“O escritor pode ser louco, mas não enlouquece o leitor, ao contrário, pode até desviá-lo da loucura. O escritor pode ser corrompido, mas não corrompe. Pode ser solitário e triste e ainda assim vai alimentar o sonho daquele que está na solidão”, disse Lygia F. Telles.
Não sei que mania é essa de chamar autor de louco, mas parece que é consenso. Doctorow, escritor americano, fala que “escrever é uma forma socialmente aceita de esquizofrenia”, Rubem Fonseca, um dos maiores contistas brasileiros vivo, retifica que ele errou ao falar esquizofrenia, “escrever é uma forma socialmente aceita de loucura.”.
De certa forma que todos os escritores são loucos à sua maneira. Há os de loucura mais contida, tímida, quieta; outros, de loucuras mais expressivas, libidinosas, menos tímidas e mais às claras. Entretanto apenas a loucura não sustenta o ato de escrever, segundo ele; ainda que seja condição indispensável para qualquer escritor. Para além da loucura é preciso ser alfabetizado, mas não muito, só o suficiente para escrever de uma forma que o leitor sinta e, acima de tudo, veja. Ver, para poder entender. Rubem se pergunta: “para ser escritor é preciso ser inteligente? ”, ele mesmo responde usando a palavra de outro autor, Seth Morgan: “conheci centenas, centenas de escritores e muito pouco, pouquíssimos eram inteligentes” vemos então que a inteligência pode ser dispensada; ainda bem.
No entanto, para além de louco e alfabetizado, Rubem fala que um escritor precisa ser motivado à escrita, imaginativo e paciente. Sem imaginação não há literatura, é a condição basal da escrita criativa. A paciência entra, também, como o elemento onipresente que acompanha todo o processo, mas com requintes de acabamento (se é que podemos chamar assim), de cada texto. É preciso ser paciente, a literatura não tem pressa, está além do tempo, ultrapassando-o. Não há um lugar específico onde caiba a literatura, ela não cabe em nenhum e também cabe em todos ao mesmo tempo.
No dia 1 de dezembro de 2019, fui convidado a uma confraternização em um apartamento da Zona Norte do Recife; cheio de loucos. Loucos da poesia, loucos da prosa, loucos das narrativas jocosas e loucos das palavras harmoniosas, cifradas e acompanhadas pela música.
Havia loucos de toda ordem e de todos os gostos.
E, à frente de todos os loucos, o anfitrião da festa, o maior de todos os tresloucados, Luiz Berto. Figura imponente e que logo me chamou a atenção assim que entrei em sua casa. Carregando um sotaque que não deixava dúvidas de onde tinha vindo e arrastado pela simplicidade de quem já passou por muitos causos na vida e sabe muito bem o que realmente importa no final das contas: família e amigos.
O anfitrião teve a graça e a doçura de me presentear com um exemplar de cada obra sua e, dentre elas, o desavergonhado O Romance da Besta Fubana.
Mas não paramos ali. Pude ouvi-lo falar de sua obra, narrando com a polidez de um grande prosador, dominando com beleza e delicadeza cada construção semântica. Uma graça! Vi e ouvi, in loco, aquilo que Ruben Fonseca falara sobre ser escritor: louco – acima de tudo -, imaginativo, paciente e, embora seja uma característica dispensável, largamente inteligente. Um encontro que não esquecerei e que muito me inspirou.
Quando iniciei a leitura d’O Romance da Besta Fubana, fui capturado de imediato.
Enlaçado pelo cotoco dos pés, como um cabrito, e chacoalhado de um lado para outro. Laçado pelo realismo mágico do nordeste no brilhantismo de Luiz Berto. Estava diante de uma obra gigante e de um autor sem igual. Feliz por ter sido agraciado pela obra e ainda mais por ter ouvido o autor falar dela com aquela paixão desenfreada.
Devorei a Besta e fui devorado por ela nas primeiras semanas de dezembro.
Quando acabei, fiquei de boca babada e corpo e alma arriados.
A Besta tinha seguido seu rumo de volta, para explorar os recantos da via láctea e eu, aqui, estava órfão dela.
Obrigado, Luiz Berto.
R. Que é que vou falar, meu jovem e mais recente amigo???!!!
Me diga mesmo: que é que vou dizer depois de tudo isso que você escreveu???
Logo você, também escritor e também ficcionista, autor do livro Transa, uma coletânea de contos de primeiríssima qualidade:
Hein???
O que vou dizer diante de tudo isso que você escreveu?
Tô aqui tão ancho que vou dar o calado por resposta.
Aliás, vou aproveitar o pretexto e informar que quem quiser adquirir a Besta, ou qualquer um dos outros livros meus, é só entrar na página da Editora Bagaço, clicando aqui.
E mais não digo.
A não ser que me perguntem…
Ainda nos dias de correria para encerrar a campanha de 2019 da empresa para a qual trabalho, tenho me dividido entre leitura do Romance da Besta Fubana e meus afazeres profissionais, sendo a primeira prática um escape da porra para desestressar
do cansaço da segunda.
A cada página virada, mais me apaixono pelo livro.
Essa semana toda passei em Recife, de onde cheguei há pouco. Três vezes me peguei lendo em voz alta para alguns amigos.
A quarta foi para uma senhora gaúcha e seus esposo de passagem por Recife, e também hospedados no hotel, li duas páginas.
O barato foi a tradução que fiz de alguns termos nossos para o Português deles, e a troca de verbetes de lá para cá. Boas risadas não nos faltaram.
Berto, parabéns!