CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Caruaru, capital do forró. Cidade que Paulinho escolheu para viver e trabalhar

Paulinho nasceu de um relacionamento extra matrimonial de sua mãe, Carminha, com um cardiologista famoso do estado.

Baixinha, de corpo escultural, inteligente, discreta, elegante, atenciosa. Carminha logo despertou interesse no cardiologista que, sempre que o consultório ficava vazio, mandava parar tudo e ia conversar com aquela enfermeira enigmática, de olhos de Capitu, coxas grossas, com uma sensualidade à Marilyn Monroe, que o cardiologista jamais tinha vista em outras mulheres que conheceu e que já havia passado no consultório!

Conversa vai conversa vem, com seis meses de trabalho, Carminha e o cardiologista se tornaram amantes, paixão avassaladora que mesmo em dias de não expedientes no consultório os dois se encontravam para memoráveis horas de prazer e curtição.

Dois meses depois da primeira relação amorosa, Carminha percebeu que estava grávida do médico, mas não lhe contou a novidade logo, esperando a confirmação do teste de gravidez.

Assim que confirmou a gestação procurou o cardiologista e contou-lhe a novidade. Como médico famoso na praça e temendo a repercussão do caso no “meio” onde era conhecido e admirado ele reagiu insidioso, soltando os cachorros na cara de Carminha e exigindo que ela abortasse aquele feto indesejado, sob pena de demissão por justa causa e fim do relacionamento.

De personalidade forte e determinada, já amando definitivamente aquela coisa linda crescendo no seu ventre, Carminha não atendeu ao apelo do médico, preferindo ser demitida. E foi o que aconteceu!

Rebaixada em outro emprego que havia sido admitida, Carminha foi até o fim com a gravidez que transcorreu, felizmente, de boa, vindo a ter Paulinho saudável, lindo, tornando-se o xodó da família.

Guerreira, Carminha trabalhava em duas clínicas para sustentar o filho, que teve o registro de nascimento feito sem o assentamento do nome do pai que se recusou a registrar, e ajudar a família que tomava conta de Paulinho na sua ausência.

A criança cresceu e sempre soube pela boca da mãe quem lhe era o pai e que não o quis reconhecer para evitar escândalos na família, já que era um médico rico e influente no convívio com a sociedade.

Com a ajuda da mãe e muito determinado, estudando em colégio do estado e fazendo cursos particulares pagos por fora pela mãe, Paulinho conseguiu passar no vestibular de medicina da federal na primeira tacada em ótima colocação. Feliz consigo mesmo por ter tido o apoio irrestrito da mãe, da família materna e de ter sido classificado entre os dez primeiros colocados, resolveu procurar o pai biológico sem a mãe saber, mostrar-se a ele e dizer-lhe que havia passado no curso de medicina.

Foi o que fez assim que se matriculou na universidade federal!

Para não suscitar dúvidas, marcou uma consulta no consultório para ver o pai de perto, olhar-lhe nos olhos e dizer-lhe que era seu filho e havia passado no vestibular de medicina da federal.

Dia e hora marcados chega Paulinho ao consultório do pai, cardiologista famoso, conversa com a recepcionista que faz algumas anotações no prontuário e depois o manda sentar-se no sofá confortável da sala e ficar aguardando a chamada.

Meia hora após ter chegado, com a saída do paciente que o pai estava atendendo a secretária chama Paulinho e manda-o entrar.

Educadamente ele se levanta da poltrona e dirige-se à sala luxuosa onde o pai estava atendendo. Senta-se na frente dele e este lhe pergunta com sorriso largo:

– O que o traz aqui, meu jovem bonitão?

Paulinho, sem pestanejar, olhos firmes, com a mesma tranquilidade e firmeza do pai, responde:

– Não vim aqui para consulta, não, doutor! Vim aqui para conhecer meu pai de quem tanto mamãe fala, mas nunca me apresentou a ele porque ele não queria conhecer. Sou Paulinho, o filho que o senhor mandou minha mãe abortar! Lembra? Passei em medicina e vou me especializar na área cardiológica! Faço questão de seguir os seus passos com minhas próprias qualidades e defeitos!

– Não vim aqui pedi nenhum favor ao senhor – continuou – apenas dizer que sou seu filho e vou estudar medicina na mesma universidade que o senhor passou, estudou e se formou e ensina.

Percebendo que o pai ficou trespassado com a presença do filho renegado por ele no passado e percebendo que sua presença lhe teria provocado uma surpresa inesperada, aproveitou que o pai estava com o rosto pálido, tapando-o com as mãos trêmulas e mudo, levantou-se do sofá, abriu a porta, saiu e pediu à secretária que mandasse entrar outro paciente que o “doutor estava livre”!

Hoje Paulinho trabalha no mesmo hospital e no consultório onde o pai clinica. É um exímio anestesista. Tornaram-se dois parceiros profissionais e confidenciais inseparáveis, mas com uma condição: Paulinho não concordou em pôr o nome do pai no seu registro de nascimento, mesmo o pai insistindo! – Tá bom assim, meu Velho! O que vale é o que sentimos um pelo outro: respeito e admiração. O que passou, passou, o tempo cicatrizou – concluiu.

O mundo dá muitas voltas! E cada volta é uma surpresa, para o bem ou para o mal, dependendo do que se plantou!

16 pensou em “PAULINHO – O FILHO REJEITADO

    • Caríssimo Carlos Eduardo,

      É verdade, eu fiz uma mudança de rumo na narrativa porque conversei com o tio de Paulinho e ele me afirmou que a história foi mais comovente, tocante e enriquecedora do que se possa imaginar.

      Apenas um segredinho: a mãe de Paulinho, Carminha, é diábetica, com pressão alta, já com mais de 75 anos, pegou o maldito vírus chinês e quem a tratou com todo carinho do mundo que alguém possa dispensar a alguém: Paulinho e o pai dele!

      Carminha escapou fedendo, está lúcida e mais ativa do que nunca, e pai e filho mais felizes ainda por ter feito parte da “ressurreição dela!”

      Imagine você se Paulinho tivesse sido estúpido, grosseiro, arrogante e não visse no pai um grande amigo que errou mas tentou corrigir o erro?

      Não basta ser educado, tolerante, humilde, endinheirado, pois dinheiro não compra a morte, tem de amar e ser tolerante em vida.

      FOI O QUE FEZ O PAI E PAULINHO: RECONCILIARAM-SE NA VIDA!

        • Querido Carlos Ivan, que saudade! Os amigos estão sempre na nossa estima.

          Você é um dos grandes amigos que NUNCA esqueço!!

          Mora no meu coração o tempo todo.

          Abraçaço!

          Estou felicíssimo por sabê-lo bem de saúde e humor, apesar do vírus chinês que nos roubou tantos amigos!

  1. Pois é, Cícero, meu bom compadre.
    O mundo dá muitas voltas. Minha crônica desta semana também vai falar um pouco disso.
    Muito linda sua crônica: mostra os corações de pessoas que podem ter pecado no passado mas sabem perdoar.
    Um grande abraço,
    Magnovaldo

    • Magnovaldo Santos,

      Um forte abraço, meu prezado irmão do coração.

      Você é uma peça rara requisitar pelos Luiz Berto, que está sempre descobrindo talentos para alegrar e, culturalmente, enriquecer esse espaço nobre do JBF.

      Abraçaço.

  2. Salvo engano, já havia lido esta sua história antes, mestre Cícero.

    Com os novos dados e novos rumos da belíssima história, houve um desfecho com chaves de ouro, esta “ode” do mais puro altruísmo humano.

    • Exatamente, Marcos André M. Cavalcanti,

      Pessoalmente eu não gosto de opinar por quem está certo ou errado numa relação amorosa, apenas retado os fatos como fatos foram. Em relação a mim, sempre fui muito cuidadoso para não magoar os sentimentos das pessoas. Faz parte do meu temperamento.

      Agora, se isso aconteceu, como de fato aconteceu e o tempo cicatrizou as feridas dos três e hoje vivem em harmonia, fazer o quê? Ser contra? A favor? Quem sou eu para ser contra.

      Abraçaço, amigo e irmão. Ótima semana para o amigo e família.

  3. Duplicou??????

    Acho que estás vendo duplicado. kkkkkkk

    Quanto ao Covid… Cuide-se, bela.

    Hora de se tratar, se cuidar e levantar a poeira e dar a volta por cima…

    Deixo-vos um “beijo sarador” e certamente estarás em minhas orações pra pronto restabelecimento para voltar à normalidade de sua rotina diária junto aos seus.

    Beijão de Sancho… Sempre, até sempre.

  4. Querido Sancho,

    Também me posicionei assim perante o tio de Paulinho, qual um cavalheiro solitário, mas o tio disse para mim: escreva os fatos, se isente de comentar quem está certo ou errado, e deixe que,à maneira deles, sejam felizes.

    Calei-me e fiquei mudo, seguindo os conselhos do tio.

    Abraçaço, querido.

    • Ah, meu caro Ciço,

      Diria Sancho a tal “tio” que há certas feridas que jamais irão cicatrizar. Qualquer discussão familiar (e elas sempre estão presentes nos relacionamentos), farão toda mágoa contida no peito vir à tona e irá novamente machucar, ferir e destruir…

      Jarros da dinastia Ming uma vez quebrados, por melhor que for a cola da restauração, jamais voltam a ter algum valor.

      Abraçação, meu caro amigo.

  5. Parabéns pelo belo texto, querido Ciço Tavares!

    Paulinho teve uma grande mãe, que quebrou lanças para fazer do filho um médico. O mérito foi todo dela.
    O reconhecimento tardio da paternidade jamais tirará de Paulinho o complexo de filho rejeitado antes de nascer. O reconhecimento principal que a criança precisa é amor e carinho, na hora certa. Tudo tem seu tempo certo.
    Paulinho teve a sorte de chegar a ser médico, sem auxílio do pai. As marcas da rejeição, porém, ninguém jamais apagará. .

    Grande abraço e uma ótima semana.

    • Vivi, minha linda,
      Se vc ler meu comentário acima, onde cito vaso da dinastia Ming, verás que casa direitinho com o seu pensar, apesar de termos comentado por óticas diferentes.

      Beijão de Sancho e ótima noite para a querida amiga.

  6. Que jamais se banalize a palavra perdão. Fizeram isso (banalizar) com a palavra “amor” e deu no que deu.

    E vá dormir, que quem está “dodói” precisa se alimentar bem, se hidratar mais ainda e dormir bastante para o organismo ter forças para pronto restabelecimento.

    Beijão, bela!!!!!!!!!

  7. Verdade, querido Sancho. Não vejo mérito nenhum, no reconhecimento tardio de uma paternidade, quando o filho rejeitado desde o ventre da mãe, já está formado, graças ao esforço dela.

    Nesta vida, as marcas da rejeição paterna de Paulinho jamais desaparecerão.

    A dívida moral que esse “medalhão” da medicina tem com o filho, que ele rejeitou ainda no ventre materno, será cobrada dele na Eternidade, segundo a Doutrina Espírita..

    Beijão para você também, e um ótimo dia!

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