CARLOS EDUARDO SANTOS - CRÔNICAS CHEIAS DE GRAÇA

No segundo prédio à esquerda ocorreu o fato. Na foto vemos o edifício-sede do Moinho Recife, o Banco do Brasil, os edifícios São Paulo, Socorel, Bandepe, Banco Nacional, o cabaré Chanteclair e a cúpula da Concatedral da Madre de Deus. Foto de Fritz Simons.

Cenário: Elevador lotado.: 22 pessoas. Todos calados e sérios. Fase braba do Regime Militar: 1968. Local: Edf. Capiba, sede do Banco do Brasil. Dentre os muitos passageiros alguns funcionários, dentre eles, as moças Marise e Gerusa, ambas Sonografistas. Estrelas do nosso tema.

Época dos “Gatilhos Salariais”, sistema implantado pelo governo para proteger os trabalhadores contra a inflação.. Era comum os acréscimos mensais de 20 a 30%. A boataria dos reajustes comia no centro. Era um frenesi.

Enaldo Guimarães, ascensorista sempre alegre, anunciou: “Fique no 2!…” Adaptara ele a um jargão que se firmara porque um locutor da Tv Jornal do Commércio recomendava aos ouvintes permanecerem no Canal 2, da emissora de F. Pessoa de Queiroz.

Ao abrir-se a porta do elevador, surge a Sonografista Gerusa. Nessa época o elemento masculino ainda predominava entre o funcionalismo.

Parado o elevador, uma pergunta se ouviu da moça que esperava o ascensor:

– Marise, tem um boato aí que vamos receber 25% este mês!

Logo a resposta imprevisível, que nos deixou estupefatos:

– É boato! Só acredito quando o dinheiro estiver no “pé do cipa”!

E para dar mais teatralidade à afirmativa, Marise bateu com a mão, duas vezes, na região situada entre a pélvis e a coxa. Local anunciado como: “O Pé do Cipa”. O ditado é praxe na linguagem dos menos cuidadosos, quando definem que alguma coisa “está no papo” ou no bolso. Logo, entenda-se que o “pé do cipa” é o mesmo que “coisa garantida”.

Os homens se entreolharam horrorizados com o diálogo e a encenação de u’a moça de tão fino trato e elegância.

O caso se desdobrou. Breno Maciel, sendo um chefe cuidadoso e colega fiel, fez chegar ao pai de Marise, sua preocupação pela expressão vulgar usada por sua filha, que inocentemente a pronunciou, sugerindo orientá-la a respeito. Foi grande o constrangimento, mas fora uma atitude educativa.

O “rolo” subiu no mesmo dia para a Gerência Geral. Manso e cordial Dulcídio foi solicitar ao Gerente Agenor Mendes a transferência de sua filha para outro setor Alegou que na Cobrança trabalhavam muitos rapazes e nem todos rezavam pela cartilha da educação, soltando palavrões, à toda hora, indistintamente. E narrou o fato que acontecera.

O gestor ouviu com muito respeito a narrativa de um pai ainda trêmulo e logo telefonou solicitando que o chefe da CACEX subisse para falar com ele. Jarbas Loureiro foi à Gerência. Depois de ouvir o grave problema da moça permanecer no setor de Cobrança, o Gerente indagou se ele poderia acomodá-la na Carteira de Comércio Exterior.

Jarbas, engatilhou o “sinal vermelho”:

– Agenor, aceitaremos a moça com muita honra mas certo constrangimento, porque fica a ressalva: na CACEX o vocabulário corrente é de “fela da puta” pra cima!…

Marise foi trabalhar no Gabinete Médico. Fechou-se a cortina!…

Deixe uma resposta