Lamparina mantida a querosene
Por desconhecimento, muitos ainda creem que a falta de infraestrutura no Brasil é algo recente. Como diria Vovó, isso vem “desde o tempo da ronca”. É, se assim podemos afirmar, uma pobreza milenar e cultural. E, acredite, a subserviência continua.
Eis que, no início da década dos anos 50, Queimadas, Timbaúba e Pacatuba desconheciam “luz elétrica”. Lamparinas, candeeiros, velas e outras luzes que a Natureza nos favorecia serviam à luminosidade.
Até a luz da traquinagem infantil era acionada.
Caminhar léguas e mais léguas para comprar meia garrafa de querosene, nunca configurou sacrifício – da mesma forma que, viajar até a cidade grande para comprar um candeeiro com as parcas economias e moedas juntadas nos cofrinhos de madeira ou caixas vazias de charutos.
Candeeiro dependurado na calha
Por razões desconhecidas, as noites naqueles povoados pareciam chegar mais cedo. Ao esconder do sol por detrás das nuvens num poema indescritível da Natureza, a noite aparecia com suas determinações e amostras das necessidades inerentes a pobreza das pessoas e do lugar.
Vovó – sempre Ela – mantinha o reinado e o privilégio de andar com a única lamparina por toda a casa, que, aceitemos, era dela. A casa e a lamparina. Aqui e acolá parava de andar e atiçava o fumo no cachimbo – talvez por conta do cheiro, as muriçocas sequer encostavam nela.
Vovô – sempre Ele – tinha a incumbência de acender o candeeiro e dependura-lo na entrada da casa, até quando todos precisavam sair para algum lugar.
Aquele candeeiro, diziam, tinha a função de um farol conduzindo os navegadores. Pessoas que passavam pelo caminho na frente da casa, já identificavam a moradia de “Seu João e Dona Raimunda”, e, mesmo sem saber se estariam em casa, cumprimentavam:
– Boa noite, de casa!
Pirilampo fazia a luz da meninada
Ninguém daquelas paragens possuía geladeira. Qualquer sobra de alimento era servida aos patos, galinhas e perus. Ninguém tinha o prazer de guardar nada – até a água, se alguém a quisesse mais “fresca”, tinha que colocar a quartinha na janela. O vento feito brisa esfriava a água da quartinha.
Toda sobra de carne ou ave precisava ser “salgada” – daí a justificativa para a hipertensão de muitos que viveram ou ainda vivem na roça.
Poucos conseguiam economias para comprar na bodega 1 litro de querosene. O “mercado” mais usado era o de uma quarta de litro, colocado numa garrafa fechada com um pedaço de sabugo de milho. Repito: caminhava-se léguas e léguas para comprar uma quarta de garrafa de querosene. Mas, era a luz!
Mas, lembro bem, aquela casa nunca ficava às escuras. A única lamparina ficava com Vovó, e o candeeiro ficava dependurado na calha frontal da casa – durante a noite inteira.
Assim, entre uma balbúrdia e outra, antes da chegada do sono ou daquela ordem emanada do Vovô (“meninos, vão drumir”), os peraltas faziam suas iluminações particulares.
Ao cair da noite, de posse de uma garrafa vazia, os irmãos e primos saíam à cata de vagalumes (pirilampos) nos arredores da casa. Pegavam vários e colocavam na garrafa. No quarto escuro iluminavam o ambiente com a luz engarrafada dos pirilampos.