CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

ECCE HOMO

João Pessoa, 30 de Março de 2022

Eu, Teresa Oliveira, servidora de carreira do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, adentrei as portas da Ouvidoria daquele órgão, tal qual Pilatos entrou no Credo, ou seja, contrariando a vontade da chefia imediata que fora obrigada a dobrar-se ao humanismo do Des. José Aurélio da Cruz.

O brilho do meu par de jabuticabas dera lugar a punhados de lágrimas salgadas. Mesmo assim, longe de Chico, tudo era insosso.

Era aniversário de Francisco, meu filho unigênito, meu autista.

Não obstante ser eu detentora de direitos asseguradores de jornada reduzida e teletrabalho, a chefia obrigou-me a cumprir o expediente completo de forma presencial.

Meu filho e eu residimos em Natal-RN, onde há uma decisão judicial garantidora da realização do tratamento de Francisco na Capital Potiguar, decisão esta fundamentada no direito ao vinculo terapêutico, mais uma conquista da comunidade autista.

Naquele dia, com o sol se pondo às margens do Rio Sanhauá, atravessei os limites geográficos da BR 101, assim como fez o Bom Samaritano em seu trajeto entre Jericó e Jerusalém.

Cheguei em solo natalense ainda em tempo de aproveitar o “primeiro” pedaço de bolo reservado para a Mãe de Chico. A intensidade da emoção do meu filho foi igualmente proporcional ao surto psicótico sofrido por ele. O episódio de autolesão culminou em um sangramento nasal.

Vi a carne da minha carne açoitada pela distância sangrante e coroada com os espinhos da fragilidade seminua perante as incertezas da ausência. Parecia ouvir o martelo e os insultos: “Se és o filho de Deus, salva-se a ti mesmo e desce dessa cruz.”

Igualmente a Maria de Nazaré, senti uma espada de dor traspassando a minha alma. Todavia, a profecia de Simeão não fora cumprida em sua integralidade.

* * *

Natal, 02 de Fevereiro de 2023

O telefone toca, meu corpo treme e, de forma reincidente, o segundo punhal talhado na perversidade de uma Mulher sem pauta de solidariedade e especialista em perfurar minha alma, golpeou-me. Sem tempo ou direito à defesa, fizeram-me sangrar desumanamente um dia após o reingresso do ano letivo de Francisco.

Avisou-me, a mulher deficitária de compaixão, com desdém, que, em nome do Senhor Ouvidor recém-empossado, eu havia perdido a minha utilidade no setor. O Des. José Aurélio da Cruz, o meu Cirineu, está aposentado.

– Serva inútil – assim pensei. Assim, igualmente vós, depois de haverdes realizado tudo quanto vos foi ordenado, dizei: Somos servos inúteis, pois tão somente cumprimos o nosso dever.

O motivo alegado pela senhora, torpe e viciado: o pleno exercício dos meus direitos à jornada reduzida e ao teletrabalho, era desinteressante ao setor.

Tragicamente, a alegação de inutilidade de uma servidora do JUDICIÁRIO seria a prática de DIREITOS naturais, positivados e HUMANOS? Direitos estes conquistados pela luta incansável de mães de autistas que me antecederam. O caminhar de Berenice Piana de nada valeu? Fátima D. Kwant lutou em vão? O discurso amoroso e esclarecedor de Marcos Mion não passa de palavras ao vento?

As interrogações ficarão no ar aguardando que a Corte de Justiça Paraibana não lave as mãos e não repita omissão de Pilatos diante da crucificação de Jesus em plena Quaresma do ano de 2023 d.c.

8 pensou em “TERESA OLIVEIRA – NATAL-RN

  1. Tereza, aqui em nossa escola, nós temos dois alunos, gêmeos e autistas.
    Fizemos e temos toda uma preparação para ambos. Eu nunca havia visto uma situação como essa que você tão bem descreveu em seu texto, sobre autolesão. Confesso que fiquei assustado quando o vi sangrar pelo nariz. E cada vez que uma das professoras o limpava, ele de novo se autolesionava.
    Posso compreender muito bem o seu posicionamento, sua luta.
    Vamos ter fé!! Vamos vencer!! Você e seu filho, são mais que vencedores!!!

  2. Cara Teresa, que nunca lhe falte saúde e paz para dar amor ao seu querido Francisco (meu xará).

    Ele é o Anjo que Deus lhe deu para cuidar, o que o fazes com muito mérito.

    Um beijo carinhoso deste que é pai e agora avô de duas meninas abençoadas.

  3. Dona Teresa:

    A sua história me comoveu muitíssimo, por isso a minha solidariedade e as minhas orações pela senhora – uma verdadeira heroína – e pelo seu ( naturalmente, o maior tesouro!!!) filho – o Francisco.

    Tenha fé e creia que Maria Santíssima – Medianeira de Todas as Graças – mãe como a senhora e que, portanto, lhe entende melhor do que ninguém (pois viveu ora as maiores alegrias, ora as maiores tristezas – por Seu Filho!!!) há de proteger vocês dois, permanente e integralmente, e lhes abrirá todos os caminhos.

    Pois o Seu Filho – nosso Senhor e Deus, Jesus Cristo – apesar de ser infinitamente poderoso, é infinitamente bom, justo, misericordioso e amoroso e, também, por isso mesmo, obviamente, obediente à Sua Mãe e, nunca, jamais, em todo tempo e lugar, deixará de atender um pedido Dela.

    E, apesar de ser o tempo de Deus diferente do nosso, tenha – sempre!!! – absoluta certeza que (mais cedo ou mais tarde) tudo de bom e de bem acontecerá e a solução será – sempre!!! – muitíssimo melhor do que a senhora imagina e/ou pede para si e para o seu amado filho.

    Portanto, continue rezando confiante e fiquem ambos – agora e sempre!!! – na Paz do Senhor e sob a proteção de Maria Santíssima!!!

    E, parafraseando:

    “DEIXA ESTAR, POIS SE DEUS NÃO JOGA, ELE FISCALIZA.
    E A VOLTA VEM E VEM A GALOPE!!!”

    Um baita abraço fraterno e solidário,

    Desde o Alegrete – RS,

    Adail.

  4. Prezada Teresa, a senhora não estará sozinha nesta luta, milhares de Teresas estarão ao seu lado e na frente de todos, estará o Deus Pai Todo Poderoso e contra Ele, nenhuma força do mal vencerá. Força, DEUS está contigo!!!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *