MAURÍCIO ASSUERO - PARE, OLHE E ESCUTE

O prefeito da cidade Caaporã, Paraíba, ilustríssimo senhor Chico Nazário, foi filmado guardando, cerca, de R$ 400 mil numa bolsa. As apurações apontam para favorecimento de uma empresa para fazer a coleta de resíduos, cujo contrato beira os R$ 3,2 milhões supera o valor da gestão passada, mais que o dobro. Lógico, que o prefeito nega as acusações, alegando se tratar de um “vídeo fake” e que nada daquilo aconteceu. Acrescente-se que o intermediador desse contrato foi nomeado para uma secretaria e recebe, mais ou menos, R$ 9 mil.

De acordo com o IBGE, Caaporã, tem 21.193 habitantes, uma média de salário formal de 1,7 salários-mínimos, com 5.147 pessoas ocupadas. Registre-se que 48% da população vive com menos de 0,5 salário-mínimo por mês. Surpreende a taxa de escolarização entre 6 e 14 anos: 99,51%. O que interessante é que 91,39% da receita do município vem de transferências governamentais, ou seja, recursos repassados pela União e pelo Estado. Considere, ainda, que a Paraíba é o terceiro estado no Brasil com maior taxa de analfabetismo e Caaporã, particularmente, tem 29% da população analfabeta.

Poderia desenvolver uma tese de que a corrupção se alastra mais rápido em municípios com essas características, ou seja, quanto mais dependente do governo, quanto mais dinheiro vem e por mais “carimbado” que ele seja, o pessoal acha um jeito – diga-se, legal – de sacanear com a população. Seria, todavia, simplista demais e, além de tudo, seria esquecer que grande parte dos nossos representantes são doutores (advogados, médicos, engenheiros, educadores etc.) e que são eles os principais vetores do estado corrupto que é o Brasil.

Lamentavelmente, esses fenômenos não são próprios de cidades pequenas, interioranas, pobres e dependentes. No seio do estado mais rico do país, ali na conhecida região do ABCD, um prefeito, que no passado foi acusado de improbidade – quando era secretário municipal – e foi proibido de ocupar cargos públicos, incluindo os cargos eletivos. Apesar disso, esse cidadão foi eleito prefeito e foi afastado do cargo devido a uma operação da Polícia Federal.

Como se diz, “é chover no molhado” falar de corrupção no Brasil. Todos os dias, ações da PF, do TCU – apesar de sua inclinação política – revelam meandros cada vez mais intricados de atos de corrupção e não acontece absolutamente nada. O Brasil tem umas coisas estranhas: não há prisão perpétua, mesmo quando se trata de um crime hediondo. A corrupção deveria ser assim considerada, mas tudo que se faz é proibir o envolvido de concorrer a cargos eletivos por oito anos, ou seja, duas legislaturas. Nesse tempo, usando as brechas legais, o acusado “prova” que é inocente.

Enquanto isso, questões fundamentais como saúde, educação, segurança alimentar, empregabilidade, dentre outras, vão ficando relegadas a um segundo plano, porque o que nossos governantes pretendem, e precisam, é que a população continue dependente. Para não me alongar com termos técnicos, convido os senhores a uma rápida lida no Anuário de Educação Brasileira (Todos pela Educação), recentemente divulgado. Nossos alunos são incapazes de compreender matemática e português. Cerca de 8% dos alunos do terceiro ano do ensino médio conseguem proceder uma leitura correta e responder algumas questões de matemática.

A disparidade entre os estados do nordeste é quase uniforme, mas um dado preocupa: o baixo percentual de alunos do 3º ano do ensino médio que conseguem alguma proficiência em matemática e português. Nos anos iniciais, observa-se casos de um percentual elevado, por exemplo, 39,9%, mas quando a coisa tende para os anos finais, vira loucura e a falta de entendimento: o que houve com esse aluno que aprendeu alguma coisa de matemática e português nos anos iniciais? Ele chegou nos anos finais sem saber muito?

Eu vi uma declaração de um sindicato de professores comentando estes resultados. Para o interlocutor, a culpa não é apenas do professor, entretanto, não se enxerga uma pista de quem poderia ser responsável por esse estado caótico. Na verdade, há uma cadeia de culpados – mas, não há culpados na cadeia – e o principal dele, sem dúvida e o estado. Quem contrato o professor, é o estado e, também, cabe a ele fornecer as condições para se produza um bom resultado.

Fala-se da falta de dinheiro, da precariedade das estruturas físicas, da falta de equipamentos adequados etc. e tudo isso decorre, apenas, de um problema básico: corrupção. O desvio de dinheiro público conduz a essa situação de lamúria que se propaga dia a dia sob as benesses de quem deveria combatê-la.

Como decorrência da falta de conhecimento, temos os analfabetos funcionais, o subemprego, o atraso tecnológico, a mendicância por recursos constitucionais, a manutenção da pobreza e no fim dessa linha de miséria, temos as mesmas figuras que são sempre eleitas porque sabem manter esse povo dependente.

Nos velhos filmes de faroeste, uma das cenas mais comuns eram os grandes duelos. As divergências eram resolvidas na hora e o mais rápido no gatilho, o vencedor. Os duelos, atualmente, deveriam ser mais intensos no campo das ideias e não das armas porque é complicado quando uma pessoa busca defender uma ideia, de forma clara, democrática, e se depara com uma arma na mão de outra pessoa que tem divergência. Ter divergência não significa, necessariamente, ter razão.

Nos Estados Unidos é bastante comum o uso de armas para calar ideais. Lincoln (1865), por exemplo, foi assassinado por John Booths o por motivação o extremismo sulista após a guerra civil americana. James Garfield (1881) foi assassinado por Charles Guiteau por conta das suas frustações com sistema de patronagem, ou seja, o homem – um advogado medíocre, fracassado – escreveu um discurso em apoio à candidatura de Garfield e esperava, com isso, obter algum cargo na administração e por não conseguir, tomou a decisão de assassinar o presidente em 1901.

O caso de Kennedy (1963) vive cercado de controvérsias com um forte enredo de conspiração, dentre algumas, a que o próprio governo acobertou o assassinato, que havia mais de um atirador, que era por conta da invasão da Baía dos Porcos e que havia ligação entre Lee Oswald e Fidel Castro etc. Mais recentemente, uma bala de fuzil passou zunindo a orelha de Trump.

Outros casos envolvendo atentados, mas que as vítimas sobreviveram também são encontrados nos Estados Unidos. Há alguns bem esquisitos como o caso de Andrew Jackson (1835) que a arma falhou duas vezes e Gerald Ford que foi ameaçado por duas mulheres. Theodore Roosevelt (1912) e Ronald Reagan (1981) foram atingidos por armas de fogo. O primeiro, apesar de baleado, continuou o discurso.

No Brasil, os casos mais notórios envolvem Arnon de Mello que foi atirar num adversário, no senado, e atingiu outro que “pagou o pato” e, evidentemente, o caso de Bolsonaro que levou uma facada durante a campanha. Há, certamente, outros casos conhecidos, mas fiquemos com estes que foram citados. A questão dessas citações, está associada com o assassinato de um jovem de 31 anos que defendia o ideal de direita americana. Na Colômbia, durante a campanha presidente, um candidato da direita morreu em consequência dos tiros disparados um por jovem de 14 anos.

É sabido que a esquerda, de um modo amplo o socialismo, tem regras bem nítidas de implantação do seu sistema mundo a fora. Milhões de pessoas morreram sob o domínio de Lênin, não se sabe quantos se calam pelo regime da Coreia do Norte, mas é sabido as atrocidades cometidas por Che Guevara na, chamada, revolução cubana. O medo é uma forma natural de imposição. É por conta do medo que acontecem muitos abusos sexuais de crianças, por exemplo. Parece algo, infinitamente, paradoxal se falar de democracia, mas não se permitir que pensamentos contrários sejam ditos, defendidos ou pronunciados.

Não se pode calar um pensamento contrário à bala. A tentativa de silenciar pela força o que diverge de nossas crenças é não apenas um erro ético, mas uma afronta direta à ideia mais fundamental da democracia: a convivência entre os diferentes. A bala é a negação da palavra. Quando se abandona o argumento e se opta pela arma, decreta-se o fracasso do diálogo.

A democracia não é um lugar de unanimidades forçadas, mas um palco de debates vigorosos, onde o dissenso é não só permitido, mas necessário. É na pluralidade de vozes que se constrói o bem comum. E nenhuma sociedade pode dizer-se justa se não for capaz de proteger aqueles que pensam diferente. A história está repleta de exemplos de regimes que tentaram apagar pensamentos com pólvora. Mas ideias não sangram, não morrem, ao contrário: quando reprimidas, tendem a crescer com ainda mais força. Quem deseja calar o outro com violência, revela não apenas intolerância, mas medo. Medo da palavra, medo da mudança, medo do confronto civilizado.

Respeitar o pensamento contrário é um ato de coragem democrática. Significa aceitar que a verdade pode ter várias faces, que não somos donos do mundo nem da razão. E é justamente esse respeito que diferencia uma sociedade autoritária de uma sociedade livre. Portanto, que nunca se normalize o silêncio imposto pela violência. Que nunca se tolere o discurso que legitima o ódio contra quem discorda. Que nunca se esqueça: numa democracia, o embate se dá com ideias, não com balas. E é no ruído saudável dos argumentos, e não no estrondo de tiros, que se constrói um futuro verdadeiramente humano.

O abuso político pode levar a consequências extremas como o que acontece atualmente no Nepal. Confesso que não se o Brasil tem um termômetro que mostre a real temperatura. Ao que parece, não.

3 pensou em “SEM CHANCE

  1. Caro Assuero com mais um texto rico em detalhes e verdades. Os gestores desse país (refiro-me aos três poderes) podem tudo, democracia só valem a deles e sabemos o preço que se paga para ser imposta, na minha região falta mão de obras para atividades básicas, todos atrelados a um programa social, o governo não produz riquezas, somos nós pagadores de impostos às vítimas de suas excelências. Abraços!

  2. Bom dia, meu caro Xavier. O desastre é grande e eu não consigo entender como algumas pessoas, com mestrado, doutorado, pós doutorado etc.. concordam com essa porcaria

  3. Ainda que todas decisões políticas em todas as instâncias administrativas envolvvessessem as “melhores trocas”(Thomas Sowell) ainda assim esbarrariamos no inevitável fato do “cobertor ser curto”.
    Agora imagine-se uma situação em que a maioria das decisões de “trocas” seguem caminho diversos e o cobertor, já curto, segue sendo despedaçado em “tenebrosas transações”.
    Some-se a isso a perda dos fundamentos que, ao longo do tempo, conduziram o mundo ocidental ao desenvolvimento, objetivo daqueles.
    Bem vindos ao Brasil, onde a corrida para o precipício atingiu seu objetivo.
    Parabéns e obrigado, Professor Doutor Assuero!

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