CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

Luiz Rodolfo de Rangel Moreira

Já disse que fui um privilegiado em ter convivido entre notáveis. De minha lista incluo o advogado Luiz Rodolfo de Rangel Moreira e seu colega, o criminalista José David Gil Rodrigues, indiscutivelmente um dos maiores criminalistas de nossa época.

Formavam uma parelha infernal. Trabalhavam juntos em um escritório que ocupava todo um pavimento do antigo prédio do Jornal do Commercio, no Centro do Recife, banca que se tornou famosa pelas causas difíceis que conseguia reverter e a cobertura que a Imprensa lhe dava.

O relacionamento entre os dois advogados vinha dos tempos de faculdade. Ficou ainda maior a amizade com uma aproximação quase parental porque eram compadres.

Luiz Rodolfo e Zé David tinham conhecimento dos poderes afrodisíacos, “inteligentícios” e revitalizantes de certo prato, fornecido em modesto estabelecimento situado no Mercado da Madalena, o “Bar de Severino”.

Quando se aposentou do Serviço Público, Luiz Rangel, como se tornou mais conhecido, fixou-se no escritório de Zé David e formaram uma dupla, que se não interessante, pelo menos era quase folclórica.

Luiz Rangel era um camaradão, tipo “bom vivant”, mas pra variar, sempre se engavetavam em questões menores. Dois gênios da advocacia, já viu!, discordâncias sempre estavam no ar.

Não raro a coisa se desenrolava num dos gabinetes, até por causa de um sapato sem cadarço, tipo “entrada baixa”. E discutiam às alturas.

Os filhos de Zé David, também advogados, que trabalhavam no mesmo local e ocasionalmente passavam pelos corredores admitiam que eles estavam “cochichando”… Quando não havia motivo para discussão se engalfinhavam por falta de assunto para “se pegarem”.

Certo dia o compadre Rangel não estava bom dos bofes quando Zé David lhe deu uma alfinetada, por motivo que se desconhece. Só se ouviram os gritos de Luiz pelo corredor:

– Que se dane! Não volto mais aqui. Pendure seu escritório de merda. Vá pro inferno com tudo!

Ninguém acreditava que fosse briga séria mesmo. Entretanto, nos dias seguintes o silêncio misterioso se fez notar. O afilhado, Carlos Gil, foi ao gabinete do pai e o encontrou muito triste, até acabrunhado.

– O que foi papai? Alguma coisa séria?

– Meu filho, eu não sei o que disse demais para o compadre ficar tão aborrecido. Agora quem está encafifado sou eu…

E ficou trancado sozinho, matutando. Até cancelou alguns clientes. Horas mais tarde foi almoçar acompanhado de um dos filhos, Mário Gil. Contudo, notava-se seu aborrecimento com aquela situação porque Zé David mal sabia em que ponto ofendera muito seu querido compadre.

Lá pelas cinco horas Zé David resolveu por à prova seu espírito de bom articulador e telefonou pro compadre pelo Interno:

– Compadre, vamos tomar uma Sopa de Cabeça de Peixe lá no bar de Biu de Maria?

E que sopa foi essa que ambos se descontraíram e a amizade continuou sólida como antes. Ambos se relaxaram, desculparam-se como dois cavalheiros adultos, enquanto boas colheradas de sopa desciam goelas abaixo.

O que se ouvia era um cochicho danado e as colheres tilintando nos pratos. Fora a sopa da paz

José David Gil Rodrigues

Tive o privilégio de haver conhecido de perto estes dois notáveis.

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