MARCOS MAIRTON - CONTOS, CRÔNICAS E CORDEIS

Na primeira segunda-feira de 2023, fiz o que muita gente faz: tentei pôr em prática coisas que estive planejando nos últimos dias do ano anterior.

Por isso, acordei relativamente cedo, fiz minha prática respiratória, pus uma roupa leve, calcei os tênis e fui caminhar na rua. Não ainda na distância ou no ritmo pretendido, mas apenas uma caminhada leve, de uns 20 minutos. Incluído na caminhada o recomendado banho de sol, que adquiriu um upgrade de importância nos tempos mais severos da pandemia do corona vírus.

E assim fui iniciar o ano cuidando da saúde! Ciente de que a atividade física pretendida não era lá grandes coisas, mas capaz de cumprir o mais importante: quebrar a inércia dos últimos meses, recheados de sedentarismo.

Missão dada, missão cumprida! Disse eu para mim, ao final do percurso, repetindo a frase que saiu das telas do cinema para a boca do povo, graças à popularidade do Capitão Nascimento. E que voltou a ter atenção no último mês de 2022, dita por uma autoridade da vida real.

O certo é que, como atividade física, a caminhada não foi mesmo grande coisa – como previsto – mas foi ótima como atividade intelectual. A favor disso, o fato de não ter sido feita dentro de um condomínio fechado, em Brasília, mas nas ruas do bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, graças aos dias de recesso forense.

Foi bom andar em meio àquele mundo de gente, por aquelas calçadas irregulares, ouvindo buzinas de carros e motocicletas que disputavam espaço na rua. Ver gente com “roupa de trabalhar” saindo da estação do metrô ao lado de gente com “roupa de praia”. Gente andando de bicicleta, levando o cachorro para passear, juntando o cocô do cachorro da calçada, tomando café em boteco de esquina… gente.

Em meio ao movimento da rua, pensei no quanto Brasília é um lugar distante daquela realidade. As avenidas largas da capital federal, muitas vezes sem calçada, parece que foram mesmo feitas apenas para a circulação de carros. Entre eles, carros pretos, com o vidro das janelas escuro e fechado.

Agora, enquanto escrevo, lembro que um professor de história me disse, certa vez, que as grandes catedrais foram construídas com a intenção de ressaltar a pequenez do homem diante do poder de Deus.

Nunca procurei saber se o que aquele professor disse tinha fundamento científico, mas faz algum sentido. O suficiente para dar certo respaldo aos que dizem que a arquitetura de Brasília foi pensada para fazer o cidadão se sentir pequeno diante do poder do Estado.

As catedrais nos diminuindo no plano espiritual. Os grandes espaços de Brasília nos fazendo pequenos no plano político. A César o que é de César; a Deus o que é de Deus. Não necessariamente nessa ordem.

Mas, assim como a Igreja com tempo perdeu força, notadamente para o Estado, as amplitudes brasilienses parecem não ser mais suficientes para proteger os detentores do poder estatal da pressão popular. Bem o demonstram as grades de ferro que há aproximadamente dez anos enfeiam a Praça dos Três Poderes.

Não há erro de digitação aí. Escrevi “enfeiam” mesmo. Apesar da insistência do corretor ortográfico para substituir a palavra por “enfeitam”, o que me levaria ao perigoso caminho das ironias.

Independentemente do que aconteça nos espaços físicos, boa parte da atenção tem se deslocado atualmente para os espaços virtuais da internet, especialmente das redes sociais. Mas isso é assunto para outra crônica.

De volta à caminhada pelas ruas de Copacabana, acabei chegando à Avenida Atlântica. Do calçadão, olhando o mar, lembrei de uma canção do Lulu Santos:

Nada do que foi será
De novo do jeito que já foi um dia
Tudo passa, tudo sempre passará
A vida vem em ondas, como o mar,
Num indo e vindo infinito.

3 pensou em “CRÔNICA DE SEGUNDA-FEIRA: ENTRE COPACABANA E A PRAÇA DOS TRÊS PODERES

  1. Feliz Ano Novo a todos do JBF.
    Copacabana é uma festa permanente, ao mesmo tempo um caos. O Olhar de quem está de passagem capta a alegria e a beleza natural. O morador do pedaço tem que cuidar da bolsa, do telefone. Importante é o estado de espirito, o turista está desarmado, leve, até o barulho do trânsito vira uma trilha sonora. Já o morador que convive diariamente com o movimento confuso e agressivo dos automóveis acaba o dia implorando silêncio.
    Interessante as duas formas de ver a mesma situação.
    Caminhar diariamente pelo calçadão de Copacabana é entrar numa espiral do bem que fortalece o corpo e alimenta a alma.

    • Fico feliz com sua resposta, C Eduardo!
      Usaste uma palavra que esteve o tempo todo em minha mente, mas não a escrevi: caos.
      Um lugar caótico, mas que não deixa de ser acolhedor.q
      Não é à toa que inspira tantos poetas!

  2. Pingback: CRÔNICA DE SEGUNDA-FEIRA: A SEGUNDA NA TERÇA E A MENTIRA DA LINGUAGEM NEUTRA | JORNAL DA BESTA FUBANA

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