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Editorial Gazeta do Povo

Fim das “saidinhas” de presos em feriados foi aprovado no Senado e voltará à Câmara

Foi avassaladora a maioria formada no Senado para a aprovação do PL que acaba com as “saidinhas” temporárias de presos em datas comemorativas. Dos 81 senadores, 62 foram favoráveis ao texto, e apenas dois deram votos contrários – Rogério Carvalho (PT-SE) e Cid Gomes (PSB-CE). Senadores de partidos mais alinhados com o governo e até mesmo três petistas votaram pela aprovação, já que o líder Jaques Wagner havia liberado a bancada do PT. Devido a alterações feitas no Senado, o texto retornará à Câmara dos Deputados, onde havia sido aprovado em agosto de 2022 com o voto de 311 parlamentares.

A proposta já tramitava no Congresso Nacional havia mais de dez anos, e ganhou impulso no Senado, em cujas gavetas dormia havia um ano e meio, após as recentes notícias de vários crimes cometidos por presos que se aproveitaram da “saidinha” de fim de ano. O mais célebre deles foi o assassinato do sargento Roger Dias da Cunha, da PM de Minas Gerais, baleado na cabeça em 5 de janeiro por um criminoso que deveria ter retornado em 23 de dezembro à penitenciária onde cumpria pena. Seria muito equivocado, no entanto, considerar que o PL ou sua aprovação no Senado são casuístas; trata-se de uma reação a uma legislação processual e de execução penal repleta de brechas para a leniência com a bandidagem.

Por motivos os mais diversos, que vão da falta de estrutura das forças de segurança à legislação frouxa e à força do garantismo penal, o Brasil é um país onde o crime compensa. Segundo estudo do Instituto Sou da Paz divulgado em dezembro de 2023, o índice de solução de homicídios no país foi de medíocres 35% em 2021, contra uma média mundial de 63%. O estudo ressalta que há graves disparidades regionais, já que os índices estaduais vão dos 9% do Rio Grande do Norte aos 76% do Paraná. Ainda assim, é preciso questionar: se estes são os índices de resolução do crime mais grave, aquele cometido contra a vida, quais serão os números para outros crimes, como os assaltos e os estupros?

E, mesmo quando os criminosos são identificados, nada garantirá que eles realmente acabem atrás das grades; se vão presos, é praticamente certo que jamais cumprirão a totalidade de sua pena, graças a todo tipo de progressão e benefício. Isso transforma a lei penal em ficção e o Brasil, em terra de impunidade, ao contrário do que dizem os militantes do desencarceramento, repetidores do slogan “o Brasil prende muito”, às vezes complementado por um “e prende mal”, como se traficantes de drogas ou quem aponta uma arma para outra pessoa para lhe roubar também não fossem ameaças à sociedade, devendo ser isolados dela.

A “saidinha”, por mais bem-intencionados que fossem os seus idealizadores, que a conceberam como ferramenta de ressocialização para presos do regime semiaberto que já cumpriram parte da pena e demonstram bom comportamento, acabou se tornando mais um fator a alimentar a leniência e a impunidade. Dos 57 mil detentos que deixaram os presídios no último fim de ano, cerca de 2,7 mil não retornaram, pouco menos de 5%. O Rio de Janeiro liderou em termos proporcionais: 14% dos presos beneficiados seguiram nas ruas, incluindo chefes de facções criminosas. Em 2022, a taxa de evasão havia sido três vezes maior: 43%. Que 1 a cada 20 presos aproveite a ocasião para fugir já seria demonstração de falhas no sistema; que eles ainda voltem à vida de crimes é atestado da falência da ferramenta.

O projeto recebido da Câmara, no entanto, ia além do necessário, impedindo qualquer saída temporária. O senador Sergio Moro propôs, então, uma emenda salvaguardando o benefício no caso de presos que frequentassem cursos profissionalizantes, de ensino médio ou superior, desde que cumpridas uma série de condições, como a realização de exame criminológico, e vedando a permissão aos condenados por crimes hediondos ou cometidos com violência ou ameaça contra a vítima. A alteração, que de certa forma preserva o espírito original da saída, ajudou a destravar a tramitação do PL no Senado e facilitou sua aprovação por ampla margem.

Quando surgem ideias que tragam mais rigor no campo da segurança pública ou da lei penal, uma das contestações mais frequentes é a de que “não é essa medida que reduzirá a violência”, ou bordões semelhantes. Mas ninguém está tratando o fim da “saidinha” – ou qualquer outra medida – como a bala de prata que, num passe de mágica, deixará a sociedade mais segura. Esse objetivo só será alcançado com trabalho árduo em muitas frentes, como reforço no policiamento preventivo, melhores índices de resolução de crimes, penitenciárias que efetivamente cumpram seu papel em vez de serem “escolas de crime” dominadas pelas facções, correta aplicação das leis em benefício da sociedade e o fim da leniência com os bandidos. A extinção da “saidinha” nos moldes atuais é parte desse esforço.

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