CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

UM MATUTO NO LA LICORNE

Semana passada fui a um consultório médico, cheguei cedo, antes da hora marcada. Encontrei Jairo, velho amigo de juventude e de boas farras. Ele observou pertinente.

– Capita, tempos atrás nos encontrávamos em bares, na boa boemia da cidade, hoje só nos encontramos em consultórios, laboratórios. Essa é a vida de quem viver mais um pouquinho.

O médico estava atrasado tivemos tempo para uma boa conversa. Jairo me mostrou a revista feminina que ele folheava. Tomei um susto ao ler a chamada de capa da matéria principal da revista feminina.

Na capa, a foto de uma mulher, loura, vistosa, sensual, e a manchete: PROSTITUTAS DE LUXO CONTAM COMO DEIXAR UM HOMEM LOUCO. “Você já se perguntou que talentos especiais têm as mulheres das casas de prostituição de luxo?”.

A matéria de quatro páginas apresentava o ambiente da prostituição de luxo de São Paulo. Mostrando segredos desse mundo paralelo que valem riscos, segundo a jornalista. Contava com detalhes o que fazem as profissionais para agradarem os homens. Quatro prostitutas são entrevistadas e dão as dicas como deixar os homens doidões. Ensinam desde o primeiro olhar; como conversar e ser educada: “Ser uma dama na mesa e uma puta na cama”. Confessaram pormenores de toda espécie de carinho. Ensinaram a fazer sexo com criatividade. Massagem nos pés, nas costas e em todos os pontos do corpo masculino. Finalmente constataram que os homens sentem-se poderosos, quando percebem que são solicitados para fazê-las felizes (fingindo, claro). Uma bela aula teórica numa revista comprada nas bancas.

Aproveitando o fascinante tema, meu amigo Jairo, contou-me que há anos ele viajou a São Paulo para resolver algum problema de sua secretaria. Depois de um dia de trabalho, ao chegar no hotel, tomou um banho e jantou. Como nada tinha a fazer foi ao bar, sentou-se no banquinho alto, tomou dois uísque. Sem querer, ouviu a conversa entre dois homens, vizinhos de bar. Eles falavam das lindas mulheres do La Licorne, uma boate de mulheres, perto do hotel. Jairo ouviu o bastante para dar vontade de conhecer. Pediu informações na portaria e saiu. Ao entrar no La Licorne ficou encantado com a decoração e as belíssimas mulheres sentadas no bar esperando a chamada de algum cliente.

Jairo foi atendido por um garçom que o conduziu à uma mesa vazia e deu a dica que ele poderia escolher qualquer daquelas mulheres. Jairo pediu um uísque, sem olhar o preço no cardápio. Ficou pensando que aquelas mulheres deviam ser caras. Mas ele estava disposto, fez um sinal para uma loura tipo Marilyn Monroe, cheia de curvas, com um vestido bem caído, cabelos penteados. A magnífica sentou-se à sua mesa, conversaram, quando soube ele ser engenheiro, ela revelou que seu irmão também era. Não deu meia hora, Jairo, ansioso para saber o custo da mulher na cama, perguntou.

Ela discretamente mostrou três dedos da mão direita. Jairo se alegrou pensando, trezentos reais é cachê de Maceió. Imediatamente levou a Deusa para o quarto. A mulher era uma mestra, fazia coisas que ele nunca imaginou que se praticasse na cama, ele ficou louco com a eficiência da mulher, com a habilidade incrível em usar preservativos na língua. Sentiu-se morrer durante o êxtase. Quando Jairo estava tomando banho, tocou uma sineta discreta. A Deusa apressou o nosso amigo.

– Está na hora, temos cinco minutos para sair ou pagar o dobro do quarto. Gostou meu amor? Pode me pagar agora, o consumo e o quarto você paga na mesa ao garçom.

– Claro que gostei e voltarei. Você foi tão maravilhosa que vou pagar mais um pouco.

Tirou da carteira e entregou à Divina, três notas de cem e uma de cinquenta.

– O que é isso? R$ 350,00? Você está louco? Nosso cachê tabelado é três mil reais, foi o que acertamos.

– Você me mostrou três dedos, eu pensei em trezentos reais. Não tenho R$ 3.000,00 comigo, agora.

– Aceito cartão de crédito, pague junto à conta do bar.

– O problema é que meu cartão de crédito é conta conjunta com minha mulher, ela vai notar a despesa quando chegar a fatura. Deus me livre!

– Vamos à administração para resolver esse problema. Rá, rá. Por R$ 350 reais eu não seguro no cacete.

– Depois de muito discutir qual seria a melhor forma dele pagar. O gerente confirmou por telefone que ele estava hospedado no hotel com saída marcada para segunda-feira. Jairo deixou todos os documentos, levou apenas a identidade e um cartão de um Banco.
Dia seguinte, depois das dez horas conseguiu sacar R$ 3.800,00 no banco. Às quatorze horas quando o La Licorne abriu as portas para recomeçar os trabalhos, ele pagou o cachê e as doses de uísque. Nunca esqueceu a estupenda Marylin.

– Valeu!!!

Me revelou às gargalhadas, enquanto entrava na sala do médico.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

EDUARDO BOMFIM

Certo vez recebi um telefonema do amigo Eduardo Bomfim marcando um encontro num café. Para surpresa ele me convidou a ser seu assessor durante o mandato de vereador em Maceió. Me senti honrado mas, ponderei, ele ser do Partido Comunista do Brasil e eu um liberal, embora tivesse simpatia com alguns propósitos da esquerda, como a justiça social, eu era à favor da livre iniciativa, do empreendedorismo e além do mais, um Capitão do Exército, embora reformado. O Partido não iria me rejeitar? Naquela calma e poder de persuasão, falou que, antes de tudo, ele era um democrata, aceitava ideias contraditórias, gostava de argumentar suas razões. Já havia consultado o Partido que aprovou meu nome, um técnico como assessor. O convite fora feito, por eu ter exercido vários cargos na Prefeitura e ser conhecedor dos problemas e das soluções da cidade, queria realizar um mandato participativo, ouvir o povo, fazer um trabalho em direção aos mais carentes, principalmente a cultura popular. Aceitei imediatamente, faria aquele trabalho junto ao Bomfim até como voluntário, pois ele era um dos políticos alagoanos da maior credibilidade.

Desse dia em diante começamos a planejar e viabilizar projetos, ele me dava carta branca para o trabalho técnico e principalmente ouvir a população em seus anseios da comunidade.

Problemas nos bairros, eu fotografava e dava entrada direto nas secretarias, cobrava, eles resolviam os problemas. Gratificante e inesquecível trabalhar com o Bomfim. Todos os dias nos encontrávamos para avaliação de trabalho e projetos em andamento. Foi iniciativa de Eduardo Bomfim um projeto cultural de maior sucesso na cidade. Transformamos a Rua da Praia em Rua Shopping às sextas-feiras. Fechávamos a rua aos carros, as lojas ficavam abertas e muita apresentação cultural nas ruas. O Prefeito Ronaldo Lessa deu total apoio. Eu conversei e convenci com todos os moradores e donos de loja da rua da Praia. Até hoje o projeto Rua da Praia – Rua Shopping é lembrado. Eduardo certa vez mandou que a assessoria escrevesse um rascunho da Lei de Incentivo à Cultura. Em pouco tempo, adaptamos as leis de outros municípios, a Lei da Cultura foi aprovada na Câmara de Vereadores. Mas nunca regulamentada. Uma lei tão importante numa cidade tão rica em cultura popular e tão pobre para manter essa cultura. Foi muito trabalho durante o mandato que fazíamos com convicção.

Eduardo Bomfim foi figura de destaque da geração inquieta dos anos 60/70, que testemunhou e participou da revolução dos costumes, da cultura, da luta contra preconceitos do mundo. Foi a vitória da humanização e da minoria oprimida, principalmente as mulheres.

Conheci Eduardo Bomfim nos anos 70, quando ele liderava a Sociedade de Direitos Humanos em Alagoas. Minha admiração pelo político Eduardo Bomfim vem dessa época. Figura das mais dignificantes deste Estado, além de ser um idealista, era um homem de princípios. Eduardo Bomfim foi Deputado Constituinte, participou da elaboração da Constituição de 1988. Considerado um dos mais atuante parlamentares, os jornalistas de Brasília escolheram Eduardo Bomfim como Constituinte Nota 10 pelo seu trabalho, incluindo na Constituição cláusulas em defesa do povo, dos menos favorecidos.

Bomfim mostrou, quando presidiu a Fundação Cultural Cidade de Maceió, que tinha tino administrativo e visão do futuro, encaminhando diversos projeto ao Ministério da Cultura. Fez uma administração marcante para a cultura maceioense. O que mais se precisa nessa Brasil é de gente honesta como o Bomfim. O resto se resolverá.

Mas, foi uma pena, essa semana Alagoas ficou de luto, recebi com profunda tristeza a notícia da morte de Eduardo Bomfim. Deu uma dor no peito pelo amigo que se foi, a figura humana que Alagoas perdeu. Resta apenas citar os versos do poeta John Donne que diz mais ou menos assim:

“Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.

Ouço os sinos dobrando pelo Bomfim, pelos amigos, por Alagoas. Por todos nós. Difícil um homem do porte ético, político e intelectual de Eduardo Bomfim. Até mais, amigo velho!

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

UMA HISTÓRIA DE AMOR

Não sou de mentir. Tive uma infância feliz e uma vida atribulada. Com 16 anos fiz concurso para Escola de Cadetes do Exército em Fortaleza. Aos 21 anos era tenente na Bahia quando pedi transferência para o Recife onde havia a Escola Politécnica. Passei no vestibular de engenharia, quando em abril rebentou o movimento, o golpe militar, eu servia na 2ª Cia de Guardas, tropa de elite, onde ficaram trancafiados os principais presos políticos do Nordeste, em um ano de convivência tornei-me amigo daquelas autoridades.

Me mandaram para fronteira, 9ª Companhia de Fronteiras, Roraima. Deixei o Exército em 1972, fui trabalhar na engenharia construindo prédios e lutando na iniciativa privada. Com 61 anos em 2001, resolvi escrever o livro de memória, Confissões de um Capitão. Depois da entrevista com o Jô Soares, o livro foi sucesso em todo Brasil e traduzido para o espanhol. Plínio Lins editor do O Jornal me descobriu contador de histórias, prontamente convidou-me para escrever uma coluna semanal “Histórias do Velho Capita”, onde conto um conto, uma historinha toda semana desde 2002. Escrevi esse preâmbulo para esclarecer que não sou protagonista das histórias que escrevo, muitos leitores pensam que os casos aconteceram comigo. Impossível. Confesso que fico catando histórias, às vezes me oferecem na rua. Como o e-mail que recebi ontem de um leitor, o qual transcrevo como a historinha dessa semana. Obrigado pela atenção.

Sr. Carlito, sou leitor das Histórias do Velho Capita toda semana, não sei como o senhor inventa tantas histórias. Li seus romances. Sou seu fã. Para lhe ajudar segue a história de meu avô. Talvez dê para aproveitá-la em sua coluna.

Meu avô era bom comerciante, vendia remédio em sua casa, sem ter farmácia, era muito querido na pequena cidade do interior. Nasceram dois filhos de minha avó. O segundo filho, meu pai, foi de um parto complicado, precisou contratar uma enfermeira para cuidar do recém-nascido. Maria, a enfermeira, era dedicada e se apegou aos dois meninos. Com um ano o menino, meu pai, recuperou a saúde, a enfermeira foi ficando, gostou da família e também ajudava em outros trabalhos, varria, cozinhava. Morava em um quarto nos fundos da casa, ganhava um pequeno salário. Maria, perto dos 30 anos, gostava de passear pela cidade, onde conheceu muita gente e recebeu propostas de muitos homens, rejeitou todas.

Ninguém sabia, ela tinha uma paixão secreta por meu avô, escondia de todas amigas, até dela mesma. Meu avô um homem impecável, vivia para minha avó, o amor dos dois era bonito e comentado em toda região, passeavam juntos de mãos dadas nas praças e ruas. Quando viajava para comprar remédios ele levava minha avó. Viviam sempre juntos num amor eterno. Até que desconfiou da paixão obscura de Maria. A primeira vontade foi dispensá-la, porém, as crianças eram muito apegadas à Maria. Ela foi ficando. Meu avô também se afeiçoou, resistindo aos impulsos. Até que um dia o Diabo venceu, não resistiu, deitou na cama com Maria, uma ardente mulher. O tempo foi passando, o povo foi desconfiando daquela mulher bonita continuar solteira.

Mesmo sem provas o povo tinha certeza que meu avô dava conta das duas mulheres, discretamente. Meu avô viveu pelo resto da vida praticamente com duas esposas. Minha avó fazia não saber, amava meu avô tanto que só desejava sua felicidade. No dia que completou 86 anos meu avô teve uma dor forte do coração e morreu. Foi um reboliço e muito choro, todos amavam aquele sábio velho. Minha avó, amava tanto o marido que pedia a Deus que a levasse junto. O corpo de vovô foi velado na sala, as janelas da casa com cortinas pretas indicavam que havia um velório. Meu avô no caixão parecia mais sério, levaram minha avó medicada com calmante para descansar em sua cama. Maria olhava seu amor com uma dor imensa, lágrimas caíam de seu rosto triste, ela não tinha parentes.

Na hora de sair o féretro para o cemitério, quando foram acordar minha avó, a surpresa, com um sorriso nos lábios ela estava morta. Retardaram o enterro, prepararam minha avó em outro caixão. Os dois seguiram juntos, foram enterrados na mesma cova. Foi uma comoção na cidade. Meu pai e meu tio resolveram que Maria continuaria morando na casa. Meu tio mora em Maceió. Meu pai continuou na casa, abriu uma farmácia, casou-se com minha mãe, tiveram dois filhos. Eu nasci e me criei naquela casa. Ainda moro com os meus pais e Maria beirando os 100 anos, continua ocupando o mesmo quarto, não reconhece ninguém. Essa é a história. Gostou? Um abraço do Alex.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

O ET ESPIÃO

Desde os primórdios as grandes nações conquistadoras priorizaram o serviço de espionagem em suas conquistas, os espiões foram importantes na economia. Os navegantes da Escola de Sagres, os descobridores não passavam de um destacamento precursor de informações. Na era moderna, as grandes nações não vivem sem agentes secretos. Espiões estrangeiros travestidos em ONGs embrenharam-se na Amazônia espionando sorrateiramente nossas riquezas, esperando que um dia a Amazônia seja internacionalizada. “Aqui pra eles!”.

Assim como nós da Terra ansiamos desvendar o Universo, outros mundos distantes já existem agentes nos espionando. Há anos na Terra muitos extraterrestres enviam informações para seus planetas. Nós não damos conta, um vizinho, ou uma amante, pode ser um ET. Recentemente fui visitar meu primo Arnaldo, internado no Hospital Psiquiátrico; a expectativa de receber o tal do precatório deixou-o avariado da cabeça, com mania de perseguição. Confidencialmente entregou-me um papel com desenhos, garranchos que achou no lixo do Hospital. Ele afirma ser documento de um E.T. Pediu-me para verter ao português inteligível. Tentei a tradução possível das garatujas por intermédio de computadores, segue abaixo o resultado.

“Caro ORDEP LARBAC-3, Grande Chefe do planeta ATOXOX-69.

Desci do disco voador travestido de humano, estou na Terra, precisamente no Brasil, em uma cidade, Maceió (vide mapa). Seguem as informações solicitadas:
Maceió é uma cidade de 1(um) milhão de terráqueos. Existe uma faixa de areia branca limpa e bonita chamada praia, repleta de plantas altas e vistosas são os coqueiros, fica em frente aos prédios de moradia e o mar. O mar é uma enorme área de água salgada. A boniteza da cor desse mar impressiona qualquer visitante, tem magia, não se sabe se é verde ou azul, deixa as pessoas felizes só em olhar, aqui o povo é bom e alegre.

Os terráqueos deitam-se na areia branca para se queimarem com os raios do Sol, essa pequena estrela que nós só avistamos com lunetas de nosso planeta. As terráqueas fêmeas não são que nem as nossas, feito tábuas, pranchadas e verdes; as daqui têm curvas, dá vontade de alisá-las, de agarrá-las; os machos chamam de gostosas. As curvas da frente são duas, têm o nome de seios. A curva maior é uma protuberância dupla por trás e embaixo do corpo, chama-se bunda. É muito bonita, não existe no Universo coisa tão deslumbrante. Os terráqueos machos gostam muito, mas nem todos podem pegar. Na praia as fêmeas usam uma tanga para mostrar mais ainda os seios e a bunda. Vi um terráqueo passando óleo nas pernas e na bunda de uma gostosa deitada, pensei que eu podia, alisei a bunda dela, levei um tapa na cara. Tive que desligar meu dispositivo de sensibilidade endurecido. Tenho muito a aprender.

GOVERNO – Instituíram uma tal de democracia, quer dizer governo do povo. Mas acho que o povo tem só o direito de escolher os governantes que governam para eles mesmos. O chefe chama-se Presidente. Ele aparece sempre na televisão prometendo coisas para o povo, só não entendo porque ele que é o chefe não faz logo sem precisar prometer. O povo elege também os deputados, representantes do povo; vivem brigando cada um quer mandar mais, ganhar mais e colocar parentes nos cargos comissionados. Essa semana eles brigaram na televisão, um deputado que roubou, quando foi descoberto, acusou outros deputados de receberem propinas maiores. Foi aí que não entendi, se o deputado é represente do povo e trabalha pelo povo, porque ele tem que ganhar mais com as propinas? Vou pesquisar mais, preciso entender esse negócio, digo negócio porque dizem que o melhor negócio do Brasil é ser deputado. Outros poderosos são os Ministros juízes que fazem a Justiça no Brasil. Não entendi porque só pobres são condenados. Ladrões ricos andam soltos e são autoridades. O povo está cheio de roubalheira desses poderosos, quer seriedade, segundo me disse um companheiro de lazer (vagabundo que vive de calção na praia).

RIQUEZA – Existe muita, mas está nas mãos de seis a sete grandes famílias. Aqui tem açúcar, petróleo, coco e muitas outras riquezas, inclusive o turismo; é uma terra belíssima difícil de existir igual em todos os universos. O povo é bonito, bom e alegre.

Chefe, estou me dando bem travestido de humano. Fico no calçadão da praia apreciando as fêmeas, com vontade de agarrar aquelas maravilhas. Quando tirei algumas notas (dinheiro) para pagar uma bebida chamada cerveja, deliciosa, uma fêmea chamada rapariga me abordou perguntando se não queria fazer um programa. Perguntei o que era, se no programa eu podia alisá-la. Ela sorriu e falou no meu ouvido o que faria comigo. O sensibilizador estremeceu. Fomos direto para o hotel.

Chefe, vocês no planeta ATOXOX-69, não podem imaginar o que seja fazer menino aqui na Terra; não é feito aí em chocadeira. Aqui o macho e a fêmea se abraçam, se beijam, é bom demais. Para evitar engravidar usam a camisa de Vênus. Os nossos inimigos de Vênus já estiveram por aqui, vou investigar.

Estou no quarto do hotel com três terráqueas, vou raparigar, a melhor coisa do Universo. Depois conto mais. Um abraço do subordinado. OCIUQ- 21.”

Essa foi a possível tradução do documento achado por Arnaldo. Depois que leu a decodificação, ele quer ir à ONU. Confidenciou-me convicto: o Hospital está infiltrado de extraterrestre, até seu médico, de barbicha bonita, o competentíssimo Dr. Everaldo Moreira, Arnaldo desconfia que seja um E.T.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

TRAIÇÃO

Os gêmeos Pedro e Paulo sempre foram unidos. A viúva Dona Esperança criou-os com dificuldade. Conseguiu dar educação em casa e na escola. Ainda jovens, eles passaram no vestibular da Faculdade de Engenharia.

Pedro apaixonou-se por uma colega de turma, Bethânia Cardoso, inteligente, gostava de estudar e da profissão de engenheira, alegre, frequentava as mais badaladas festas nos clubes e casas de família. Gostava de praticar esportes, de namorar como todas as jovens. Bethânia era divina em sua alegria, fortaleza e sensualidade.

Faziam trabalhos de Faculdade juntos, davam-se bem um com outro, Bethânia também apaixonada, iniciaram o namoro. Formaram-se no tempo do “Milagre Econômico”, havia empregos para todos engenheiros formados naquela época. Porém os gêmeos tinham maiores ambições, montaram uma construtora, tendo Bethânia como sócia.

A empresa prosperou graças a trabalho dos gêmeos e principalmente o equilíbrio e controle administrativo de Bethânia. Tornou-se o cérebro da empresa. Dizia sempre que a empresa e os sócios não deveriam gastar mais que arrecadavam. O tempo passou, ficaram bem de vida à custa de muito trabalho. Pedro e Bethânia tiveram dois filhos homens, hoje independentes. Um mora em Tocantins o outro no Canadá

Houve uma tragédia na família, o irmão Paulo morreu em um desastre de automóvel numa viagem. A viúva, Aline, por lei, ficou como sócia da construtora em substituição ao marido. A nova sócia, tinha apenas o primeiro grau e era uma tremenda preguiçosa. Deram-lhe um serviço compatível com sua capacidade, mas no final do mês recebia dividendos de sócio. Seu único filho gostava mesmo de administrar a fazenda do avô materno, moravam num apartamento na praia.

A empresa continuou com bom empenho devido a inteligência e praticidade de Bethânia, era a boa timoneira.

Certa noite o casal comemorava ano novo na casa de amigos na Barra de São Miguel, quando Bethânia percebeu alguma coisa no ar. Pedro falava no celular demoradamente com alguém, coisa inusitada em seu marido. Ela chegou-se perto, ouviu ainda quando se despediu: “Um beijo, lhe vejo amanhã”.

Desconfiada, perguntou ao marido com quem falava. Ele tapeou respondendo que era com o João Peixoto, médico amigo que mora em São Paulo.

No outro dia, repercutia ainda no ouvido de Bethânia a última fala de seu marido: “Um beijo, lhe vejo amanhã”. O primeiro dia do ano estava marcado para um almoço na casa de Aline. Como Pedro poderia ver essa suposta namorada se ele estaria o dia todo na casa da cunhada? Seria alguma convidada?

No almoço estavam alguns casais conhecidos, muitos amigos, algumas jovens bonitas. Bethânia, muito perspicaz e fria ficou analisando as mulheres que estavam na festa como se fosse uma detetive.

Ela não é mulher de se iludir. Ouviu nitidamente a despedida do marido no celular. Quando ele disse estar conversando com o João Peixoto, aumentou, consolidou a desconfiança.

Já era tarde e nenhuma das mulheres que ali estava deu alguma bandeira, um olhar, ou dirigiu-se a Pedro com atenção especial.

Em certo momento, com uma dor no coração, Bethânia matou a charada. Percebeu sua cunhada Aline, a anfitriã, servir uma dose de uísque e apertar o braço de Pedro, olhando em seus olhos. Foi uma intensa pancada. Uma dor incontida de raiva se deu no coração daquela mulher, tornou-se fera. Fez lembrar sua inquebrantável fidelidade, apesar de várias cantadas e oportunidades que apareceram na vida. Brutal traição, logo com a viúva do irmão. A cunhada que foi acolhida, apoiada em todos os momentos de dor.

Bethânia, mulher forte, ficou o resto da festa, observando detalhes de comportamento de seu marido e de Aline. Na hora de ir embora tinha certeza, não havia qualquer dúvida. Confirmou apenas pelos gestos e olhares de ambos.

Em casa fez o marido confessar. Ele chorou. Disse que era apenas um caso passageiro, tinha sido envolvido pela fragilidade da viúva de seu irmão. Bethânia entristeceu-se mais ainda. Percebendo que o marido era um fraco.

Hoje Bethânia está solteira, dona da construtora, uma cinquentona bonita, empresária das mais respeitadas. Gosta de sair nas noitadas de fim de semana, escolhe o homem que quiser, divertida, feliz da vida com muitos amigos, só não quer compromisso, casamento. Para ela Pedro e Aline morreram, a última vez que se viram foi para assinar o divórcio e o novo contrato social da construtora, com apenas ela e os filhos como sócios.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

O PATINHO FEIO

Verinha era uma menina alegre e feliz. Não tinha preconceito, gostava de jogar ximbra, pião, rouba-bandeira. Corria como ninguém. Trepava nas amendoeiras, nas jaqueiras, nas goiabeiras da redondeza. Parecia estar sempre correndo. Na praia, dentro de um maiô apertado, era a líder das meninas, embora gostasse mesmo era de jogar futebol com os meninos. Dentro d’água, no mar ninguém batia, era a mais veloz. Deixava meninas e meninos para trás com suas braçadas contínuas e rápidas. Todos no bairro gostavam daquela diabinha travessa que vivia para brincar, correr e sorrir

Certa vez pediu para a mãe ajudar no vestir. Queria ficar bonita, estava ficando uma moça, com seios crescidos. Tinha sido convidada para uma festa muito especial.

Um rapaz da vizinhança havia passado no vestibular do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, exame difícil. O jovem Humberto ingressaria no ITA. Um sonho de todos os jovens daquela época. A família de Beto resolveu dar uma festa de despedida em sua bela casa. A animação, apesar da despedida, foi o ponto alto. Todos se divertiram, beberam, comemoraram até o dia amanhecer.

Verinha com um vestido rodado bem cintado, se policiava, freando a vontade de correr, de fazer bagunça naquele casarão. Queria parecer uma moça madura. Se continha.

Ela tinha uma paixão infantil por Humberto. Quando estavam na praia, corria em sua direção para se fazer notada. Ele nem se dava conta de existir aquela menina. Às vezes em alguma brincadeira ele falava com ela em tom de gozação chamando-a de menininho. Verinha ficava fula de raiva. Mas a paixão não se pode evitar, coisas do coração.

Em seus devaneios românticos, nos intervalos de suas estripulias, ela sonhava ser uma artista de cinema: Beto lhe abraçando dizendo que lhe amava e eram felizes para sempre. No dia da festa ela se fez bonita, mas sua estampa de menina magra e desajeitada, não ajudava. Ficava perto de Beto para ver se pelo menos olhava alguma vez. Em certo momento ele chamou Verinha. Ela veio toda frajola. Beto nem a olhou foi falando, apresentando um menino de 12 ou 13 anos:

– Esse meu primo quer brincar, como você é a serelepe daqui, vá brincar de pega com ele.

Ela não agüentou. Aquilo era uma humilhação. Retrucou na hora.

– Não sou serelepe, nem menina. Já sou uma moça e não vou brincar com esse pivete, não.

Beto gozou Verinha, chegando à ofensa:

– Você é menina sim. Ainda não tirou o mijo das calçolas. Sua Bostinha!!!

– Verinha ficou uma fera, a raiva subiu para cabeça, gritou:

– Vá para o inferno, Bostinha é sua mãe. Quero que você caia de um avião e morra!!!

A menina saiu correndo. Com lágrimas contidas chegou em casa. Sua mãe notou que ela voltava cedo, perguntou o que havia acontecido. Ela simplesmente deu boa-noite e foi para seu quarto. Só adormeceu quando o dia clareou. Chorou toda noite ouvindo as músicas da festa, pensando na grossura e na saudade de Beto que embarcava naquela manhã para São José dos Campos.

O ano não passou rápido. O tempo só é rápido quando existem apenas divertimentos e alegrias. Para Beto foi um ano de muita luta, muito estudo, muita ralação. Com notas razoáveis ele passou em primeira época. Retornou a Maceió de férias, quase um ano depois, no final de dezembro.

Houve outra festa em sua chegada. Seus pais convidaram os amigos e vizinhos. Muita bebida e comida. Beto feliz da vida em estar com sua bela família e ser o alvo da atenção de tantos amigos. De repente ele notou, ao longe, uma bela jovem. Estava de costas, o rosto pouco aparecia, seu perfil lhe era familiar. Chamou sua irmã ao lado e perguntou quem era a distinta de vestido branco. Rose deu uma gargalhada perguntando se tinha certeza que não conhecia. A irmã dirigiu-se até a jovem misteriosa, cochichou no ouvido e veio conduzindo a moça. Quando Beto a viu de frente e de perto, se encantou. O coração bateu forte como nunca havia batido para ninguém. Rose apresentou sorrindo.

– Quero que conheça minha amiga.

Encantado olhando nos penetrantes e ternos olhos da jovem, Beto estendeu a mão, falando com brandura:

– Prazer, Beto.

A jovem apertou sua mão gentilmente e respondeu sorrindo.

– Muito prazer, sou a Bostinha !

Nesse momento Beto reconheceu e compreendeu que era Verinha, sua vizinha, a menina sardenta serelepe e mal-criada que vivia correndo O patinho feio havia se transformado em uma linda cisne branca.

Passaram o resto da noite conversando. No final da semana os dois estavam namorando de mãos dadas no banco da praça. Era o início da mais bonita paixão daquelas férias de verão, tendo o sol, o céu e o sal de Maceió como testemunha.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

A PRESENÇA DE CLAUDINHA

Na fila da loteria Fábio contemplava o belo pescoço da senhora em sua frente. De repente, a mulher virou o rosto, ele reconheceu Cláudia, ficou feliz ao rever um amor de sua juventude.

Uma alegria para ambos. Sentaram à mesa tomando sorvete e conversaram tantas histórias Há muitos anos não se viam.

– Estou solteiro. Dois casamentos não deram certo. Sou ainda o romântico incorrigível procurando alguém para lhe substituir. Nunca encontrei!

– Você é um danado! Sempre gentil!

– Não é gentileza, Claudinha. Depois de tantos anos, sou um setentão e você está beirando; uma mulher casada, respeito seu marido, mas posso dizer sem mágoa, você sempre foi a mulher de minha vida, nunca lhe esqueci, conservo esse amor bonito dentro de mim. Esse negócio de dizer que sou mulherengo é verdade, depois que você se casou, descambei para as raparigas, tornei-me um grande boêmio, tive muitas mulheres, minha vida desregrada foi fruto da dor-de-cotovelo por você me ter abandonado.

– De fato nosso amor foi bonito, todos comentavam nossa paixão, nosso namoro avançado. Naquela época namorados não transavam, mas você queria muito. Uma paixão louca! Era tarado por mim. Precisei me segurar para continuar virgem. Terminamos o namoro, mas, você teve culpa, queria todas as mulheres do mundo, namorou uma amiga minha.

– Lembra da boia no mar da praia da Avenida? Eu colocava a boia de pneu de caminhão dentro d’água, você estirava seu corpo fazendo os braços de remo, e segurava na borda, por baixo as coisas aconteciam, ninguém percebia. À noite eu subia às casas de raparigas de Jaraguá. Descarregava meu desejo incontido pensando em você.

– Menino sem-vergonha! Como a gente era feliz!

– Como está o Castello, o homem mais feliz do mundo, o homem que tem você nos braços há mais de 30 anos?

– Fábio, vou ser sincera. Desculpe o desabafo, afinal você é um amigo confiável. Namorei com Castello, não era aquela coisa louca de nosso namoro. Casamos, construímos nossa família. São dois filhos e um neto. Ano passado tive duas tristezas na vida. Descobri que meu marido tem uma amante, menina nova, sustentada por ele há mais de três anos. Encheu-me de mágoa. E o pior, descobri um câncer na minha mama esquerda. Já me operei, tenho como tratar do câncer, os médicos dizem que posso controlar a doença e viver muitos anos. Mas o Castello não dá mais para controlar, ele está apaixonado por essa sirigaita. Eu vivo só, ninguém sabe o que se passa comigo, vivo indignada dentro de minha dignidade.

Fábio apertou sua mão, olhou nos seus olhos.

– Minha querida Cláudia, não aguente isso, deixe a merda desse marido. Eu ainda lhe amo, sempre lhe amarei, estou à sua espera o dia que você quiser, pelo resto da vida. Amanhã pela tarde estarei viajando, vou passar quase um mês no navio COSTA MARU, sai do cais do porto direto para Recife e Europa, atravessando o Oceano Atlântico. Quando eu retornar quero conversar com você. Está certo? Você promete que vai me ver? Me dê o número de seu celular.
Despediram-se com beijo no rosto.

À noite Castello chegou tarde e bêbado. Na hora de dormir, Cláudia alisou o corpo do marido, beijou-lhe o pescoço, foi se achegando pedindo carinho, um pouco de atenção. Nesse momento ele falou aborrecido, grosseiro.

– Não quero, não quero pegar sua doença. Você está com câncer. Porra!

Deu-lhe um empurrão, virou-se para o lado e adormeceu.

Humilhada e ofendida, chorando baixinho, Cláudia correu ao banheiro, sentou-se na privada e caiu em prantos, chorou muito. Certo momento se recuperou, respirou fundo, levantou-se, olhou-se no espelho, só de calcinha, levantou os braços, rodou, achou-se uma mulher bonita, conservada, atraente. Veio-lhe um sentimento forte de amor próprio, jurou para nunca mais chorar por Castello e que curaria o câncer.

Retornou à cama, custou a adormecer. Fez um retrospecto de sua vida, ninguém mais dependia dela, vivia praticamente só, os filhos independentes. Pensou no que restava desse futuro hipócrita e humilhante junto a Castello.

Eram oito horas da manhã quando ela levantou-se. Tomou café, trocou de roupa, foi ao cabeleireiro, à manicure. No shopping comprou roupas, foi ao banco, almoçou. Chegou em casa por volta das duas horas, arrumou a mala, escreveu uma carta simples para o marido e filhos. Tomou um táxi.

O navio Costa Maru repleto de passageiros desencostava do cais. Na balaustrada do convés Fábio contemplava o mar, o casario da Avenida da Paz se afastando, diminuindo de tamanho. Ele estava embevecido com a cor do mar de sua terra, quando, de repente, sentiu uma mão por cima da sua. Ao olhar de lado teve a mais bela visão de sua vida: a presença de Claudinha.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

A HERDEIRA DE BEBEDOURO

Em 17 de junho de 1962 o Brasil tornou-se Bicampeão Mundial de Futebol derrotando a Tchecoslováquia por 3 x 1 no Chile. Nesse mesmo dia, nascia o primeiro filho homem de João Simão. O comerciante tomou um porre homérico e deu-lhe o nome de Amarildo, homenageando o grande jogador da Copa 1962. Afinal um homem, depois de duas meninas. Amarildo foi crescendo e deu preocupação ao pai, era um menino diferente. Não gostava de futebol, nem das brincadeiras de meninos na Praça do Centenário, onde moravam numa bela casa. João Simão proprietário de dois postos de combustível, trabalhador, deu conforto e educação para a família. Ele tinha desgosto em Amarildo não gostar de futebol, comprou camisa do CSA, obrigava ao garoto acompanhá-lo aos jogos. Amarildo nem se incomodava se o time ganhasse ou perdesse. Na verdade João Simão tinha um pavor que o filho fosse “viado”, ficava triste com essa possibilidade. Adolescente, Amarildo andava de bicicleta pelas ruas do Farol com os amigos, contudo, era um rapaz bem comportado, não falava, nem se gabava de namoradas e mulheres. Até que um dia João Simão chegou em casa depois do trabalho e encontrou Laurinha, sua esposa, chorando. Quando ela contou que havia flagrado Luzia, a empregada, transando no quartinho dos fundos com seu jovem filho, Amarildo, João Simão deu um pulo de alegria, disse para mulher que deixasse de besteira e foi comemorar com amigos no botequim da esquina, ganhou alma nova. O fantasma da “viadagem” do filho que o atormentava há anos, desapareceu

Amarildo cresceu, sem fazer alarde era o “come quieto” da turma. Tinha uma namoradinha, que naquele tempo deveria ser virgem, mas gostava era de perambular, conquistando as jovens empregadinhas que vinham do interior atrás de melhorar de vida. Vez em quando frequentava a Boate de Mulheres do Rei da Noite de Maceió, o Mossoró.

Ainda era estudante na Faculdade de Economia quando seu pai morreu. Ele teve que assumir a administração dos Postos de Combustível. Com o tempo tornou-se um excelente comerciante. Comprava pequenos apartamentos na planta, quando terminava a obra, vendia o apartamento pronto pelo dobro. Entrou nesse negócio de compra e venda de imóvel, enriqueceu. Certo dia encontrou-se com Fátima, uma colega da Faculdade, saiu com a amiga algumas vezes, até que veio a notícia, ela estava grávida. Fátima era divorciada com um filho, não quis casar. Nasceu o Amarildinho. O pai fazia visitas esporádicas ao filho, aproveitava dormia com a amiga, sempre discreto, aquilo só interessava a ele. Até que conheceu Elizabeth, uma bela jovem, estagiária no escritório de seu advogado. Com um ano de namoro e muita paixão, se casaram. Amarildo, antes de casar confessou ter um filho de cinco anos, mas não havia relacionamento com a mãe. Elizabeth, muito bonita, trabalhadora e inteligente, ajudava nos negócios do marido. Ele gostava de se gabar que havia ganho dinheiro à custa de seu trabalho honesto, nunca havia feito negociatas com políticos e cofres públicos. Amarildo mesmo depois de casado, continuou com dois vícios: correr pela manhã e, vez em quando, sair com uma jovem, era um irresistível mulherengo, sem alarde, discreto.

Quando o marido completou 60 anos, Elizabeth preparou uma festa com a família e amigos mais íntimos. Amarildo bebeu demais e fumou bastante, contrariando ordens médicas, ele tinha um probleminha no coração. No dia seguinte Amarildo acordou-se com mal estar, vomitando. Para acabar a ressaca vestiu um short frouxo, uma camiseta, calçou o tênis e danou-se a correr em torno da Praça do Centenário. Já estava retornando à sua casa quando sentiu uma dor no peito, a vista escureceu, caiu no chão, infarto fatal. Foi uma choradeira geral no enterro de Amarildo, morte inesperada, tão jovem 60 anos. A família, algumas namoradas anônimas choravam de saudade.

Depois da missa de 30º dia, o filho mais velho entrou em contato com a mãe do seu meio irmão, para iniciar o inventário. Estavam reunidos no escritório do advogado os quatro filhos de Amarildo. Elizabeth, a viúva, não quis participar da reunião. Fátima apareceu acompanhada do filho, Amarildinho, e uma jovem em vestido simplório. O advogado informou que todos os bens iriam ser divididos conforme a lei: metade da viúva e a outra metade dos cinco filhos.

Foi quando Fátima interrompeu.

– Cinco não, são seis, tem um menino no bucho dessa jovem, minha empregada, ela afirma que o filho é de Amarildo. Peço fazer DNA quando a criança nascer para se habilitar à herança. Esclareço que essa jovem é faxineira, não dorme em minha casa e mora pelas bandas de Bebedouro.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

A GULOSA DO SANTOS DUMONT

O casal sentou-se diante da promotora e da juíza, cada qual com seu advogado. Ele, magro, moreno, cabelos pretos, aparentando 30 anos e tristeza no rosto. Ela, branca, rosto redondo, meio gorda, cabelos pretos ondulados, aparência de 40 anos. A juíza, sem perda de tempo, perguntou.

– O que resolveram na audiência de conciliação?

– Senhora Juíza, resolvemos pelo divórcio, a papelada foi preparada; mas, agora, ela deu para trás e se recusa a assinar. Eu quero me separar. Não aguento olhar a cara, nem ouvir a voz dessa mulher. Respondeu Manezinho.

– Dona Juíza, ele está afobado, precipitado. Eu o trato bem, com carinho, com amor, agora ele vem dizendo essa história de separação. É a mãe dele que bota na cabeça, ele é fraco, dominado pela mãe. Disse calmamente Alzira.

– Quero conversar com cada um separadamente. Dona Alzira saia por favor. Sr. Manoel da Silva, qual o motivo de desejar o divórcio?

– Dra. Juíza, vou contar a história desde que conheci essa maluca. Há dois anos eu vivia bem com minha mãe numa casa no bairro Santos Dumont. Solteiro, trabalhava de encanador e eletricista, fiz curso do SENAC, sou conhecido na região, não falta trabalho. Coloquei uma placa na fachada de minha casa. Numa noite recebi um telefonema pedindo para socorrer com urgência um vazamento numa banheira. Peguei minha moto e fui bater numa bonita casa em um sítio perto. Falei para a mulher que o conserto exigia a retirada da banheira, eu precisaria da ajuda de um pedreiro. No dia seguinte terminei o serviço à tardinha, era sábado. Dona Alzira me pagou o serviço e convidou-me para tomar uma cervejinha, ficamos conversando, bebendo e comendo até mais tarde. Já era noite quando ela dispensou a empregada, passou a chave na porta, retornou e foi me abraçando. A mulher parecia que tinha o cão dentro do corpo, me levou para o quarto. Dormi com ela, fazendo amor toda a noite. Na manhã seguinte me acordei cansado, ela exigiu mais. A partir daquele dia minha vida mudou. A gulosa vivia comendo e me arrastando para cama a todo o momento. Dizia que os pais eram ricos negociantes de Arapiraca, ela morava sozinha em Maceió para estudar. Matriculou-se numa Escola de Enfermagem que pouco frequentava. Não vou mentir, eu estava gostando daquela vida, o único problema era aguentar ir para cama em momentos inimagináveis. Mulher insaciável, gulosa na mesa e na cama. Passei mais de seis meses com a Alzira naquela vida, ela me agradava com presente. Ciumenta não queria que eu trabalhasse, nem que eu tivesse amigos e o absurdo de não visitar minha mãe. Alzira, um dia me deu um carro Honda de segunda mão. Acontece que eu não estava aguentando aquela vida de ciumeira e exigências. Abusado, pensei em acabar aquele namoro quando ela trouxe a notícia, estava grávida. Queria casar de qualquer maneira ou o pai mandaria me queimar. Fiquei sem saber o que fazer, conversei com minha mãe. Embora não gostasse de Alzira, ela ficou feliz na expectativa de ter um neto. Caí na besteira e casei. Durante a gravidez ela me encheu a paciência, mesmo naquela situação queria cama o tempo todo de todos os modos. Afinal Euzebinho nasceu, ela colocou o nome do pai, Euzébio, sem me consultar. Depois que o menino nasceu piorou o inferno. A mulher me tratava aos gritos. Me chamando de fraco, exigindo cama. Ela entregou o Euzebinho aos pais e continuou vivendo como solteira, e dessa vez pegando homem na rua. Não aguentei, fui morar com minha mãe. Alzira me procura quase todos os dias para eu voltar, entra em meu quarto me abraçando. Não suporto ver, sentir o cheiro, ouvir essa mulher. Consultei a um advogado, ele me aconselhou a me divorciar, por isso estou aqui, senhora juíza, obrigue essa mulher assinar os documentos, por favor, eu imploro.

A juíza dispensou o Manezinho e juntamente com a promotora ouviu Alzira que contou uma versão romântica, acusando Manezinho de frouxo, manobrado pela mãe. Apresentou uma enorme lista de presentes que deu desde que o conheceu. A lista começava com carro Honda, 12 camisas Richards, 2 camisas Aviator, 8 camisas Overende, 3 calças Brumer, 2 calças Hombre, 2 pares de tênis Reebok, continuava com inúmeros e pequenos mimos.

Depois do intervalo a juíza reuniu o casal novamente, entregou a Manezinho a extensa lista de presentes com as datas e informou que Dona Alzira assinaria se ele devolvesse aqueles mimos. Manezinho sorriu e prontamente informou.

– Está tudo dentro do carro, até as cuecas velhas eu lavei. Só os perfumes que ela colocava em minhas partes íntimas para cheirar, acabaram-se.

A juíza sentindo o desespero de um homem. Falou à Dona Alzira:

– Duas pessoas não podem viver juntos se uma não quer, assine esse divórcio, minha senhora. Para o bem do casal.

Alzira assinou as três vias e entregou-as à juíza. Quando Manezinho leu o documento assinado, sorriu, olhou para Alzira, chamou-a de bruxa tarada. Saiu do Fórum correndo e gritando.

– Estou livre! Estou livre! Estou livre!

Entrou no primeiro botequim.

CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

A AMBULANTE DA PONTA DA TERRA

– Minha mãe, estou com um problemão.

– Diga filha, mãe é para essa coisas.

– Estou namorando o Pedro há cinco meses, ontem ele veio com conversa de casar no fim do ano. Eu me sinto tão nova, 18 anos, iniciando a Faculdade de Direito, cheia de sonhos, quero ser uma boa advogada, melhorar de vida e casamento vai atrapalhar meus planos, meus sonhos.

– Bernadete, sei que é uma decisão difícil. O problema do amor é muito complexo, pior ainda a convivência a dois. Em compensação, amar, gostar de alguém, se dar, se entenderem; uma vadiação na cama com a pessoa amada é muito bom. Pense direitinho, eu mesmo não quero interferir na decisão mais importante de sua vida. Tem que ser sua. É você quem vai decidir. Pense e faça o que o coração mandar.

– Minha mãe, obrigado, eu que tenho que resolver. Amo o Pedro como nunca amei ninguém, mas, pensando bem, só tive dois namorados além dele. O problema é que ele se diz apaixonado, pensa em mim o tempo todo, até quando está consertando carros velhos em sua oficina. Já deu até a ideia de vir morarmos juntos em sua casa, para senhora não ficar tão sozinha.

– Bernadete eu me casei cedo demais, na sua idade, quando eu tinha 20 anos, era uma menina você nasceu. Logo depois veio a tragédia, a explosão na fábrica química, um erro humano, quatro morreram, entre eles seu pai. Fiquei viúva com uma filha pequena. Com a pensão ridícula e uma indenização de fazer vergonha. Consegui levar a vida como ambulante na praia, dei um duro danado, mas o trabalho dignifica qualquer um. Hoje meu acarajé é conhecido em toda orla, os turistas adoram e ainda tenho três empregados. Nunca quis que você trabalhasse, só para dar prioridade aos estudos e você entendeu que para vencer na vida é preciso o jovem estudar. Você tem esse problema, embora o casamento apenas atrapalha a dedicação ao estudo. Quem tem de resolver é você já que o namorado não quer esperar. Apenas digo que nossa modesta casa aqui no bairro da Ponta da Terra está à sua disposição.

O casamento aconteceu no dia 8 de dezembro na Igreja Nossa Senhora Mãe do Povo, com uma festa entre parentes e amigos. Pedro tomou um porre, como de costume, e passou uma curta lua de mel num modesto hotel na praia de Coruripe. A vida da família mudou muito, o quarto de Bernadete ficou para o casal. Ela todos os dias tomava um ônibus para cidade Universitária, às vezes almoçava por lá. Pedro com sua moto logo pela manhã estava trabalhando nos consertos de automóveis. Como tinha boa locomoção, almoçava em casa todos os dias, esquentando a comida preparada pela sogra na noite anterior. E Dona Laurinha levava em uma Van alugada a pasta de feijão do acarajé e os apetrechos. Trabalhava das 10 às 17 horas na praia de Cruz das Almas.

Assim foram vivendo logo nasceu Pedrinho. Criança bonita tinha os traços do pai: andar arqueado, rosto redondo, sobrancelhas cheias se juntando acima do nariz adunco. A família adorava os dias de domingo quando frequentava a praia de Cruz das Almas, Pedrinho corria na areia e Pedro enchia a cara aproveitando a cerveja e a cachaça que a sogra levava para vender aos fregueses do acarajé. Dona Laurinha gostava de uma cerveja e de sair nas sextas e sábados com as amigas, às vezes com algum amigo. Contudo, dizia, casamento jamais.

Antes de Pedrinho completar dois anos, apareceu a novidade inesperada. Dona Laurinha grávida. O pai da criança era casado morava em Santa Catarina. Já que foi viúva tantos anos, não abortaria, e o menino nasceu no tempo certo. Jorginho foi mais uma alegria para casa. Tiveram que rachar uma babá para tomar conta das crianças. Laurinha reclamava a falta de creches nesse Brasil.

Passaram-se quase três anos. Certo domingo, enquanto Pedro e Laurinha enchiam a cara de cerveja e cachaça. Bernadete brincava à beira-mar com as crianças. Foi quando de um susto, notou a semelhança no andar de Pedrinho e Jorginho. Chamou os dois fez uma comparação no rosto. As mesmas sobrancelhas grossa emendadas em cima do nariz adunco. O instinto de mulher foi um choque no coração de Bernadete quando suspeitou que seu marido poderia ser o pai de Jorginho, filho de sua mãe. Sua alma emudeceu, olhava para as crianças achando-as cada vez mais parecidos com o marido. Até que teve certeza. Não deu uma palavra durante a viagem de volta na Van alugada

À noite Bernadete explodiu. Laurinha e Pedro, ainda de pileque confessaram tudo, inclusive que continuavam transando. Laurinha ainda fez uma proposta:

– Vamos viver assim minha filha, segredo nosso, o povo que vá a puta que pariu. Quis dar um beijo na filha, ela se afastou, trancou-se no quarto fechou a porta.

Era meia-noite quando Bernadete arrumou as malas, saiu do quarto com Pedrinho dormindo no colo, tomou um táxi e foi bater na casa de uma grande amiga solteira. Contou a história, a amiga deu guarita. Desde aquela noite Bernadete nunca mais falou com a mãe, nem com o marido. Encontraram-se duas vezes, no Tribunal.