Carlos Ribeiro Justiniano das Chagas nasceu em Oliveira, RJ, em 9/7/1878. Médico, sanitarista, bacteriologista, cientista descobridor da “Doença de Chagas’ e um dos pioneiros da saúde pública. Junto com Oswaldo Cruz e Vital Brasil entre outros, consolidou a medicina experimental no Brasil e teve 4 indicações ao Prêmio Nobel de Medicina, em 1921, ano em que recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade de Harvard, nos EUA.
Órfão de pai aos 4 anos, concluiu os primeiros estudos em Itu (SP) e São João del Rey (MG). Aos 19 anos entrou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, onde ficou conhecido como o “estudante de duas velas”. Como na época estudava-se à luz de velas, ele gastava duas. Em 1902 dirigiu-se ao Instituto Soroterápico, com uma carta de apresentação de seu professor, Dr. Miguel Couto, a Oswaldo Cruz, afim de elaborar sua tese de doutoramento. Concluiu o curso em 1903, com a tese “Estudos hematológicos no impaludismo’. Assim deu-se o contato com seu grande mestre, que o convidou para permanecer em Manguinhos. Atraído pela clínica, recusou o convite; montou consultório no ano seguinte e casou-se com Iris Lobo, com quem teve 2 filhos.
Em 1905 foi à Itatinga (SP), designado por Oswaldo Cruz, para combater a malária. Foi a primeira campanha bem sucedida de combate a malária. De volta ao Rio, em 1906, passa a integrar o grupo de pesquisadores de Manguinhos. No ano seguinte foi designado para combater epidemias em diversas cidades, iniciando uma série de expedições pelo País, cuidando do saneamento básico e saúde pública. Numa expedição à Lassance (MG), descobriu um novo protozoário no sangue de um sagui, que deu o nome “Trypanosoma Minasense”. Em seguida, percebeu vários insetos nas frestas das casas de pau-a-pique, que se alimentavam à noite com o sangue dos moradores, atacando o rosto. Por isto foi chamado de “barbeiro”. Identificou no intestino do inseto um protozoário semelhante ao encontrado no sagui, levando-o a crer que poderia ser uma fase evolutiva do “Trypanosoma Minasense”. Enviou amostras do inseto para Oswaldo Cruz, pedindo-lhe que desse como alimento aos saguis do laboratório. Pouco depois recebeu a noticia que os saguis adoeceram e que havia a presença do Trypanosoma no sangue. Animado, voltou para o Rio e desvenda o ciclo evolutivo do novo protozoário, que recebeu o nome de “Trypanosoma Cruzi”, em homenagem ao amigo Oswaldo Cruz.
Em seguida voltou à Lassance convencido que o parasito descoberto poderia ser causador de doença em animais e humanos. Em 14/2/1909 examinou o sangue de uma criança febril e identifica a presença do parasito. A menina Berenice torna-se o primeiro caso de moléstia provocada pelo novo protozoário. A descoberta consolidou o surgimento de um novo ramo da parasitologia, a “protozoologia”, dedicada ao estudo dos protozoários. Em 15/4/1909 foi publicada uma nota prévia, na revista “Brasil-Médico”, sobre a nova doença. No mesmo dia Oswaldo Cruz fez o anúncio formal à ANM-Academia Nacional de Medicina, da descoberta de uma nova doença: a “Tripanosomíase americana”. Uma comissão dirigiu-se à Lassance para confirmar as provas referentes à descoberta. O presidente da comissão, Dr. Miguel Couto, propôs que a doença fosse chamada “Moléstia de Chags”. A divulgação da descoberta se fez através de revistas científicas estrangeiras e despertou o interesse de cientistas europeus. Em 1909, ele publicou no 1º volume das Memórias do Instituto Oswaldo Cruz um estudo completo sobre o protozoário, seu ciclo evolutivo e a doença, garantindo-lhe prestigio e a promoção a “chefe de serviço” do instituto, em 1910. Logo foi realizada na ANM sua primeira conferência sobre a moléstia, quando foi reconhecida a importância de seu trabalho.
Junto com Oswaldo Cruz e outros pesquisadores, realizou uma expedição no vale do Amazonas, em 1912, para amplo levantamento médico-sanitário da região, relatando o abandono daquela população e enfatizando a necessidade de medidas sanitárias. No mesmo ano recebeu o “Prêmio Schaudim”, conferido por um júri internacional, através do Instituto de Moléstias Tropicais de Hamburgo, ao melhor trabalho na área de Protozoologia. Em 1916 se empenhou na campanha pelo saneamento rural do País até 11/2/1917, quando se dá o falecimento de Oswaldo Cruz. 3 dias depois assume a direção do Instituto de Manguinhos. No cargo, buscou consolidar o modelo estabelecido à semelhança do Instituto Pasteur, com autonomia administrativa e financeira e estreita ligação entre a pesquisa, ensino e fabricação de remédios. Com isso garantiu a renda própria do Instituto. Em 1918 criou a “Liga pro-Saneamento do Brasil”, movimento reunindo médicos, cientistas, intelectuais e políticos numa mobilização em prol da reforma dos serviços de saúde pública. No mesmo ano publicou o livro O saneamento dos sertões e foi nomeado diretor Serviço de Profilaxia Rural. Em seguida foi requisitado pelo Governo para chefiar a campanha contra a epidemia de gripe espanhola. O sucesso de sua atuação pesou na escolha de seu nome para comandar a reforma dos serviços públicos de saúde do País.
Em 1919 foi nomeado pelo presidente Epitácio Pessoa para reorganizar a saúde pública. Assumiu a direção do DNSP-Departamento Nacional de Saúde Pública, acumulando com seu trabalho em Manguinhos. No período 1920-1922, ampliou os serviços de saneamento rural, com a instalação de postos de profilaxia em vários Estados. Dedicou-se à formação de profissionais com o Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, além de criar a Escola de Enfermagem Anna Nery e o Hospital São Francisco de Assis, como modelo à modernização dos serviços hospitalares do País. Em 1921 fez uma série de conferências nos EUA e tornou-se o primeiro brasileiro a receber o título de doutor honoris causa da Universidade de Havard. A mesma distinção foi concedida em 1926 pela Universidade de Paris. Conquistou, também, os títulos de membro honorário da Société de Pathologie Exotique (Paris), da Royal Society of Tropical Medicine (Londres) e das Academias de Medicina de Paris, Bruxelas, Roma e Nova York.
De novembro de 1922 a dezembro 1923 a ANM foi palco de uma polêmica envolvendo a doença de Chagas. Um grupo de médicos (Afrânio Peixoto, Henrique Figueiredo de Vasconcelos e Parreiras Horta) contestou a autoria da descoberta do trypanosoma Cruzi, questionaram sua importância e afirmaram não haver provas concretas de sua extensão para além do limites de Lassance. Uma comissão reconheceu o autor da descoberta, mas manteve a dúvida quanto à distribuição da doença no País. Só na década de 1930 a questão foi resolvida. Os médicos argentinos Salvador Mazza e Cecilio Romaña detectaram centenas de casos, comprovando que a doença não estava restrita apenas ao Brasil. Ao mesmo tempo, alguns pesquisadores empenharam-se em comprovar a ampla distribuição da doença de Chagas. Em 1935, seu filho Evandro Chagas criou, em Manguinhos, o Serviço de Estudos de Grandes Endemias, para promover investigações sobre a doença. Finalmente, em 1959, foi realizado o I Congresso Internacional de Doença de Chagas, colocando um ponto final na polêmica. Foi o primeiro e, até hoje permanece, o único cientista na história da medicina a descrever completamente uma doença infecciosa: o patógeno, o vetor, os hospedeiros, as manifestações clínicas e a epidemiologia.
Nomeado professor da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1925, criou a cadeira de Medicina Tropical e estabeleceu as bases desta área no País. Por esta época, representou o Brasil em vários comitês internacionais, como membro do Comitê de Higiene da Liga das Nações. Em 1928 passou a coordenar o Serviço de Propaganda e Educação Sanitária, do DNSP, percorrendo diversos Estados até 1930. Faleceu em 8/11/1934, vitimado por um infarto do miocárdio. Foi homenageado com diversas condecorações em vida e pós-morte, aqui e no exterior: Cavaleiro da Ordem da Coroa da Itália, Comendador da Coroa da Bélgica, Cavaleiro da Ordem Nacional da Legião de Honra da França; Oficial da Ordem de São Tiago, Portugal; Comendador da Ordem de Afonso XXI, Espanha; Comendador da Ordem de Isabel, a Católica da Espanha; Cavaleiro da Ordem da Coroa da Romênia. Teve 4 indicações para receber o Prêmio Nobel de Medicina. Hoje admite-se que o desconhecimento de suas descobertas pelo membros do Comitê Nobel foi decisivo, além do fato de naquela época haver uma preferência pelos cientistas europeus e norte-americanos.
Entre nós, seu nome denomina diversos logradouros, instituições, uma cidade em Minas Gerais e um navio-hospital da Marinha, que presta serviços no Rio Amazonas. Seu legado científico, além das descobertas, é composto de poucos livros. Não dispunha de tempo para escrevê-los, mas deixou uma dúzia de artigos publicados nas principais revistas científicas do mundo. Sua vida e obra foram registradas em algumas biografias, com destaque para o livro de seu colega e romancista Moacyr Scliar “Oswaldo Cruz & Carlos Chagas: o nascimento da ciência no Brasil”, publicado em 2002, e do excelente “Carlos Chagas: um cientista do Brasil”, publicado pela FioCruz em 2009, organizado por Simone Petraglia Kropf e Aline Lopes de Lacerda. Trata-se de um levantamento iconográfico e compilação de expressivos documentos referentes à sua vida, obra e legado. O CNPq mantém a “Plataforma Integrada Carlos Chagas”, uma base de dados e informações disponíveis ao público através do site Carlos Chagas. Em 2019, a Academia Nacional de Medicina realizou o Simpósio “Homenagem a Carlos Chagas: a doença, o homem e a história”, com diversas conferências sobre seu legado.
Carlos Chagas – 130 anos – De lá pra cá
Com Carlos Chagas completamos o “Trio Parada Dura” (junto com Vital Brasil e Oswaldo Cruz) de combate às epidemias e algumas pandemias locais. Na próxima quinzena teremos não um médico dedicado à saúde pública. Teremos um engenheiro: Teodoro Sampaio fez muito para o saneamento básico de São Paulo. Foi um dos fundadores do que hoje conhecemos como SABESP..
JA PENSOU SE A GENTE TIVESSE O DOM DIVINO DE RESSUSCITAR EM PLENO 2020 DO SÉCULO XXI, ESSE TRIO PARADA DURA, HEIN?!?!?!
Pinheiro
Vixe Maria! nem me fale. Com esse trio essa pandemia seria uma gripezinha, né não?!
Talvez seria interessante, mas provavelmente não teria tanto impacto no combate à pandemia
O conhecimento aumentou de tal maneira nos ultimos 50 anos que não é mais possivel hoje que uma pessoa apenas faça uma grande descoberta científica
Percebam que não existe um inventor do computador, do celular, do GPS
São grupos que se debruçam sobre alguns aspectos do conhecimento e cada um faz uma pequena contribuição que vai fazendo a ciencia progredir
Estes 3 citados são os Brasileiros com B Maiúsculo que serviram a ciência e que não tiveram o devido reconhecimento internacional e mesmo nacional.
Há vários outros cientistas, cito apenas Cesar Lattes e Zeferino Vaz que poderiam estar no Panteão dos Heróis nacionais, mas cederam lugar para Brizola, Arraes, Tancredo e Ulisses e Zumbi, dentre outros.
Caro João Francisco
Concordo com você sobre os 3 brasileiros com B maiúsculo. César Lattes está cotado para entrar em nosso Memoral. Zeferino Vaz já está lá.
Este é o Brasil, que o Brasil desconhece. Parabéns José Domingos!
Grato Marcos
Próxima quinzena vamos publicar Teodoro Sampaio. Em São Paulo é conhecido devido ao nome de uma rua importante. Mas ninguém sabe de quem se trata
Memorável cientista importantíssimo que deveria servir de exemplo hoje em dia!
É isso aí, Miriam.
O Brasil tem muitos exemplos que, infelizmente, estão esquecidos em nossa memória coletiva nacional. É uma pena o desperdício de tamanho capital.
No inicio da Medicina, a conclusão do curso se dava com uma “tese de doutoramento”, sem pós-graduação, e talvez contando apenas a “residência médca”, como é exigido hoje.
.
Agora sei porque se chama o médico de Doutor, mesmo sem “tese de doutoramento”, como a conhecemos hoje.
Só preciso saber agora é porque chamam o advogado ,também de , O cabra se torna advogado num curso de Direito, feito de qualquer jeito ás centenas nas Facudades. São os doutores da Lei? Não é pouca coisa.
Depois dos doutores da saúde, o que precisamos é de Lei, ordem para regular, digo administrar a sociedade. Claro que para isso é preciso os doutores da Política, os Cientistas políticos. Mas estes não fazem “Politica”, apenas teorizam e lecionam. as isso é outra história. ,
Se os colegas fubânicos puderem me ajudar, a saber como e porque os advogados são chamados de Doutor, ico agradecido. . . .
Esse endereço aqui talvez possa explicar, Brito:
https://blog.juridicocerto.com/2018/03/por-que-o-advogado-e-chamado-de-doutor.html
Abraços.
Os nossos ministros da saude (todos) não têm 1/100 da capacidade,
estudo, sabedoria e vontade de servir ao país, querem apenas serem servidos.
Por isso mesmo essa quantidade abissal de incompetentes e vaidosos
que não se pejam de mostrar a sua burrice e ambição politica.
Já foi tempo, não é Brito ?
Procure num palheiro próximo e veja se consegue um , apenas um mero nome
digno que se preocupa com a saúde da nação.
Desiste, pois você não vai encontrar.
Eu já desisti do Brasil. Chega, estou esperando a hora de partir para
Passargada .
Abraços.
Pois é, Caro d..matt
E pensar que no meio de uma pandemia mundial, onde o País se destaca, tivemos dois ministros da saúde em um mês e hoje encontra-se acéfalo. É uma tragédia atrás da outra. Vivemos tempos sombrios e nem lembramos de Carlos Chagas Vital Brasil e Oswaldo Cruz. Mas, com este pedigree, haveremos de sair desta.
Carlos Chagas,
Magnifica inclusão no rol das celebridades.
Meu caro Brito,
É sempre uma agradável surpresa e uma verdadeira aula a leitura de qualquer dos magníficos artigos que aqui escreve. Sem falarmos na atualidade do tema, imposta por essa terrível pandemia.
Parabenizo-o mais uma vez pelo resgate da memória desses brasileiros de verdade !