“Os sonhos mais lindos sonhei!
De quimeras mil, um castelo ergui!
E no teu olhar, tonto de emoção,
Com sofreguidão, mil venturas previ!
O teu corpo é luz, sedução!
Poema divino cheio de esplendor!
Teu sorriso prende, inebria, entontece!
És fascinação, amor!”
Ontem eu sonhei. Sem sequer imaginar alguma petulância, no sonho, eu era Don Quixote e caminhava ao lado do Sancho. Procurávamos um moinho, pois o vento era, naquele tempo, os nossos corações – e a vida precisava ser mantida. Soprada. Impulsionada com movimentos da esquerda para a direita.
Que fosse até mesmo um redemoinho. Mas que fosse, a princípio, de vento. O vento que carrega nuvens, e, às vezes, também provoca tempestades. É a natureza do vento.
Eis que, num olhar despretensioso, de soslaio, Sancho – o mais fiel dos escudeiros – descobre no horizonte o balançar das folhas de uma palmeira. Baixinho, para não me assustar e acordar, diz:
– Senhor, temos ventos!
Incontido olhei e confirmei o aviso, ao tempo que disse:
– Não temos apenas ventos, Sancho. Temos o moinho!
Quixote comemora com Sancho o Moinho dos Ventos
Queimadas, quase todos já sabem, foi (e ainda é) o povoado onde vim ao mundo no dia 30 de abril. Meu primeiro banho (contou minha Avó) foi com água retirada da raiz da mucunã. Era tempo de seca total. A bacia (também contou minha Avó) não era grande, pois o menino era pequeno e a água era pouca.
Na cozinha a parentada cuidava do almoço: galinha caipira com pirão de parida para a mãe; patos e capotes para quem os podia comer. E gostasse.
Na sombra da frondosa mangueira do quintal, dois ambientes. Num, a limpeza preparatória dos patos e capotes; e, noutro, o Avô moía o milho para o pão-de-milho (hoje, cuscuz) sendo perturbado pelos pintos que se aproveitavam dos farelos que saltavam.
O pão-de-milho feito num prato, com a massa molhada aparada por um pano de prato, e posta a cozinhar no vapor da água fervente de uma panela.
Moinho antigo que virou peça de museu
Galinha cozida e pirão de parida feito. Patos e capotes fartos, preparados em cabidela – havia quem preferisse sem o sangue. E era prontamente atendido.
Na camarinha, a parida recebia cumprimentos, ainda com o esfomeado recém-nascido lutando para encontrar o mamilo materno e sugar a delícia do leite.
Na cozinha a parentada acabara de comer e as mulheres se apressavam para lavar os pratos e as panelas. O quintal onde as aves foram abatidas e limpas, recebia agora um novo cenário.
Um jirau que também era aproveitado como mesa de uma beirada propositadamente preparada, recebia, agora, outro moinho: o de moer grãos de café torrados ao mel da rapadura e acrescentado com porções de mangirioba.
Na latada da frente da casa as visitas aproveitavam aquele delicioso café torrado e moído em casa. Leite de cabra, pão-de-milho, biscoitos e bolachas acompanhavam o tão famoso e desejado café da tarde.
Bons tempos.
Moinho de mesa
Tu é phoda Zé, até sonhando exala poesia e “lembra” até teu nascimento no distrito de Queimadas no município de Horizonte/CE, próximo a linda Fortaleza. A descrição do fausto almoço em família para comemorar sua chegada a este mundo é tão minuciosa, que chega a dar água na boca. Você de Dom Quixote (faltou citar Rocinonte) acompanhado de Sancho Pança (seria o Dino?) enfrentando os moinhos (no Ceará eram cata-ventos) sob a linda canção Fascinação eternizada em português pela maravilhosa Elis Regina. Obrigado ZéRamos, você abrilhantou meu domingo!
Marcos, nós cearenses conhecemos nossas dificuldades, nosso palavreado e nossas manias. Eu tinha a mania de comer broa de goma com erva-doce todo dia. No açude, tinha a mania de tomar banho de cuia (metade da cabaça) e dormir na rede. Coisas nossas, mas, o mais importante são as amizades que procuramos conservar. Beber cafezinho no Café Walcan da Guilherme Rocha ficou tão difícil!…..