Semana passada tratei de uma questão focada no pensamento esquerdista comparando-a à um sistema monárquico no qual a sucessão se faz por hereditariedade. De fato, eu queira mostrar que do ponto de vista do pensamento esquerdista, o poder deve ser alternado, SEMPRE, com alguém da própria esquerda, sendo qualquer candidatura fora desse espectro considerada fascista. Citei o plebiscito de 1993 no qual a gente tinha que decidir entre monarquia ou república, acrescentando que minha opção pela república foi pela falta de cabimento de uma monarquia no Brasil, “não porque eu tenha nada contra a família real, mas porque me parece a manutenção de gastos adicionais com mordomias desnecessárias para um país que vende almoço para comprar janta”. O nobre colunista do JBF, o poeta Jesus de Ritinha de Miúdo, fez um comentário declarando sua preferência pela monarquia e trazendo uma nota de Cláudio Humberto que dizia que a família real inglesa custava menos que o STF brasileiro. Senti-me na obrigação de esclarecer.
O orçamento do STF em 2023, importou em R$ 851.778.002,00, enquanto os custos do erário inglês com a Coroa foi £ 86,3 milhões, ou seja, R$ 619.280.170,00 considerando a paridade do dia 19/07/2024, onde £ 1,00 =R$ 7,1759. Onde está escrito que uma possível família real brasileira custaria menos que o STF? Mas, acredito que precisamos compreender que os reinados de antigamente são bastante diferentes de reinados atuais. A monarquia de antes era um poder absoluto plenamente externado nas palavras de Carlos XIV quando disse “o Estado sou eu”. Era, exatamente assim: era o rei quem mandava e desmandava de acordo com sua conveniência.
O período do império no Brasil, teve a dissolução da assembleia constituinte por D. Pedro I em 1823, a promulgação da 1ª constituinte em 1824 (lá se vão 200 anos) que tinha 8 capítulos. Colocava o Brasil como uma monarquia hereditária e o seu artigo 102 dizia que “o poder executivo era exercido pelo imperador”. Não havia estados, mas províncias e os senadores eram eleitos para um mandato vitalício. A constituição de 1891 transformou o país na união indissolúvel dos seus estados e isso tem mantido até hoje.
A história relata os diversos reinados pelo mundo, uma boa parte deles comandados por verdadeiros tiranos. Átila, rei dos hunos, era conhecido como o “flagelo de Deus”. Foi, talvez, o mais sanguinário monarca na sua sanha de derrotar o império romano, outra fonte de degradação humana devido a figuras como Calígula (verdadeiro pervertido sexual que estuprava quem ele quisesse) ou Nero que teve como marca do seu governo o fato de tocar fogo em Roma.
O Czar Ivan IV, não ganhou a alcunha de “o Terrível” por brincadeira. Mandou matar 15 mil pessoas, deu uma surra na nora que perdeu a gravidez e ao ser confrontado pelo filho, matou-o a bengaladas, mas não fica atrás do príncipe Sado da Coreia que estuprava diversas mulheres e para aliviar o estresse matava seus eunucos caso eles não lhes trouxessem roupas do seu agrado.
As aberrações praticadas por reis vão além da compreensão humana. Calígula manteve um caso incestuoso com Drussila, sua irmã, e praticava tortura em alto grau, fazendo seus inimigos padecerem sob diversas flagelações. Ele matava devagar, torturando, a ponto de levar vários dias, por exemplo, assassinar uma pessoa. Lógico, que no tempo atual esse tipo de comportamento não seria aceitável porque a tirania tem sido, intensamente, combatida. Foi assim com Hitler: o mundo se uniu para derrotá-lo. Hoje, há uma congregação bem maior de nações, há acordos internacionais que devem ser corroborados pelos países e os eventuais arranca-rabos são pontuais. Portanto, não devemos medir por essa régua um sistema monárquico, constitucional, hereditário como na Bélgica, na Inglaterra, em Mônaco, dentre outros.
Não esqueço a franqueza do rei Juan Carlos I, da Espanha, durante encontro da XVII Conferência Ibero-Americana que aconteceu no Chile, em novembro de 2007 quando se dirigiu a Hugo Chávez dizendo: ¿Por qué no te callas? Ganhou minha simpatia na hora. É sempre um rigojizo verificar um imbecil sendo colocado no lugar onde o imbecil deve ficar.
Guardo por D. Pedro II a impressão salutar de um bom gestor. Certa ocasião, em visita ao Recife, ele se percebeu o grande de indigentes às ruas e prometeu enviar recursos para que se construísse um sanatório. Hoje, no bairro dos Coelhos, este “sanatório” tem o nome de Hospital D. Pedro II. Não era de graça que ele era chamado de “magnânimo”. Princesa Isabel, na terceira vez que assumiu a regência, por ausência do pai, tornou livre os escravos. Ficou conhecida como “a Redentora” e foi-lhe dito que ela “libertava uma raça, mas perdia a coroa.” O alferes Joaquim Inácio Batista Cardoso, avô de Fernando Henrique Cardoso, queria fuzilar a família real.
Na essência, meu texto não foi, em absoluto, criticar o regime monárquico. O país é, naturalmente, régio. Temos o rei do futebol, o rei da música popular brasileira, o rei da picanha, o rei da carne de sol, na BR 232, em Gravatá, tem o rei da grama, 500 metros depois tem o rei das coxinhas, um pouco adiante você encontra a Rainha dos pastéis. Não podemos esquecer o rei momo, a rainha do carnaval e a rainha da bateria das escolas de samba, a rainha do tráfico que recebeu passagens e diárias do poder público para participar de um evento no ministério da justiça. Rainha da pamonha, também em Gravatá, tem a padaria rainha da Várzea. Ah! Para não esquecer: você pode viajar nos ônibus da princesa do agreste.
Minha análise não se apoiava no custo ou na importância de termos uma família real. Particularmente, eu prefiro um sistema republicano pela organização do território em estados e não províncias. Não tenho nada contra as provinciais, também, mas acho que a alternância no poder é fundamental e não vejo a hereditariedade como sendo o melhor critério de escolha. O que insisto é no ponto central do texto: uma comparação entre o pensamento da esquerda para se manter no poder versus a monarquia. Reparem: é uma comparação, não uma agressão ao sistema.
O que eu disse, e insisto, é: a esquerda atua de forma a perpetuar-se no poder, sendo as alternâncias no cargo algo que deve ocorrer apenas entre que professa esse pensamento. Qualquer pessoa fora desse universo deve ser excluído por se tratar de uma fascista. Essa é a lógica.