CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

ARQUIVO MARCELO BONAVIDES - Estrelas que nunca se Apagam - : RELEMBRANDO CAPIBA

Lourenço da Fonseca Barbosa, Capiba

Vivi perto dele muitos anos, a partir de 1954, quando o conheci. Perdurou nossa amizade até seus últimos dias de sua vivência terrena.

Era um cidadão sacudido, alegre, apressado e de falar engraçado. Estacionava um carro novíssimo, de nome esquisito: Studebaker, modelo 1948, de cor vermelha.

Nesse tempo circulavam por aqui apenas os Ford, os Chevrolet e os Jeep, aqueles carrinhos engraçados, que sobraram da II Guerra Mundial.

Talvez, por aqueles anos já se imaginasse que a cor do novo carro seria uma forma de despertar atenções; e os populares poderiam dizer:

“Que carro lindo aquele do compositor Capiba!”.

Compositores, como os cantores, poetas, escritores e jornalistas, naquela época, precisavam ter seus modos de viver sempre em evidência. Ainda não havia as imagens por aqui. A Televisão estava muito longe de vir às nossas residências. Para Capiba, o carrão e o modo engraçado de falar lhe dariam propaganda gratuita e permanente.

Lourenço foi um moço a quem a Divina Providência premiara com corpo atlético, permitindo-lhe chutar muitas bolas no futebol amador e dedos fortes para teclar pianos nos cinemas, nas residências e nas grandes festas de formatura.

Sadio de corpo e espírito, era o suficiente para suportar uma jornada longa, de 92 anos de vida. Capaz de resistir à introdução de duas pontes-de-safena que ajudariam seu coração a bater mais perfeitamente, compondo músicas românticas e frevos efervescentes.

Tornar-se-ia famoso, mesmo com um pequeno “defeito de fábrica”, ao falar, pois engolia as consoantes; notadamente aquelas em que o “K” era seu inimigo maior, pois nascera tato e meio gago; ou seja, tinha distúrbio de fala.

Assim, me chamava “Arlos” ao invés do normal na fala de todos os demais viventes: Carlos.

Não era apenas um bancário-compositor, mas um intelectual. Sabia aglutinar as pessoas cultas em torno dele, quando aproveitava para contar “causos” que a todos alegrava.

E como gostava de apelidar todos que conhecia, acabou se tornando “Apiba”. De forma natural, qualquer pessoa responderia, numa apresentação: “Sou Lourenço da Fonseca Barbosa, mas no meio artístico, sou conhecido como Capiba”.

Porém, como costumava engolir a consoante “K”, pronunciava: “Apiba”.

Só muito depois daquele longínquo 1954 é que ficamos próximos, porque fui trabalhar perto dele e quase todos os dias nos encontrávamos em respeitosos cumprimentos:

“Bom dia, Doutor Lourenço!”

Tempo depois “fuzilou” minha minha forma de cumprimentá-lo e disse que lhe chamasse, simplesmente: Capiba. Nossa camaradagem respeitosa foi se tornando amizade. Em 1984 publiquei sua primeira biografia. Quem diria!…

Decorrido um estirão de tempo, fui me enfronhando em seus grupos de intelectuais e acabei convivendo com inesquecíveis nomes que já eram ou se tornariam famosos:

Gastão de Holanda, Osman Lins, Hermógenes Viana, José de Morais Pinho, Carnera, Nelson Ferreira, Mílton Persivo, João de Belli, Asdrúbal de Assis, Aldemar Paiva, Mário Sette, Ariano Suassuna, Fernando Lobo, Claudionor Germano, Gilberto Freyre, Dias da Silva, Esmaragdo Marroquim, Mário Souto Maior, Luis Marinho, Mauro Mota, Mário Melo e Valdemar de Oliveira. Alguns, face ao convívio jornalístico na Redação do velho Diário de Pernambuco.

Por ora, nesse incessante recordar, basta dizer que estou paginando um livro, que venho escrevendo há muitos anos, para dar um grito de vitória: “Viva Apiba!”

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