CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

1968 o ano que nunca terminou segundo Zuenir Ventura. Eu era tenente do Exército Brasileiro, servia no quartel de fronteiras em Roraima quando fui promovido a Capitão e transferido para o 20º Batalhão de Caçadores, o 20º BC na minha querida cidade de Maceió. Naquele ano houve uma revolução de costumes no mundo. Foi o tempo das mulheres se liberarem com a pílula. Maceió era uma festa, estava sendo descoberto pelo turismo. Ao chegar à minha casa tive a sensação profundamente gostosa em estar no meu lar, com meus pais, meus irmãos. Apresentei-me no 20º BC onde passaria a trabalhar nos afazeres militares. Logo tomei conta da cidade, era convidado para festas em altas e baixas rodas. Dediquei-me à prazerosa boemia.

Eu tinha dois pontos de lazer, espécie de escritórios: O Clube Fênix Alagoana e o Zinga Bar que era também restaurante e boate. As moças solteiras da cidade que só frequentavam clubes e festas em casas de família deram seu grito de independência frequentando o Zinga Bar na praia de Riacho Doce. Foi um marco na transformação da sociedade conservadora de Maceió. Eu solteiro, bonito, capitão, amava a modernidade, as mudanças dos costumes. O Zinga Bar, a pílula e bons livros contribuíram para revolução sexual no mulherio. Ano inesquecível. Porém, eu tinha um objetivo em minha vida: terminar a Faculdade de Engenharia.

O Sol nasceu no santo ano de 1969. Providenciei minha transferência da Escola Politécnica de Engenharia do Recife, onde eu cursava o terceiro ano quando, sem aviso prévio, fui transferido para Fronteira do Brasil. Vencendo a burocracia me matriculei no terceiro ano da Faculdade de Engenharia de Alagoas. No primeiro dia de aula compareci ao prédio na Praça Sinimbu, entrei na sala do terceiro ano, assisti à primeira aula. Notei algum problema com os colegas, ninguém falou comigo, ninguém se dirigiu a mim, no mínimo para dar as boas vindas. Soube depois: estavam me colocando no “gelo”, simplesmente porque eu era militar. Não passou uma semana, tornei-me amigos dos colegas, amizade que perdura até hoje. O que não faz uma mesa de bar? Depois das aulas, das provas, partíamos para bares e outros locais não compatíveis com futuros engenheiros.

Meu tempo era apertado, tinha de conciliar: o expediente no quartel, as aulas na Faculdade e a Boemia. Tive sorte, deu-se uma vaga de capitão na 20ª CSM, unidade burocrática do Exército no Centro de Maceió com expediente corrido de 7:00 às 13:00 horas. Viajei ao Rio onde ficava o Departamento de Pessoal do Exército e consegui minha transferência. No dia que o homem pisou na lua, 20 de julho de 1969, eu comecei a trabalhar na 20ª CSM. O que facilitou a dedicar-me com afinco aos estudos de engenharia.

Alguns jovens colegas participavam da política estudantil. Havia um líder que militava em partido de esquerda que em plena tarefa de panfletar pontos de ônibus foi preso pela Polícia. Certa tarde havia uma prova muito importante de Resistência de Material. Uma colega, Anacy, perguntou se havia possibilidade de eu trazer o colega preso para fazer essa prova. Fui tentar, Zé Sangreman deu-me carona no fusquinha verde até o DOPS no centro da cidade, onde estava nosso colega preso há três dias. Conversei com o Delegado, me responsabilizei, assinei alguns papéis e levei o preso para fazer prova sob minha custódia. Ao terminar a prova entramos no fusquinha verde, foi quando os colegas pediram para deixar o Galego tomar uma cervejinha na Sorveteria Sorriso. Conversa gostosa regada à cervejinha e pitu, o tempo foi passando, fomos para outros bares, e o tempo passando.

Era mais de meia noite e o colega preso me implorava para retorná-lo à Delegacia, com receio. Afinal chegamos ao DOPS, estava um guarda de plantão que recebeu o preso sem nenhum problema. Ele dormiu até meio dia seguinte. Num fim de semana tomando um uísque no Clube Fênix, uma autoridade aconselhou-me a me afastar de alguns colegas. Eu devia tomar cuidado, eram subversivos, queriam incendiar o mundo. Anos depois, aquele estudante que foi preso, tornou-se governador de Alagoas. Ronaldo Lessa fez um ótimo governo dentro das possibilidades e nada incendiou, preocupou-se mais com o bem estar social e a educação do povo.

Somos uma turma unida, várias aventuras extracurriculares preencheriam um livro. Em 1970 eu encontrei o amor de minha vida, Vânia, com quem estou casado até hoje. Afinal em 1971 houve nossa formatura. Era época do “Milagre Econômico”, todos os colegas ao terminarem a Faculdade estavam empregados. Alguns foram para outros estados. Em Alagoas nossos colegas de turma se destacaram, ajudando a construir o Estado nas empresas estatais e privadas. Alguns entraram na política, foram vereadores, prefeitos, deputados, até governador. Mesmo dispersados nos empregos, durante todo esse tempo, nos encontramos quando podemos. Almoços e outros encontros nos juntam, fortalecendo a amizade. Semana passada houve a celebração de 50 anos de formados, passamos o fim de semana no Hotel Village na Barra. Relembrando e contando histórias, celebrando a vida.

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