Nossa vida é um livro repleto de histórias, nossas ou que vivenciamos ao longo dos anos. Às vezes, dependendo do destino de cada um de nós, o livro da vida pode ter vários volumes, e daí os super inteligentes extraem deles suas histórias, filmes, peças de teatro, composições musicais e poesias
A inspiração é um dom divino, que ilumina a pessoa a só fazer o bem. Às vezes o espírito do mal é mais forte, e é ele que prevalece.
Parafraseando o compositor Gonzaguinha, de saudosa memória, “eu fico com a pureza das respostas das crianças…É a vida, e é bonita e é bonita…”
De repente, me vem à mente histórias antigas.
Contava minha querida e saudosa mãe, Dona Lia, que, quando era jovem, começou a namorar com Francisco, parente da sua madrasta, e o namoro resultou num pedido de casamento dele, cuja aceitação foi por ela condicionada à inclusão de uma privada com aparelho sanitário de louça, igual aos da capital.
A preocupação da noiva era que o seu pedido não fosse atendido.
Apesar de muito apaixonada, ela não suportaria se mudar da capital para o interior, indo morar numa cidade atrasada, sem energia elétrica, água encanada e sem, ao menos, poder desfrutar de um banheiro digno.
Em Nova-Cruz (RN), não havia o mínimo conforto material. A cidade não tinha energia elétrica nem água encanada. Água doce, somente para beber e cozinhar. O banho era com água salobra (salgada), levada do Rio Piquiri , aos sábados pela manhã, de trem. Era o chamado “trem da água”.
Nesse dia, as casas se abasteciam de água doce, mediante pagamento aos carregadores, que usavam seus galões, feitos com latas vazias de querosene “jacaré”.
Nos domingos, minha mãe controlava a lavagem de cabeça da meninada, com água doce do Piquiri e raspa de Juá, para evitar caspa.
Na cidade, ainda não existia aparelho sanitário de louça, e sim um quadrado feito com cimento e tijolo, chamado sentina ou latrina, onde o usuário tinha de se acocorar para fazer suas necessidades fisiológicas.
Embaixo, ficava a fossa.
A outra opção eram os penicos.
Por mais amor que existisse entre um casal, era preciso um esforço sobre-humano, para se trocar o conforto da capital, pelo desconforto de uma cidade do interior, sem energia elétrica, água encanada, assistência médica, e com banheiros precários.
Mas os grandes amores existem. Foi o caso do meu pai e minha mãe.
A exigência da noiva foi atendida, e seu sonho foi realizado. A casa ficou perfeita.
Era estilo “bangalô”, e tinha privada de capital, com sanitário de louça.
Ali, os noivos iniciaram a vida de casados, constituindo família, com uma prole de seis filhos, sendo três homens e três mulheres.
A nossa casinha era um lindo “bangalô”, o primeiro de Nova-Cruz.
Ali nasceram os seis filhos de Francisco e Lia, numa união que durou mais de cinquenta anos.
Essas reminiscências, ouvi diversas vezes minha mãe contar, sob protestos e risos do meu pai, que dizia que essa exigência dela tinha sido desnecessária, pois a casinha tinha sido projetada com “banheiro de capital”.
– Deixe de conversa, Lia! Nunca houve isso. Você era louca por mim, e dizia sempre que queria casar comigo, mesmo que fosse para morar debaixo de um pé de pitomba.
Resposta da minha mãe:
– Isto mesmo não!!!
Moral da história: Amor. Belo texto.
Obrigada pela gentileza do comentário, prezado Geraldo Ferraz!
Bom final de semana!