A minha mocidade há muito pus
No tranquilo convento da tristeza;
Lá passa dias, noites, sempre presa,
Olhos fechados, magras mãos em cruz…
Lá fora, a Noite, Satanás, seduz!
Desdobra-se em requintes de Beleza…
E como um beijo ardente a Natureza…
A minha cela é como um rio de luz…
Fecha os teus olhos bem! Não vejas nada!
Empalidece mais! E, resignada,
Prende os teus braços a uma cruz maior!
Gela ainda a mortalha que te encerra!
Enche a boca de cinzas e de terra
Ó minha mocidade toda em flor!
Florbela Espanca, Vila Viçosa, Portugal (1894-1930)
Mais uma vez Florbela, já no seu ocaso, lembra dos seus tempos áureos da mocidade.
Guardara estas lembranças em um lugar tranquilo, sempre presa.
Satanás, ladino que é, tenta lhe seduzir com promessas de beleza e beijos ardentes da natureza.
O objetivo? Fazer Florbela voltar aos tempos de mocidade (afinal ela tinha pouco mais de 30 anos).
No entanto sabe que não há volta e que este tempo já se foi.
É a vida.