CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Músicas inteligentes de dor de cotovelo interpretadas por Núbia Lafayette

De cara, infere-se que o crítico musical, humorista, compositor, radialista, teatrólogo e cronista Sergio Porto, que fazia grande sucesso no jornal carioca Tribuna da Imprensa nos anos 60 com o pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta, intelectual assumidamente elitista, torceu o nariz à grande intérprete que existia por trás da novata cantora popular, Núbia Lafayette, e suas canções de dor de cotovelo, que conquistava os corações apaixonados das mulheres suburbanas, oprimidas pelos maridos farristas e mulherengos.

IDENILDE ARAÚJO ALVES DA COSTA, nascida no município de Assu-RN, mas desde os três anos mudou-se para ir viver no Rio de Janeiro com a família, trocou o nome para o mais sonoro Núbia Lafayette, por sugestão do compositor Adelino Moreira, quando começou a gravar pela RCA, onde sua carreira deslanchou.

Ela gravou o primeiro 78 rotações em 1959, pela Polydor, como Nilde Araújo. Em 1960, atraiu a atenção de Adelino Moreira, um gênio em compor músicas de dor de cotovelo exacerbada. Ele compôs para ela um samba-canção, “Devolvi,” e a levou para conhecer Paulo Roberto Rocco, chefão da RCA, que a contratou posteriormente. “Devolvi,” composta por Adelino Moreira para Núbia Lafayette, fez tanto sucesso à época que ela a cantou em todos os shows de que participou até se encantar em 2007, aos 70 anos.

Segundo o crítico de música José Teles, “Sérgio Porto, pseudônimo Stanislaw Ponte Preta, não estava errado em seu reducionismo. Núbia Lafayette cantava tragédias, não as grandes tragédias humanas, shakespeareanas, mas as pequenas tragédias pessoais. Os exegetas do estilo sertanejo adjetivado de “sofrência”, de que Marília Mendonça foi o nome mais popular, provavelmente desconhecem as músicas de Núbia Lafayette, origem do DNA de todas as estrelas da sofrência. ‘Devolvi a aliança/e a medalha de ouro/e tudo que ele me presenteou/devolvi suas cartas amorosas/e as juras mentirosas/com que ele me enganou’/ versos de “Devolvi,” com o detalhe da “aliança.” As moças de então eram sérias, namoravam, noivavam e casavam. A aliança de compromisso elas recebiam quando se tornavam noiva.”

“Pode-se determinar como marco zero da carreira de Núbia Lafayette o ano de 1961, quando estreou em LP, com Solidão (Adelino Moreira). Não por acaso, a chamavam de Nelson Gonçalves de Saias. Ambos eram os prediletos de Adelino que escrevia os sambas canção masculinos para Nelson, cujas letras tinham por tema conquistas, pedidos de perdão, novos amores, arroubos machistas. Para ela, eram melancólicas despedidas, traições, compaixão pelo amante mal sucedido ao trocar de amores.”

Mulheres do país inteiro, dos subúrbios das grandes cidades, do interior, se identificavam com Núbia. Ela cantava o cotidiano de boa parte de um enorme contingente feminino de extrema passividade em relação ao companheiro. Por estripulias que aprontasse, ela quase sempre “do lar,” esperava que o amado voltasse para que continuassem a vida juntos. Um ótimo exemplo ao último tema citado é “Prece à Lua” (Adelino Moreira), que merece a letra na íntegra:

Oh! Lua
Oh! Soberana de prata
Oh! Deusa da serenata
Ornamento do sem fim
Guia o meu amor seresteiro
Coração aventureiro
Até que volte pra mim.

Oh! Lua
Conta-lhe toda a verdade
Fala da minha saudade
Deusa do céu não esquece
Diz-lhe que eu estou apaixonada
De olhar preso na estrada/Para ver se ele aparece
Diz-lhe que o meu amor continua
Que eu moro na mesma rua/E que quando ele voltar
Ouvirá dos lábios meus
Apesar da minha dor
Voltaste, graças a Deus
Nunca mais partirás meu amor.

“O sucesso popular acompanhou Núbia Lafayette até 1966, quando o rolo compressor chamado iê-iê-iê passou por cima dos intérpretes da música rotulada de cafona (e de outras, entre estas o forró). Ela ficou de 1965 a 1970 sem lançar LP anual, mudou inclusive de gravadora, saiu da RCA para a Phillips. Se deixara de frequentar as paradas, e aparecer menos na TV, Núbia emplacou sucessos suficientes para circular pelo Brasil fazendo show, sobretudo pelo Nordeste, que continuou fiel ao estilo. Emplacou até 1965, dez sucessos assinados por Adelino Moreira. Vinha com bastante frequência ao Recife, onde tocava muito. No carnaval de 1964, uma das músicas mais tocadas nos clubes foi o samba Madrugada e Amor (José Messias), que deu nome ao LP de Núbia naquele ano.”

“O carisma, o timbre de voz único, o repertório recheado de Adelino Moreira, o português que traduzia como poucos a alma romântica brasileira, fizeram Núbia Lafayette ganhar o status de cult. Alcione a citava como uma de suas maiores influências, revelou que começou a cantar em São Luis (MA) a imitando. Alceu Valença, em entrevista a O Pasquim, nos anos 70, confessou influências de Núbia Lafayette (que os entrevistadores desconheciam). Provavelmente os jovens sertanejos que fazem a sofrência não escutaram Núbia. Se tivessem escutado certamente suas canções seriam mais melodiosas, e as letras menos repetitivas, e das quais escorreriam mais lágrimas do que birita.”

13 pensou em “NÚBIA LAFAYETTE – “A MATRIZ DA SOFRÊNCIA BRASILEIRA”

  1. Obrigado Cícero, voltei no tempo com mil lembranças de minha mãe, tinha todos os LP’s e curtia a Núbia Lafayette, esta música em especial “Devolvi”, cantei junto com o saudoso Nelson Gonçalves.

  2. Estimado Marcos Pontes/DF,

    Bom dia ao mestre e obrigado pelo comentário.

    Marcos, o que acontece na música dor de cotovelo ou “sertaneja”, hoje, é que, além de faltarem grandes compositores e grandes intérpretes, os efeitos especiais exagerados dos esdúdios de gravação maculam a qualidade das músicas e o que vimos são efeitos especiais de qualidade e lacração.

    Anitta, o viadão Pablo Vittar, Maejor Malandra, Bonekinha Glória Groove, Depascito, Poderosas e outros despachos cagatórios.

    Feito os filmes de faroestes das antigas onde os diretores, atores e estúdios tinham responsabilidade nos trabalhos que faziam. Hoje se põe uma jumentada diante da câmara, um punhado de macaquitos fazendo estripulias, terminam de firmar a lacração e entregam aos produtores que só enxergam à sua frente os $$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$.

    Feliz semana para o estimado amigo e família.

  3. Grande e glorioso Cícero:
    Nada como um passeio de volta aos tempos de juventude, já um pouco longínquos.
    Obrigado pela doce oportunidade.
    Um abraço,

    • Caríssimo Magnovaldo Santos.

      Em resposta ao seu agradecimento: não tem por onde, diz Chaves e eu assino embaixo.

      Quanto à Núbia Lafayette e seu talento para interpretar músicas de fossas – no bom sentido – que marcaram a nossa adolescência, principalmente a minha em Carpina (PE), com uma tua de namoradas e depois sem nada, me marcaram profundamente as briguinhas de ciúmes e separação.

      O coração ficava doente, mas depois se acostumava, ou não. Dependendo da namorada e do namoro.

      São essas doces saudades que nos fazem viver.

  4. Núbia Lafayette. O nome já é uma melodia. Melhor que Idenilde Araujo. Valeu, meu caro Ciço, por mais um pouco de cultura. Aproveitando o espaço, aqui vai uma dica de um amante de faroeste para outro. Procure um seriado lançado ultimamente, chamado “1883” e se delicie.

    • Caro Beni .

      Acompanho com muito cuidado todas as sugestões sobre filmes
      do genero western. A DICA QUE O AMIGO NOS DEU É PRIMOROSA, logo após a leitura do seu comentário, fui procurar
      na internet e encontrei essa ótima série e assisti todos os capitulos da primeira temporada com muito gosto. O interessante é que essa série , retrata o inicio, ou seja os ascendentes dos personagens que mais tarde vão fazer parte da extraordinária série YELLOWSTONE , que já está na quarta temporada, com a maior audiência nos States. Os personagens são os mesmos que
      originaran todos os demais da atual Yellowstone., inclusive o
      nome dos personagens principais são os mesmos.
      Quem ainda não assistiu a serie Yellowstone, aconselho não perder
      pois cada capítulo vale como um bom filme genero western.
      Obrigado Beni.

      Nota: Recomendo ao meu amigo Ciço a assistir essa série
      pois sei que ele entende do assunto e vai gostar muito.
      Recomendo que assista as 2 séries, 1883 e depois Yellowstone.

      • Obrigado, estimado d.Matt., pela sugestão a “1883”, série extraordinária com uma reconstituição magnífica da época.

        Já mandei seu afilhado, Luis Antonio Tavares Portella, providenciar Yellodwstone para assistir.

  5. Estimadíssimo Beni Tavares,

    Certamente o estimado comentarista já percebeu. Depois da sugestão mais do que perspicaz do estimado Sancho, o mestre já percebeu que eu adequei os pré nomes da tríade.

    – Beni Tavares, João Tavares e Ciço Tavares, Refrão de música caipira.

    Obrigado pela dica do seriado: “1883”. Tudo que se passa no velho oeste e que não seja maculado por um diretor capenga, é bom. Até os filmes de Trinitty.

    Vou assisti-lo sim, apesar, como diz o mestre d.Matt. de está abarrotado de filmes de western bons.

    Obrigado, amigo, pela leitura e comentário.

    Ótimo semana para o mestre e família.

  6. Ciço, cabra bom,

    Como o espetacular João não é Tavares, faço a devida correção e lanço mais um Tavares, formando agora o Fantastic Four Tavares: Beni Tavares, Arthur Tavares, Handersu Tavares e Ciço Tavares. 4 cabras tão brilhantes que se estivesse Sancho em um avião pegando fogo com esses cabras maravilhosos e tivesse eu em posse de dois únicos para-quedas da aeronave, certamente não hesitaria em ficar com um e dar o outro paraquedas à belíssima aeromoça ruiva,peituda, bunduda e de olhos verdes. kkkkkkkk

    Vou aproveitar a dica e ir atrás, não da aeromoça, mas do seriado 1883.

    Abraçação de Sancho aos quarteto Tavares e um beijão na curitibana.

      • Beni Tavares,

        Fique tranquilo!

        Farrapando o paraqueda do Sancho, um dos meus o salva por ser paidegua! Aliás, salva todos dessa confraria de doidos inteligentes e bem intencionados do JBF.

        Abraçaçação!

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