CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

Quando comecei a me entender de gente, em 1952, passei a trabalhar, aos quinze anos, no City Bank, como “office boy”, quando conheci mais de perto os sistemas de comunicação urgentes que muito me admiravam: os telegramas.

De início me inteirei sobre os telegramas nacionais, por dois motivos. Tio Ignácio era telegrafista do Departamento dos Correios e Telégrafos e ouvi algumas conversas dele, sobre a forma e os equipamentos que manejava, a fim de desenvolver seu trabalho, através do Sistema Morse.

Depois, porque meu pai costumava passar telegramas para todas as pessoas de sua família nos dias de seus aniversários. Tinha um livrinho onde todas as datas estavam anotadas.

Havia nesse tempo outras duas empresas do ramo, porém, exclusivas de telegrafia: a Western, inglesa, e a Italcable, italiana. Ambas cobravam valores mais caros do que os nacionais, por utilizarem os cabos submarinos.

A Italcable – Servizi Cablografici, Radiotelegrafici e Radioelettrici foi uma empresa italiana que operava com telecomunicações, fundada em 9 de Agosto de 1921e somente na década de 50 se instalou no Recife.

Posto de Telégrafo Semafórico

Revendo entrevista que tive com meu saudoso amigo jornalista e escritor Napoleão Barroso Braga, recordo que fui informado sobre o antigo sistema de Telégrafo Semafórico também conhecido como Telégrafo Ótico, que operava no Recife até meados do século passado.

Ao capelão da antiga Igreja do Espírito Santo, instalavam-se as bandeiras do tal telégrafo que funcionava no alto da torre daquela igreja obedecendo à sinalização através do movimento de bandeirolas, que mantinha convênio com a Repartição Geral dos Telégrafos, norteadas pelo Código Marítmo, de acordo com a Convenção Universal para os telegramas.

Além das bandeirolas era içado um balão, acompanhado de toques de sino, a fim de avisar à população que havia navio no porto aguardando o recebimento da mala postal.

Os telegramas locais transmitidos pelo Telégrafo Ótico para os navios, com a “dança dos sinais”, se tornou bem conhecida da população. Tais códigos somente eram interpretados pelos operadores:

As bandeirolas de 1 a 4 indicavam o aparecimento de um ou mais navios no horizonte. De 12 a 26 anunciava um tipo de navio mercante. De 31 a 43 eram as categorias de belonaves.

Ainda hoje as marinhas do mundo utilizam as bandeiras para enviar mensagens e as luzes, emitidas por projetor também lembram o Telégrafo Ótico.

Em dias mais recentes a Western dominou o mercado brasileiro da telegrafia transcontinental.

Também operando cabos. transatlânticos, ligando cidades da costa sul da Europa às Américas, a Italcable tentou ser concorrente da Western, hoje, entretanto, está incorporada à Telecom-Itália. Sua filial do Recife situava-se na Av. Marques de Olinda, 225.

Edifício sede da Western, na Praça Arsenal da Marinha, no Recife

A mais conhecida entretanto, era a Western Telegraph Company Limited que também operava com cabo submarino e possuía sede própria, na antiga Praça Arsenal da Marinha, um prédio de quatro pavimentos.

Sabia-se que os telegramas, também naquele sistema inglês, operavam com custos de cada mensagem calculado por palavra, para os telegramas normais, que custavam três vezes mais que as mensagens Telégrafo Nacional.

Para diminuir custos as empresas comerciais inventaram um processo para diminuir a quantidade de palavras e optavam por terem endereços telegráficos – como os atuais e-mails – de forma que foram aparecendo as siglas.

Daquelas que ficaram na minha memória: Cobrama – Cia. Brasileira de Maquinaria; Sanbra – Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro, etc. Assim, evitavam as muitas palavras relativas às suas identidades, endereços e nomes completos.

Na Western eram conhecidas três formas de remessas telegráficas: Urgentes, Normais e CTN; uma espécie de “promoção”, para as mensagens que poderiam ser encaminhadas durante as madrugadas, o que se denominava Carta Telegráfica Noturna.

Bem me lembro que após às 18h eu, bancário-aprendiz, apanhava com a funcionária encarregada dos telegramas, D. Helena Richmond, uma caderneta com várias folhas de mensagens protocoladas e me mandava para o telégrafo inglês.

Lá entregava o material e não mais retornava ao Banco. Tocava a pé para a Faculdade de Ciências Econômicas, na época, situada na Rua do Hospício, na Boa Vista.

Algumas vezes, quando não havia aulas, eu ficava no balcão da Western procurando me inteirar daquele sistema, no qual eu via o funcionário enrolar o papel da mensagem e colocar numa espécie de copo que era colocado num tubo de vácuo que o transportava ao andar superior, a fim de se proceder a remessa. Para mim era um fascínio.

A propósito da redução de palavras recordo um modelo inusitado utilizado por um dos Inspetores do Banco do Brasil, Dr. Moacir Carvalho, que tinha curta frase pronta para informar à sua esposa que havia chegado, quando viajava às capitais, a serviço.

Depois de escrever o nome de Bety e o endereço da família – Praia de Botafogo, 58, Rio – grafava a resumida mensagem: “Beijos. Moacir.” e despachava o telegrama urgente.

Seria um espanto se nos anos 50 eu pudesse imaginar que poderia escrever à vontade no teclado elétrico de um computador e poder expedir mensagens e receber respostas imediatas de um dos meus bisnetos, o Logan, que reside em Las Vegas, sem pagar um só centavo, a não ser pequeno valor já incluído na conta de energia no final do mês.

São aspectos de minha juventude. Dos velhos tempos que já se foram, porém, as cenas ficaram.

6 pensou em “O TELÉGRAFO SUBMARINO E O SEMAFÓRICO

  1. Pegando uma carona em suas recordações, lembro do “corre-corre” que vez por outra se manifestava no escritório de meu avô, comerciante importador de farinha de trigo do Canadá, com a preparação dos papéis exigidos pela Cacex, para emitir a documentação necessária e fundamental ao fechamento do câmbio, fundamental para o processo de importação pretendida.
    Em João Pessoa havia apenas um posto telegráfico da Western, que tinha um horário fixo para transmissão das mensagens e esse horário influenciava o horário de recebimento, pelo “câmbio”, do BB, da documentação mencionada.
    Os interessados, operadores de diversas modalidades comerciais dependentes de câmbio, tinham todos de atender a esse imperativo, o que gerava uma corrida de “fundo” de representantes (estafetas) de todos escritórios, que tinham que chegar ao Banco logo cedo, para permitir que fossem emitidos os documentos oficiais, que deveriam ser entregues no posto da Western (que ficava fora da cidade), a tempo de “pegar a abertura da janela”, que, se perdida, implicava no cancelamento de todo processo, obrigando o interessado a refazê-lo totalmente, no outro dia, enfrentando nova correria.
    Às vezes, até, durante férias escolares e estando no escritório para “ver o tempo passar”, era premiado com a ordem: corre, vai lá no Banco do Brasil deixar esta documentação no “câmbio”.
    Felizmente o escritório não era tão longe da sede (única) do Banco do Brasil.
    Apenas umas quatro quadras, com um ladeira no meio do percurso.

    • Seu comentário é uma crônica que bem poderia ser publicada para que os leitores possam ter ideia do que se passa nos setores de Câmbio e Cacex, nos quais trabalhei como bancário.

      Havia ainda umas dais de ‘Promessa de Vendas de Câmbio” que era um troço muito complicado para entender.

      Vi muito corretor subir as escadas esbaforidos pra não perder a hora do Fechamento do Câmbio.

      Você detalhou muito bem o drama de muitos que como clientes trabalhavam com Câmbio.

      Obrigado pela leitura e seus comentários.

      Bom domingo!

      Carlos Eduardo.

  2. Com certeza, meu amigo. O mundo mudou muito.

    Sempre que viajava a serviço, a maioria das vezes aqui para o Rio de Janeiro, papai anunciava o seu regresso a Recife expedindo através de telegrama da Western ou da Italcable as informações sobre a sua chegada. Em várias ocasiões, foi ele mesmo a receber do estafetao seu telegrama, muitas horas depois de ter chegado em casa!

    Fico imaginando se ele e minha mãe fossem usuários de um celular com o WhatsApp ou o Telegram (veja só) naquela época: uma rápida mensagem de texto, áudio ou vídeo e tudo estaria resolvido:

    Os Jetsons já prenunciavam tudo isso em 1962…

    • Seu comentário faz-me recordar o quanto nossos pais suaram as camisas para trabalhar diante de certas nuanças.

      Tudo era difícil na batalha deles.

      Grato por seu comentário.

      Feliz domingão do Carlão!

  3. E como mudou. Naturalmente as coisas foram sendo substituídas com o avanço tecnológico. No banco eu usava telex pra informar as agências taxa de juros mínimas praticadas para empréstimo. Mandava do computador disponível. Fazia uma planilha com fatores para juros de mora, que hoje poderia ser enviada pelo zap

  4. Caríssimo Editor Assuero (futuro concorrente do Bertão…!),

    Seu comentário enriquece mais a matéria bancária, hoje tão diferente diante dos celulares.

    Se fôssemos, como bancários, detalhar tais trabalhos teríamos muito o que contar.

    Num livro que preparei e ainda não pude editar (depois que a CEPE me pagou e ficou sem verba para editá-lo), falo de muitos detalhes da atividade bancária, comparando os anos e achando graça nas diferenças das comparações:

    No trabalho: DE GUTENBERG A BIL GATES traço linhas breves sobre as alterações das antigas máquinas adressográficas, as somadoras de impulso e outras catrevagens.

    Vou ver se guardei em DVD o texto sapra lhe mandar porque, por mero azar, perdi o computador mas guardei o HD que comporta tal arquivo, mas não disponho de um Leitor de DVD.

    Mande-me seu e-mail para eu ultimar o assunto. Acho que tenho. O meu é: santosce@hotmail.com

    Feliz sábado!

    Carlos Eduardo

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