Em Nova-Cruz (RN), há décadas, entrando pelo século passado, o casal Dona Rita e Seu Nicanor recebeu um telegrama do Recife, comunicando que seu filho Zenilton, caminhoneiro, havia morrido num acidente de caminhão.
O clamor foi geral e a notícia se espalhou pela cidade, deixando a população arrasada. Todos lamentavam a morte do jovem rapaz.
Os pais e irmãos choravam desesperados, sem saber como se comunicar com a pessoa de Recife, que subscreveu o telegrama, pois o nome era desconhecido.
Nesse tempo, os meios de locomoção e comunicação eram limitados. O trem para Recife só partia às 3 horas da manhã. A família estava desnorteada, pois não tinha parentes em Recife e não sabia a quem se dirigir, para se inteirar dos detalhes do acidente, e saber se o corpo da vítima poderia ser trasladado para o sepultamento em Nova-Cruz.
O desespero tomou conta de todos, e ninguém sabia por onde começar, para providenciar o traslado do corpo do seu ente querido para Nova-Cruz.
O entra e sai na casa do casal era interminável e a solidariedade tomou conta da cidade.
Pois bem. No final da tarde, quando menos se esperava, estacionou um caminhão na frente da casa dos pais de Zenilton, e, como um fantasma, desceu da boleia a “própria vítima” do suposto acidente, bonzinho da Silva, intacto, sem entender porque havia tanta gente na casa dos seus pais, que era a sua própria casa.
Foi desmaio “a torto e a direito”, e nunca apareceu o responsável pelo telegrama. Havia mil suspeitos na cidade, rapazes astuciosos e baderneiros, capazes de forjarem qualquer coisa contra alguém, somente por maldade e para se divertir com o sofrimento alheio. Mas ninguém tinha provas de quem poderia ter sido, para poder acusar.
No final das contas, o suspeito principal terminou sendo o próprio Zenilton, que, depois de algum tempo, passou a dar ótimas risadas, quando alguém tocava no assunto do telegrama.
Seus pais, beirando os 60 anos, e sem acreditar que o filho estivesse vivo, demoraram a sair da prostração em que ficaram, com a notícia contida no telegrama.
É impressionante, como tem gente pra tudo neste mundo. E ainda sobra alguém pra tocar flauta.
Danou-se Violante, pois comigo aconteceu algo parecido. Há alguns anos eu trabalhava por determinada empresa e a deixei e perdi o contato com a diretoria e meses depois fui informado, por amigo, meu e dele, que o sr. Ramiro havia falecido. Lamentei, claro, pois tinha boa amizade com o mesmo. Pois bem , pouco depois fui a uma feira em Sampa e numa dessas ao sair do cafezinho e sobrar uma esquina no corredor da feira ouço uma voz: “Nilson, como vc está? faz tempo qu não nos falamos! Reconhecí a voz e quase gélido me viro e quem estava à minha frente? O defunto….vivinho da Silva! Ele espantou-se com a minha palidez e perguntou se eu estava bem, etc. Até que me recuperando estiquei a conversa e falei da alegria de vê-lo vivo já que não só eu como muitos o tinham como morto. Ele ficou meio sem graça mas depois caiu na gargalhada.
Obrigada pelo comentário, prezado Nilson Araújo!
Imagino o susto que você sentiu, diante da aparição do suposto “defunto”. Mas a alegria de encontrá-lo vivinho da Silva deve ter sido muito gratificante.
Tem muita gente ruim neste mundo de meu Deus, que se diverte, inventando mortes e acidentes, para perturbar e chocar as pessoas. Quem inventa um acidente consigo mesmo, ou a própria morte, só pode ser psicopata. Gente boa é que não é…
Bom final de semana!
Bom dia minha cara Violante.
Só tenho um comentário a fazer, como pai que sou.
Isso que seu Nicanor e D. Rita passaram, não se faz com ninguém.
Imaginar que poderia ser o próprio filho então….Seria muito cruel da parte dele.
Bom dia, prezado João Francisco!
Obrigada pelo comentário sensato.
Um filho que proporciona um sofrimento desse aos pais, só pode ser muito ruim, ou um psicopata.
Esse caso foi autêntico e comoveu a cidade.
Bom final de semana!
Violante,
Gostei demais da conta da sua crônica sobre o telegrama do Recife que foi recebido pelos pais de Zenillton , comunicando que seu filho, caminhoneiro, havia morrido num acidente de caminhão. Lembrei-me de um vizinho que estava aniversariando e sua esposa preparou uma grande festa. Ele foi surpreendido ao ler o Diário de Pernambubo, no dia da sua festa, o seu nome constando do obituário do jornal de maior circulação do Recife.
Compartilho um poema do cordelista e poeta Bráulio Bessa com a prezada amiga:
A LIÇÃO QUE A MORTE DEU
Na fazenda Ave Maria
no ano de oitenta e três,
deu-se um fato muito triste
que hoje conto a vocês.
Duas mortes repentinas.
Fecharam-se as cortinas
da vida de dois viventes:
Zé Vaqueiro, o peão,
Doutor Cesar, o patrão,
dois seres tão diferentes.
Diferentes na carcaça
e também no interior.
O patrão cheio de ódio,
o peão cheio de amor.
Cada qual com seus valores,
seus sorrisos, suas dores
e suas convicções.
Enquanto isso no céu,
Deus anota num papel
seus gestos, suas ações.
O patrão, muito egoísta,
jamais repartia o pão.
Nasceu em berço de ouro,
nunca passou precisão,
não acudia indigente,
nem ajudava um doente
prostrado num hospital.
Cheio de hipocrisia
pedia à Virgem Maria:
– “Livrai-me de todo mal.”
Porém, missas e novenas
Doutor Cesar não perdia.
Batizou sua fazenda
em homenagem a Maria
por quem tinha devoção
e toda convicção
de que a santa preparava
o lugar dele no céu
sem taxa, sem aluguel,
na rua que ela morava.
Já Zé Vaqueiro era bom,
tinha uns quatro corações.
Deixava isso bem claro
na pureza das ações.
Ocupado na peleja,
nem ia tanto à igreja
mas só praticava o bem.
Era justo e generoso,
muitas vezes caridoso,
mesmo sem ter um vintém.
Tirava do próprio prato
mode dar a quem tem fome.
Ajudava a qualquer um
sem perguntar nem o nome.
Era muito judiado,
quase sempre injustiçado,
porém nunca reclamava.
Dizia que o sofrimento
era um teste, um treinamento
que Deus sempre lhe mandava.
Num dia comum da vida,
no Açude Juremal,
Doutor Cesar se banhava
e de repente passou mal.
– “Tô morrendo afogado!”,
gritou ele, agoniado,
na hora da precisão.
Zé correu pra lhe salvar
mesmo sem saber nadar.
Morreram Zé e o patrão.
E a morte sem critérios
deu seu golpe derradeiro,
roubou a vida de Zé
e a do cruel fazendeiro.
Ninguém foge do destino,
seja simples, seja fino,
seja o limpo ou o imundo,
esse encontro é garantido
e por mais bem escondido
ela encontra todo mundo.
No outro dia ocorreu
o cortejo do patrão.
Mais de dez quilos de flor
perfumando o caixão
de madeiras trabalhadas
com quatro alças douradas
pro defunto ostentar.
Ao redor, vinte babões
que trocavam empurrões
brigando pra carregar.
Mais de cem motos na frente,
cinquenta carros atrás…
gente a pé, gente a cavalo,
coroa, faixa e cartaz
prestigiando o doutor
que nunca espalhou amor,
mas juntou um mar de gente.
Se fosse um pobre lascado,
posso até tá enganado,
seria bem diferente.
No mesmo dia avistei
o fim de uma vida dura,
num caixão de compensado
doado na Prefeitura.
Pouca gente acompanhando,
dez vaqueiros aboiando
e a mãe rezando um terço.
O derradeiro momento
da vida de sofrimento
de Zé, que nasceu sem berço.
Num mundo tão desigual
inté na hora da morte
o bolso deixa bem claro
qual dos dois teve mais sorte.
A verdade é nua e crua:
o vil metal continua
mandando e desmandando.
Essa conta eu fiz ligeiro:
o que tinha mais dinheiro
deixou mais gente chorando.
Depois da viagem feita
pro mundo espiritual,
o lugar que deixa claro
quem é do bem ou do mal,
fica tudo evidente,
a justiça é transparente
e nunca é manipulada.
É a hora da verdade
em que toda a humanidade
um dia será testada.
Doutor Cesar acordou mal,
pingando suor na testa.
Já foi logo reclamando:
– “Eita calor da moléstia!
Devo estar no quarto errado,
não tem ar-condicionado,
nem TV, nem frigobar.
Cadê a Virgem Maria
pra mudar minha estadia
e me reposicionar?”
Nisso entrou um galegão,
jeitoso, de olho azul.
E disse: – “Prazer, doutor!
Eu me chamo Belzebu.
Eu que fiz o seu check-in,
pode reclamar de mim,
se tiver mais algum susto.
Aproveite a estadia
regada de agonia,
afinal, o cão é justo.”
O doutor, inconformado
por ir morar com o cão,
perguntou a Belzebu:
– “E cadê o meu peão?
Infeliz, nem me salvou,
nem pra isso ele prestou,
deve estar ardendo em brasa.
Me responda o que precisa
pra eu ir dar-lhe uma pisa.
Onde fica sua casa?”
O cão disse: – “Cabra burro,
morreu, mas não aprendeu
que Zé tinha um coração
bem diferente do seu.
Lá onde ele foi morar
a gente não pode entrar,
mas lhe mostro do portão
que vai dar pra você ver
e de longe conhecer
a casa do seu peão.”
A rua estava enfeitada
pois à noite tinha show,
e esse era especial
pois foi Deus que organizou.
O palco todo montado,
a luz e o som testado
pra grande apresentação.
O encontro de dois reis
tava marcado pras seis:
Elvis Presley e Gonzagão.
Desejo um final de semana com paz, saúde e a inspiração de sempre
Aristeu
Obrigada, Aristeu, pelo ótimo comentário e por compartilhar comigo este poema bonito e hilário, do grande poeta e cordelista Bráulio Bessa, A LIÇÃO QUE A MORTE DEU! Gostei imensamente!
Foi muita moleza do seu vizinho, no dia em que comemorava aniversário natalício, ser surpreendido com a inclusão do seu nome no obituário do Diário de Pernambuco.
O tipo da coisa desagradável! Só pode ter sido armação de alguém.
Tem gente pra tudo neste mundo!!!
Desejo a você também um final de semana com muita saúde, inspiração e Paz!