MARCELO BERTOLUCI - DANDO PITACOS

Você acha que pode existir uma família rica em que todos os integrantes desta família são pobres? Não faz sentido, não é? E um país rico onde todos os cidadãos deste país são pobres, faz mais sentido? Não, não faz, mas essa bobagem, ao contrário da outra, muita gente engole. Vou tomar a ousadia de dizer que esse é o dilema fundamental da vida em sociedade: o estado existe para atender às pessoas ou as pessoas existem para atender ao estado?

Falando assim, parece óbvio, mas o interessante é que muita gente diz que prefere a primeira opção, mas age de acordo com a segunda. O estado se esforça muito para que as coisas continuem assim; é importante que as pessoas acreditem que o estado está sempre certo, e que é do estado que vêm todas as coisas boas. Isso é ensinado nas escolas desde o primeiro dia de aula, e um monte de artifícios do dia-a-dia está sempre reforçando essa idéia.

Um destes artifícios é uma porcaria matemática chamada PIB – essa mesma que é repetida por economistas, jornalistas, políticos e por todo mundo que acredita que o governo cuida de nós. A fórmula do PIB foi criada nos EUA durante a Segunda Guerra Mundial, e é justamente durante as guerras que os políticos levam ao extremo a idéia de que países estão acima de tudo, e pessoas existem para trabalhar e morrer por ele. A idéia é que “PIB maior” é uma coisa boa, então quando o governo fala que o PIB aumentou, todo mundo fica feliz e acredita que o governo está certo. Mas está mesmo?

O conceito do PIB (que significa Produto Interno Bruto) é o de país rico com povo pobre: ele valoriza o total de dinheiro gasto, não importando se esse gasto foi útil ou não para a população. O que importa é acreditar que um número grande significa algo bom.

Qualquer um que tenha tido aulas de economia na faculdade conhece a fórmula: PIB = C + I + G + X – M. Na fórmula, C e I representam os gastos e investimentos privados. G é o gasto do governo. X é o total de exportações e M o total de importações.

Um dos problemas básicos é que o cálculo não mostra a utilidade dos gastos: para o PIB,não há diferença entre as pessoas comprarem coisas que sejam úteis ou o governo obrigá-las a comprar kits de primeiros socorros para seus carros, para ficar em um exemplo simples. Ou, como gostam de dizer os adeptos da escola austríaca, se o governo contratar metade da população para cavar buracos no meio da rua e a outra metade para tampá-los, o país teria um PIB maravilhoso.

Outro problema é que, na fórmula, quanto mais o governo tira dinheiro das pessoas para gastar, mais o total cresce. Então quanto mais o governo faz o que não devia fazer, que é tomar o dinheiro das pessoas, mais parece que ele está certo. Aliás, os governos costumam adotar políticas que tem a intenção específica de aumentar o número do PIB, como forma de mostrar ao povo que é eficiente. Claro que isso torna o resultado ainda mais inútil. Esse efeito é conhecido na ciência como Lei de Goodhart: Quando uma medida se torna uma meta, ela deixa de ser uma boa medida.

Se, por exemplo, o governo dinamitasse a ponte Rio-Niterói e gastasse um bilhão de reais para reconstruí-la exatamente do mesmo jeito, o PIB subiria um bilhão de reais. E se o governo fizesse isso três vezes seguidas, o PIB subiria três bilhões. E, para completar o absurdo, o dinheiro gasto para limpar o entulho das pontes dinamitadas também melhoraria o PIB.

Se milhares de pequenos empresários, em conjunto, produzem cinco bilhões de reais por ano em produtos, eles contribuem para o PIB com cinco bilhões. Mas se o governo toma 20% do faturamento destes empresários e usa o dinheiro para construir uma arena padrão FIFA em Cuiabá ou Manaus, o PIB aumenta mais um bilhão. E quanto mais dinheiro o governo toma das pessoas que trabalham, mais o PIB sobe, não importa se o dinheiro foi usado para construir pontes, pagar aspones ou comprar lagostas para os juízes.

Aliás, os adeptos das teorias keynesianas costumam dizer que não importa se os gastos do governo (feitos com nosso dinheiro, nunca esqueça) são eficientes ou não: o que importa é que o dinheiro irá circular na economia. Por essa lógica, assaltos e corrupção também são coisas boas, porque ladrões e políticos também irão gastar o dinheiro que roubaram, e movimentar a economia.

Falta falar da última parte da fórmula: a que considera exportações como “positivas” e importações como “negativas”. Mais uma vez, isso significa colocar artificialmente o estado acima das pessoas, porque na verdade países não exportam ou importam: quem faz isso são os seus habitantes. Mas a lógica do PIB diz que se um agricultor do Rio Grande do Sul vender seus produtos para um supermercado em Montevidéu ao invés de um em Porto Alegre, isso afetará a vida de todos os outros brasileiros. E se o mesmo agricultor, com o dinheiro que ganhou, comprar uma garrafa de vinho uruguaio, a lógica do PIB também diz que isso afetará a vida de todos os brasileiros. Por outro lado, a realidade econômica mostra que todos os países desenvolvidos e prósperos importam e exportam muito. Mas para a fórmula do PIB, um país que importa cem e exporta cem é igual a um país que exporta dois e importa dois.

Cada vez que um trabalhador autônomo no Brasil compra um celular, algo que vai melhorar sua produtividade e ajudá-lo a melhorar de vida, o PIB piora (não esqueça que o Brasil não fabrica celulares; no máximo, aperta os parafusos das peças importadas). Isso também acontece cada vez que um trabalhador compra uma ferramenta, um computador, uma máquina ou qualquer coisa que vai melhorar sua vida, se essa coisa for contaminada pelo “pecado” de ter sido fabricada em outro país.

Em resumo: o cálculo do PIB é uma aberração econômica que serve apenas para dar importância a governos inchados e gastadores. Deveria ser esquecido, substituído por algo que faça sentido, mas isso não acontecerá, porque toda a burocracia que mantém esta estrovenga é paga pelo governo – com nosso dinheiro.

13 pensou em “PIB = PORCARIA INÚTIL E BESTA

  1. Caro Marcelo, o PIB de um país é apenas um dos meios de medir a sua riqueza.

    É uma média pura e simples de tudo o que um país produz dividido pela sua população. Detalhe, em dólar.

    É óbvio que num universo de 10 pessoas, se 5 comem dois frangos e 5 não comem nada a média é um frango por pessoa. A média não mostra que 5 pessoas passam fome enquanto 5 tem sobrepeso.

    Pode haver país com PIB alto e muitas pessoas pobres, porém país com PIB baixo e pessoas ricas, também não existe.

    Por isso há outros índices que permitem avaliar um país, como o IDH Índice de desenvolvimento Humano (que inclui saúde, renda e educação), o ranking de liberdade econômica (já falamos sobre isso). Tem até o índice macDonald de custo de vida (atrela o custo em dólar do big mac de cada país e os compara).

    Se um governo gasta muito, além do que sua economia permite é errado que terá um PIB alto. Esquece que este número é atrelado ao dólar e que se suas finanças forem um desastre o dólar irá para as alturas?

    Portanto, mais uma vez v. foi muito simples em sua análise e sinceramente não entendi onde quis chegar.

    abraço

    • Meu ponto principal é: quanto mais o governo gasta, mais o PIB aumenta, por definição. Divulgando um PIB maior, tem-se a impressão de que a economia vai bem, o que pode não ser verdade, e geralmente não é.

      Quanto aos outros pontos: o PIB é calculado na moeda de cada país, reais no caso do Brasil. Claro que dá para transformar em dólar ou euro com uma simples conta. Você também misturou PIB com PIB per capita.

      IDH é outra porcaria, até pior. Foi inventado pelos burocratas da ONU para glorificar estados gigantes e assistencialistas. Basta ver que eles acreditam que Cuba tem um dos maiores IDH das Américas.

      Indice Big Mac foi uma brincadeira feita por uma revista dos EUA que jornalistas do mundo inteiro levaram a sério (não há nenhuma razão para achar que o McDonalds define o preço do Big Mac no mundo inteiro baseando-se apenas nos custos e com margem fixa de lucro).

      Por último, quando vc diz que não há país rico com PIB baixo mas pode haver país pobre com PIB alto, já não é um sinal de que o PIB não é lá essas coisas como indicador?

      Mas na verdade sua afirmação é duvidosa. Veja um exemplo dentro da UE: a economia da Letônia vai muito bem, o país está enriquecendo. A Grécia, todos sabem que está quebrada, com dívidas impagáveis e desemprego nas alturas. O povo da Letônia está vivendo muito melhor que o da Grécia. Mas o PIB per capita da Grécia é maior que o da Letônia, justamente por conta das despesas do governo.

      Aonde quero chegar é: o número do PIB reflete muito o tamanho do governo e reflete pouco da economia real de um país. E acreditar no PIB como indicador de riqueza ou prosperidade leva um povo a elogiar e apoiar governos ruins.

      • Marcelo, como eu disse o PIB é a somatória de tudo o que foi produzido no país. Se considerarmos a moeda local tem que descontar a inflação do período.

        Na composição do PIB o investimento governamental é importante, porém não indica sequer a maior parte.

        Se a Grécia está quebrada o governo não pode investir nem com impressão de moeda, pois lá impera o Euro. Quem dita as regras na Grécia são os países credores (principal: Alemanha) e estas regras são duras.

        Se a Letônia deve pouco, tem uma administração enxuta, vai atrair capital privado para investir e este é o melhor dos mundos.

        Este é um assunto muito complexo para resolver ou tirar conclusões em poucas linhas, porém adianto que o liberalismo econômico com a redução do estado na economia é o caminho e acho que nisso concordamos.

          • A Grécia não pode imprimir dinheiro, devido a isso teve um tombo no PIB de 35% (isso mesmo) entre 2008 e 2016 quando seu PM era um doido de esquerda. Agora cresce coisa de 2% por ter implantado uma rígida política fiscal imposta pela Alemanha.

            • Você acha que imprimir dinheiro (e aumentar o PIB) teria ajudado a Grécia?

              Então você vai ficar feliz com a economia brasileira nos próximos meses….

  2. Bertoluci e João Francisco é briga de cachorro grande, com pedigree.
    Sancho, um vira-latas pulguento olha o texto de um, e o de outro, mas (irracional mas),, como na faculdade fez humanas e não exatas, diverte-se com as pulguinhas que coçam aqui e acolá minhas orelhas. De vez em quando começo a girar tentando alcançar o rabo… Quando fico tonto de tanto rodar, deito e emito um alegre au, au, au…

  3. Eu concordo com Francisco apenas corrigindo que PIB é uma estimativa baseada no potencial de produção dos fatores do país. Eu disponha de 24 h por dia e se ganhasse por hora meu produto potencial seria 24 x salário, mas comi é humanamente impossível, meu produto será 8 x salário, sendo a diferença denominada hiato do produto.
    O governo gasta mais do que arrecada e o déficit do governo é dado por G+TR -TA, onde G é o gasto, em custeio e capital, TR transferência ( bolsa família, seguro desemprego, auxílio emergencial, etc) e TA são impostos. É fácil demonstrar que S-I
    =G+TR-TA+NX, ou seja, o se a poupança, S, se iguala ao Investimento, S=I, o déficit do governo é financiado pelas exportações líquidas. Então, importa 100 e exporta 100 faz NX=0 e isso empurra o faz o déficit ser igual a S-I.
    A ideia de PIB impõe convenções. Por exemplo, se uma família compra 5 kg de arroz é considera consumo, mas isso não difere de um supermercado que compra 5kg de arroz. Entretanto, a convenção diz que esse consumo do supermercado é Investimento porque alterar o estoque de capital fixo.
    Dessa forma o consumo da fórmula é consumo das famílias. Por isso w decisão de consumo está associada a teoria do consumidor, mais precisamente as preferências, que é objeto de estudo da Microeconomia e não dá Macroeconomia.
    Espero que meu comentário não seja considerado como um confronto, mas tão somente uma contribuição ao debate.

    • Maurício, o debate é muito bom, e eu preciso lhe agradecer, pois eu estava distante de dominar como se calcula o PIB. Creio ser um cálculo complexo, pois demoram meses para que os números sejam divulgados, sendo que ainda assim sofre correções.

      Se não se calculasse o PIB de um país como se saberia a quantas anda a economia? Pode não ser o método perfeito, porém creio que não inventaram um melhor.

      Este número não pode ser fraudado pelo governo; ou melhor, pode, porém por pouco tempo. Vejamos o caso da Dilmanta: foi, foi, foi fraudando os Números até que não deu mais e gerou o impeachment e a conta veio para todo o país.

    • Sancho estava falando que
      Bertoluci e João Francisco é briga de cachorro grande, com pedigree.
      Aí aparece outro de grande pedigree, o Assuero e se envolve no PIB deles.
      Sancho, um vira-latas pulguento olha o texto de cada um deles, mas (irracional mas), como na faculdade fez humanas e não exatas, diverte-se com as pulguinhas que coçam aqui e acolá minhas orelhas. De vez em quando começo a girar tentando alcançar o rabo… Quando fico tonto de tanto rodar, deito e emito um alegre au, au, au…

  4. Maurício, a frase chave aí é “A ideia de PIB impõe convenções”. Concordo, e completo: estas convenções são definidas pelo governo para atender aos interesses do governo.

    Exemplo:
    “se a poupança, S, se iguala ao Investimento, S=I, o déficit do governo é financiado pelas exportações líquidas”

    Matematicamente perfeito dentro das convenções definidas. Mas saindo da abstração matemática para a realidade: o governo exporta alguma coisa? Não, quem exporta são as pessoas que empreenderam para produzir. Então o que a convenção está dizendo é que é pacífico e normal que o governo se aproprie daquilo que os outros produziram.

    A fórmula do PIB é só mais um elemento desta farsa: o governo gasta quanto quer e onde quer, toma à força o dinheiro de quem trabalha e ainda usa o PIB crescente como prova de que está certo.

    Sobre a dúvida do João, meu pitaco sobre Hong Kong (https://luizberto.com/hong-kong/) contém a seguinte citação de Cowperthwaite: “se eu deixar os burocratas coletarem dados, eles vão querer usar estes dados para planejar a economia”. Outra citação, que não está nesse texto: certa vez perguntaram a ele qual a primeira coisa que países pobres deveriam fazer para prosperar. A resposta foi “Eles deveriam abolir seus institutos de estatísticas econômicas”.

    Sem precisar ser tão radical, não inventaram um índice melhor porque não interessa para o governo, não interessa para os economistas que trabalham para o governo e não interessa para as universidades que vivem às custas do governo.

    Voltando ao básico, a fórmula do PIB pode ser matematicamente válida dentro das “convenções”, mas é factualmente desonesta porque inclui na soma um fator G que não existe. Ao esquecer que tudo que o governo gasta foi tomado dos outros, e acreditar que o governo “produz”, a ciência econômica deixa de ser ciência e vira fé. Sobre esta fé, podem-se construir centenas de teoremas e milhares de equações, mas todas elas estarão refletindo não a realidade, mas uma “convenção”.

    • Na verdade o G é a segunda variável mais importante. O governo compra bens e serviços, tem custeio, faz obras como você citou, etc. O governo apura o PIB produzido pela atividade econômica privada, agora de deveria ou não fazer isso me parece ser o cerne da questão como Hong Kong que aboliu estatísticas durante um período. Eu acho que tem prós e contras. Como um cara que não tem capacidade de demonstrar sua renda…fica difícil tomar empréstimo, por exemplo.

  5. Eu vi em um documentário do Chomski no Netflix há alguns anos atrás acerca dessa abordagem enganosa do PIB, mas o excelso ₢ pitaqueiro ₢ Bertoluci elucidou muito melhor a vigarice que há por trás disso.

    Quando vierem me falar de PIB pra criticar o governo, vou mostrar esse texto.

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