Caiteté, na Bahia, vestido de preto, como se fosse Charles Starret, o ator do cinema que encarnava “Durango Kid”. Mas foi vaiado pela rapaziada, pois não era dia de carnaval.

Sanfoneiro e violonista, adotaria a vida artística como solução para progredir na vida. Já era poeta e escrevia as letras de suas canções. Começou a cantar em pequenas cidades do interior até ser contratado pela Boate Chanteclair, em Belo Horizonte, onde marcou sua qualidade e venceu.

Seus temas eram os amores mal sucedidos, as chamadas músicas para “dor de cotovelo”, as quais tocavam fundo à sensibilidade das pessoas.

Mandou-se para São Paulo, transportado num caminhão “Pau de Arara”, cheio de rapadura. Lá foi procurar a Rádio Record que era muito ouvida em sua terra. Não havia vaga para cantor.

Depois, na Rádio Nacional foi ouvido por um nordestino atencioso e obteve uma carta de apresentação. Venceu as resistências do destino. Mas, assim mesmo, em São Paulo, na fase anterior, teve que passar alguns meses como faxineiro num hotel, engraxate nas ruas e passou muito aperto.

Gravou o primeiro disco cantando músicas de sua autoria. Obteve sucesso, se apresentando pelo interior de São Paulo onde fez espetáculos. Seu maior êxito, na década de 1950, foram as músicas românticas: “Quem és tu?” e “Eu não sou cachorro, não!”. “Estouraram”, como se diz. Passou a disputar com os grandes nomes do Rádio.

Como compositor – disse-me – Orgulhava-se de ter músicas gravadas por Roberto Carlos; e produziu um disco só com músicas do “Rei da Juventude Brasileira”. Muitos outros grandes cantores gravaram suas músicas.

Todavia, tinha que vender discos. Tempos depois, ganhou dinheiro e enfrentou o árido sertão da Bahia, sua terra, num automóvel Ford Galaxie. Chegava nas cidades, parava o carro numa praça para chamar atenção sobre sua presença. Alugava os cinemas para se apresentar e depois vendia discos autografados. A princípio o empresário era ele mesmo e tinhas suas artimanhas e marketing.

A partir daquele encontro em Campina Grande, fiquei sabendo porque o cantor sempre se apresentava de preto e com chapéu de cowboy. Era apreciador do astro do cinema. No íntimo desejara ser Durango Kid, o Cavaleiro do Bem.

Teve fama, ganhou dinheiro, mas gastou parte da fortuna em grandes noitadas e com muitos filhos e esposas que sustentou. Mereceu um filme produzido por Patrícia Pilar. Hoje é lembrança imorredoura todas as vezes em que ouvimos seus maravilhosos boleros, dentre eles, um com letra e música de sua autoria:

“Tortura de Amor”:

Hoje que a noite está calma
E que minh’alma esperava por ti
Apareceste afinal
Torturando este ser que te adora
Volta, fica comigo
Só mais uma noite
Quero viver junto a ti
Volta, meu amor
Fica comigo, não me desprezes
A noite é nossa
E o meu amor pertence a ti
Hoje eu quero paz
Quero ternura em nossas vidas
Quero viver por toda vida
Pensando em ti.

DEU NO X

FERNANDO ANTÔNIO GONÇALVES - SEM OXENTES NEM MAIS OU MENOS

O ESPÍRITO DO NATAL ENTRE OS POVOS

O Natal é uma das principais datas comemorativas do calendário ocidental, festejado na virada do dia 24 para o dia 25 de dezembro. Na cultura cristã, a festa relembra o nascimento de Jesus Cristo, em Belém, na atual Cisjordânia. O feriado festivo do Natal é marcado pela religião e, por isso, nem todos os povos absorvem a tradição de celebrar a data.

Culturas como o budismo, islamismo, hinduísmo, taoísmo, judaísmo são algumas nas quais o significado do nascimento de Cristo não se coaduna com a prática cristã. Países islâmicos como Paquistão, Indonésia, Turquia, Egito, Líbia, Irã dão maior relevância aos ensinamentos de Maomé, profeta que teria vivido entre os anos 570 e 632 d.C. – posterior a Jesus -, vindo à Terra para completar a sua mensagem.

Os muçulmanos aceitam a figura de Jesus Cristo como um dos cinco profetas que vieram trazer a palavra de Deus ao homem. Por conta disso, eles mantêm apenas uma relação de respeito com a data, sem a considerar sagrada na sua crença.

Já os países que adotam o budismo, como Vietnã, China, Coréia do Sul, Cingapura, Tailândia, Japão, não se envolvem com a característica particular do nascimento de Jesus Cristo. Eles respeitam a data, porém, Jesus para o budismo é um ser de grande sabedoria que sugere uma prática espiritual elevada.

Entre os judeus não se comemora nem o Natal nem o Ano Novo nos moldes cristãos. Apesar de reconhecerem que Jesus existiu, não cultuam relação de divindade com ele. Em Israel a comemoração de final de ano é o Chanucá ou Hanucá, que significa Festa das Luzes, em hebraico, e lembra as vitórias contra a opressão, a discriminação e a perseguição religiosa sofrida pelo povo judeu.

E para nós brasileiros, qual o verdadeiro significado do Natal? O que extraímos das comemorações do nascimento de Cristo? Quais lições ou interpretações deveríamos absorver no transcurso da data religiosa mais festejada por nosso povo?

Dois mil e vinte anos depois será que entendemos a essência da razão do profeta, filho de Deus, segunda pessoa da Santíssima Trindade, ter vindo ao mundo para pregar o Evangelho e dar a sua vida para nos salvar. Será que esquecemos a mensagem de sua viagem à Terra ou estamos misturando as narrativas dos fatos.

No Brasil, o Natal mais parece uma festa mercantilista do que uma veneração ao Menino Jesus. Tudo bem que a árvore de Natal traduza a vida – o pinheiro significa vida porque é um dos poucos arbustos que se mantém verde mesmo no inverno. Já o Papai Noel, significa presentes. Ótimo!

Acontece de o velhinho e a árvore serem mais lembrados que a razão da data: Jesus Cristo. Ninguém quer ser fotografado ao lado da manjedoura; crianças e adultos preferem o colo de Noel. Nenhuma preparação preliminar, penitência ou sacrifício são vistas. Apenas a missa natalina, desde que seja rápida para nada se perder dos comes e bebes e da troca de lembranças entre familiares.

Dá-se mais tempo às comemorações mundanas, que aos momentos de oração, solidariedade, caridade e adoração ao Cristo Redentor. Confraternizações, cores, luzes tudo isso é salutar, até necessário, pois são encontros com entes queridos no seio de lares amados e relacionamentos sagrados.

Ainda assim reflitamos sobre esta questão: Será que vivenciamos corretamente o espírito do Natal, quanto à religiosidade e ao amor à Família de Nazaré?

PENINHA - DICA MUSICAL

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

LINDOMAR – BRASÍLIA-DF

Berto

Bertão

Grande Berto.

Peço sua gentileza de solicitar explicações dos especialistas e explicadores Fubânicos.

Se após assistir este vídeo irão a aceitar a picada da vacina.

DEU NO JORNAL

CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

PENINHA – TUPI PAULISTA-SP

Berto,

o tempo passa muito ligeiro para quem já ultrapassou os 70.

Eu, no meu caso, gostaria que o dia tivesse 48 horas para curtir o dobro do tempo essa belezura que é o meu netinho Enrico.

Parece que foi ontem que enviei para o JBF, as fotos do nascimento dele.

Hoje, 18 de dezembro, é o aniversário de um ano do Enrico.

Desejamos a ele muita saúde e que as bênçãos de Deus o mantenham protegido por toda a vida.

Feliz Aniversário Enrico!

R. Lembro muito bem de quando vocês nos deu notícia da chegada de Enrico, meu caro colunista fubânico.

Colocamos a postagem no ar no dia 19 de dezembro do ano passado.

Para rever, clique aqui.

Parabéns de toda a comunidade fubânica pra esse lindo garotão, no dia em que ele completa seu primeiro aninho.

E um grande abraço pro vovô coruja!

Você Peninha, que nos brinda diariamente com sua fantástica seleção musical aqui no JBF, diga pro Enrico que dedicamos pra ele esta composição com o histórico palhaço Carequinha.

Parabéns, sucesso, saúde, alegria e muitos, muitos, muitos anos de vida!!!

A PALAVRA DO EDITOR

ABRAHAM LINCOLN FOI CANCELADO!

Uma escola em São Francisco resolveu mudar de nome. Trata-se da Abraham Lincoln High School. O motivo? Segundo a pressão de militantes, o ex-presidente homenageado não demonstrava que a vida dos negros realmente importava para ele. O deputado federal Paulo Eduardo Martins desabafou: “Cancelaram Abraham Lincoln, o homem que acabou com a escravidão e foi assassinado por isso. O que ele fez não foi suficiente para satisfazer a militância. Não vai sobrar ninguém”.

E não vai mesmo. Para entender o motivo, antes é preciso mergulhar no que representa o movimento “woke” dos “justiceiros sociais” da era moderna. Aquilo que muitos tratam como chato ou infantil mascara uma ideologia totalitária perigosa. Sim, chega a ser uma piada de mau gosto às vezes. Mas é uma piada sem graça, pois ela tem e terá cada vez mais efeitos nefastos na vida das pessoas. Para reagir, é preciso compreender.

O socialismo está de volta, e mais uma vez em guerra contra o nacionalismo em geral e a América em particular. A tese é de Evan Douglas Sayet, um comediante e palestrante conservador. Sayet é o autor de The Kinder Garden of Eden, sobre como o “liberal” moderno pensa e por que ele está convencido de que a ignorância é uma bênção. Também é autor de The Woke Supremacy, um manifesto antissocialista. Para Sayet, a esquerda “progressista” é infantilizada, mas também muito perigosa. Ele acredita que essa guerra ficará mais sangrenta nos próximos anos, e tem bons argumentos para tanto.

Se existe uma coisa que o mundo deveria ter aprendido com a história recente é que não há como apaziguar o socialismo. O socialismo não para suas invasões, opressões, crueldades e atrocidades até que seja forçado a fazê-lo. Não há acordo possível com os socialistas. Em sua busca para criar o mundo perfeito que imaginam, eles não consideram nada sagrado além da causa e acreditam que nenhuma ação está além dos limites. Assim foi e assim sempre será.

Antes, vale fazer uma distinção: o socialismo trata da estrutura de dinheiro e poder; a ideologia é sobre como esse dinheiro e poder são usados. A ideologia tende a ter pouca influência sobre o comportamento, uma vez que o sistema socialista tenha sido adotado. Cada regime socialista teve uma ideologia que era pelo menos um pouco diferente das outras; e ainda, na prática, todos eles exibiram muitas das mesmas características horrendas.

Os polos Norte e Sul são literalmente opostos polares e, não obstante, são mais semelhantes do que diferentes. Os socialistas e comunistas demonizam o nazismo e o fascismo, mas todas são ideologias variantes do método socialista. Em vez de tentar negar o inegável, aqueles na esquerda de hoje tendem a argumentar que Hitler era o “tipo” errado de socialista. Hitler, dizem eles, era um “nacional”-socialista – com ênfase em seu nacionalismo -, enquanto os esquerdistas de hoje são socialistas “democráticos”, e nisso, insistem, reside toda a diferença.

O problema é que, embora existam grandes diferenças ideológicas entre o nacional-socialismo e o socialismo democrático, simplesmente não há diferença sistêmica entre os dois, segundo Sayet. Hitler queria governar o mundo todo. Pessoas que buscam o novo governo mundial são chamadas de “globalistas”. O que eles planejam fazer com o mundo pode diferir – e pode diferir muito – dependendo de sua ideologia, mas o desejo de controle mundial absoluto, em qualquer de suas formas, poderia ser chamado de “globalismo”. Ou seja, mudam os fins, mas permanecem os meios.

Em sua canção Imagine, John Lennon oferece os três requisitos para o paraíso comuns a todo movimento socialista: que não haja posses pessoais, nem países, nem religiões. Sayet explica o motivo. Sem posses, o indivíduo não tem recursos para enfrentar um governo tirânico. Sem nações, não há outros governos fortes o suficiente para desafiar todos os governantes globalistas; sem religião, não existe autoridade moral superior para revogar todos os ditames dos governantes, não importa quão flagrantes e imorais esses ditames possam ser.

Não há dúvida de que os meios usados ​​pelos socialistas anteriores eram infinitamente mais medonhos, mas seu propósito era o mesmo. Os gulags, os campos de morte e as câmaras de gás eram simplesmente as ferramentas mais tecnologicamente primitivas do que hoje chamamos de “Cultura do Cancelamento”. Eliminavam fisicamente o “pária”, enquanto hoje se elimina virtualmente, mas destruindo sua vida também.

Para o autor, a genialidade de Orwell está em sua presciência ao prever como a tecnologia se tornaria os novos gulags e câmaras de gás: uma forma menos sangrenta, mas muito mais rápida, mais barata e mais eficaz para a próxima geração de socialistas silenciar e enfraquecer todos os Outros, a fim de criar qualquer versão do mundo perfeito que fosse imaginada da próxima vez.

Nos últimos cem anos, tanto na teoria quanto na prática, o nacionalismo provou ser a única coisa que fica entre a liberdade e os horrores da economia socialista, a estrutura globalista e as práticas autoritárias e totalitárias exigidas para realizar essas coisas e mantê-las. Os socialistas abraçam um sistema em que um governo venerado possui tudo dentro de seu reino. É por isso que o brilhante Thomas Sowell intitulou uma de suas obras mais essenciais, que descreve a ideologia da esquerda de hoje, A Visão do Ungido.

O nacionalista acredita que a melhor, a mais eficaz, eficiente, moral e justa forma de organizar o planeta é por meio dos Estados-nações, onde os líderes locais, com conhecimento de primeira mão das realidades locais, criam políticas no melhor interesse dos cidadãos locais, que eles podem muito bem encontrar nas ruas. O socialismo democrático é apenas o mais recente movimento socialista com ambições de Um Só Mundo, buscando criar a sociedade perfeita de sua imaginação por meio de uma cultura do cancelamento dos dissidentes.

Em todos os movimentos de supremacia totalitária, a lealdade deve ser apenas, sempre e inteiramente à causa. Assim, mesmo o mais antigo, mais zeloso, mais amado e mais respeitado “guerreiro da causa”, seja essa causa o stalinismo, o nazismo ou o “progressismo” atual, está a apenas uma infração de ser odiado e também cancelado. Assim como a supremacia “woke” não pode permitir nem mesmo uma gota de dissidência de seus seguidores, pois dela pode surgir uma nova seita concorrente, também não pode reconhecer nem mesmo uma gota de decência no Outro. O Outro não pode ser reconhecido como uma pessoa de boa vontade que por acaso está errada.

Para intimidar esse Outro, os totalitários sempre contaram com seus soldados para o trabalho sujo. Os socialistas da Alemanha nazista os chamavam de “camisas marrons”; os democratas do Velho Sul os chamavam de “Ku Klux Klan”; e os socialistas democratas os chamam de “Antifa” e “Black Lives Matter” hoje. A verdadeira ameaça não são os 10% ou mais que são os crentes fanáticos ou os oportunistas, mas os outros 90% que aceitam, repetem e agem de acordo com suas narrativas.

Cada um desses movimentos socialistas sabe que, antes que possa criar o mundo perfeito de sua imaginação, ele deve primeiro destruir o mundo como ele é. Por essa razão, ninguém a serviço dos “wokes” será levado à Justiça, não importa quão hediondo seja seu crime, contanto que avance sua agenda de destruir o mundo como ele é. Seu plano é eliminar todos os erros do mundo, eliminando o reconhecimento do próprio certo e errado.

A grande divisão política na América hoje, segundo Sayet, não é mais entre o Norte e o Sul. Nem mesmo entre “Estados vermelhos” e “Estados azuis”. Na verdade, em todos os Estados de todas as regiões, a guerra cultural se dá entre aqueles que vivem ou trabalham nas cidades e aqueles que vivem e trabalham praticamente em qualquer outro lugar, os cosmopolitas que se enxergam como “cidadãos do mundo”.

Os que votam nos democratas são os muito ricos que se beneficiam por serem os planejadores, os engenheiros sociais, e os muito pobres que dependem deles. A penúltima coisa que os planejadores desejam é que os pobres passem para a classe média e deixem de precisar deles. A última coisa que querem é que fiquem ricos e se mudem para uma casa grande ao seu lado. Os democratas “woke” querem manter as “minorias” como eternas mascotes dependentes, eis a realidade.

O projeto é de poder. Um poder absoluto, total, capaz de limpar o passado e reescrever o futuro em páginas vazias. Não há espaço para o contraditório, para a divergência, ainda que de uma vírgula. O resultado está aí, nesse clima de polarização tribal, divisão, esgarçamento do tecido social e enfraquecimento das instituições. Existem apenas duas coisas em que uma pessoa racional pode acreditar, diante desses fatos: ou as políticas do Partido Democrata não funcionam, ou funcionam exatamente como os planejadores principais planejaram.

DEU NO X

A PALAVRA DO EDITOR

O PICADEIRO E A PANDEMIA

Como circo, não era lá essas coisas. No diminuto comboio de trailers viajavam o dono (e apresentador do espetáculo), dois trapezistas, um mágico com sua ajudante, um palhaço, dois ou três funcionários e um homem com cara de galã mexicano – o bigode fino e perfeitamente aparado combinava com o topete besuntado de brilhantina, cada fio de cabelo em seu lugar. Não havia globo da morte, jaulas com feras que faziam tudo o que mandava o domador, saltos sem rede embaixo, nenhum desses requintes de circo com nome estrangeiro. Mas uma atração adicional compensava quaisquer carências: na segunda parte da noitada era apresentada uma peça de teatro. Isso fazia a diferença e justificava o nome nas placas com luzes vermelhas penduradas sobre a entrada: Circo Teatro Irmãos Nogueira.

No começo da década de 1960, a trupe – que não incluía nenhum Nogueira, muito menos dois – andou ancorando em Taquaritinga uma vez por semestre, para temporadas de três semanas. Numa noite de 1961, com pouco mais de 10 anos, fui apresentado aos subúrbios do mundo de Shakespeare. Sentado no camarote do prefeito, vi ao lado do meu pai “Maconha, a Erva Maldita”, um drama com apenas três atores mas capaz de fazer chorar até o dentista mais temido da cidade. O protagonista era o homem com jeito de galã, no papel do filho viciado que infernizava a vida do pai (um dos trapezistas) e da mãe (a ajudante do mágico).

A procissão de horrores consumia quase integralmente os 30 minutos do enredo. E a indignação reinava entre os homens, e a choradeira banhava o rosto das mulheres na arquibancada. A cada tragada no cigarrinho maligno, lá vinham bofetadas na mãe, socos e pontapés no pai e outras brutalidades, anabolizadas por insultos, ofensas e blasfêmias. Em vão, os espectadores tentavam deter o moço enlouquecido berrando medonhas promessas de revide. Alheio aos protestos, ele continuava barbarizando em cena até o desfecho inesperado. Depois de um ligeiro sumiço por trás da cortina, o carrasco doméstico reaparecia enfim liberto do vício hediondo. Abraçados ao filho risonho e vestido com mais apuro, os pais festejavam o final feliz. Só então acabava o sofrimento da caipirada na plateia, que aplaudia enquanto enxugava cataratas de lágrimas.

Achei a coisa meio exagerada. Teatro era mesmo aquilo? Voltei na noite seguinte para concluir a avaliação do repertório reduzido a duas peças. A segunda era “Vida, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Já vira a história no cinema, num filme mudo. Resolvi conferir a versão circense e acompanhar com especial atenção a performance do protagonista. O filho maluco de “Maconha, a Erva Maldita” também interpretava o filho de Deus. Eu já estava estendido no camarote quando soube que ele fora derrubado no meio da madrugada por uma gripe que o impedia de atuar naquele sábado. Ao despertar, o astro balbuciou o recado ao patrão: faltavam-lhe forças para encarnar o papel de Jesus. O patrão já se conformara com o cancelamento do espetáculo quando foi abordado por um exotismo municipal chamado Chicho Laize.

Muito doido, falante, audacioso, disfarçando a matreirice com a expressão abobalhada, Chicho colecionava façanhas que meio mundo conhecia. Sem profissão definida, vivia de bicos. O mais recente fora ajudar a erguer a lona e ajeitar as tralhas dos trailers, o que lhe bastara para comportar-se como amigo de infância da trupe. Todos (inclusive o dono) o tratavam pelo nome. Mas nenhum deles (inclusive o dono) sabia que Chicho era maluco.

Informado da defecção no elenco, foi falar com o chefe.

– O senhor sabe qual é a minha verdadeira profissão? – perguntou.

O silêncio do homem respondeu que não.

– Artista – revelou Chicho. – Artista de teatro.

– Você sabe fazer Jesus Cristo? – animou-se o patrão.

– É o papel que mais conheço – gabou-se Chicho.

Apeça de 20 minutos já começava no calvário. Quando a cortina se abriu, lá estava Chicho Laize carregando uma pequena cruz de madeira, escoltado por dois soldados romanos (os trapezistas) armados de chicote e Maria Madalena (a ajudante do mágico) com uma toalha na mão. Espanto na plateia. O soldado à direita do Cristo abriu a encenação com um insulto a Jesus e uma chicotada que colidiu com o palco-picadeiro a centímetros do pé do mártir.

– Cuidado que isso vai me pegar! – advertiu Chicho.

Risos na plateia. Mais alguns passos e ouviu-se o pedido ao soldado à esquerda do filho de Deus:

– Vem cá e me ajuda – disse o protagonista. – Essa cruz é meio pesada.

O romano a sua direita reagiu ao apelo com outro estalo de chicote. O terceiro golpe acertou a canela e acabou com a paciência do Cristo:

– Agora você me pegou, porra! Eu tinha avisado! Foi de propósito!

Gargalhadas na plateia. O dono do circo ordenou um intervalo de cinco minutos. Reaberta a cortina, vibração na plateia. Pendurado na cruz, cercado pelo Bom Ladrão (um dos soldados do primeiro ato) e pelo Mau Ladrão (o outro soldado), Chicho tinha um cigarro pendurado no canto da boca.

– Se és o filho de Deus, livrai-me desta cruz! – implorou o Bom Ladrão.

– Tá difícil – retrucou Jesus. – Mas vou ver se consigo falar com meu Pai.

O Mau Ladrão partiu para a provocação:

– És apenas um mentiroso sem poderes – desdenhou em tom debochado. – Se tens forças milagrosas, por que não te livras desta cruz?

Chicho caprichou na réplica:

– Cala a boca, ladrão! – ordenou. Em seguida, apontou o indicador esquerdo para o alto e berrou a ameaça: – Deixa que lá em cima nós acerta!

O acesso de ira fez o cigarro cair-lhe da boca. Uma pequena chama apareceu no sopé da cruz. Em vez de apagá-la com dois ou três sopros, o dono do circo convocou o elenco para combater o incêndio e avisou ao distinto público que o espetáculo chegara ao fim. No dia seguinte, a trupe partiu para nunca mais voltar. Atravessei a infância e o início da adolescência achando que teatro era aquilo. Descobri que não quando, já um marmanjo, vi em cena grandes atores e atrizes.

Recordo aquelas noites no circo e penso no pesadelo imposto às crianças pelo Brasil do coronavírus. Muitos milhares têm a idade que eu tinha quando achei que aquilo era teatro. A garotada guardará na memória e na alma o que viu, ouviu e teve de fazer no ano mais estranho. Há dez meses, essas crianças souberam que uma doença difícil de explicar exigia a troca da sala de aulas pelo computador instalado numa sala da casa. Que deveriam pedir a ajuda dos pais em vez de recorrerem aos professores. Que deixariam de brincar com os amigos e teriam de conformar-se com a companhia de irmãos (ou com a solidão). Que as visitas aos avós estavam suspensas até sabe Deus quando. Devem estar achando que um país é assim mesmo, que muitos pais e professores são assim mesmo, que todos os que mandam são assim mesmo.

Mas não deveria ser assim, descobrirão quando souberem o que efetivamente aconteceu em 2020. Então a Geração Covid entenderá que teve inutilmente confiscado um ano inteiro de vida. Para que o crime se consumasse, conjugaram-se uma boa parcela de professores orientados pela ideologia da preguiça, de diretores e donos de escolas movidos pela política do lucro, de pais e mães infectados pela epidemia de pusilanimidade estrábica, a soberba de jaleco e governantes que se dividem em duas tribos infames: a dos irremediavelmente incapazes e a dos capazes de tudo. Ambas só aceitam gente que não sabe o que são afetos reais. É compreensível que nenhum dos envolvidos na conjura perca o sono com as violências infligidas às crianças do Brasil.

A quarentena escolar brasileira é a mais extensa e intensa do mundo. Não foi a primeira geração de crianças traídas. Mas nenhuma foi tão cruelmente atraiçoada por tantos traidores.