Editorial Gazeta do Povo
O presidente Lula escolheu a deputada paranaense Gleisi Hoffmann, atual presidente do PT, para assumir a Secretaria das Relações Institucionais, com status de ministério, no lugar de Alexandre Padilha – que foi para o lugar de Nísia Trindade, da Saúde, demitida em 25 de fevereiro. Para uma pasta cuja principal atribuição é “assistir o presidente da República na articulação política”, trata-se de uma escolha bastante peculiar, e que, embora atenda aos clamores para que o governo dê uma “guinada à esquerda” para recuperar uma popularidade em processo de derretimento, tem tudo para não sair como esperado.
Afinal, Gleisi não vai fazer articulação política com Nicolás Maduro, o ditador venezuelano que ela não perde a chance de afagar em notas constrangedoras publicadas pelo PT. O Congresso com que ela terá de negociar é bem diferente dos camaradas ideológicos de Gleisi: se quando Lula subiu a rampa do Planalto o Legislativo já tinha uma boa parte de membros de centro-direita, o que atrapalhava a formação de maiorias, agora até o Centrão mais fisiológico já ensaia um afastamento, buscando se distanciar de um governo cada vez mais impopular, a ponto de já não ter o mesmo apetite de antes por cargos no Executivo (substituído, em parte, pelo avanço sobre o orçamento por meio de cada vez mais emendas).
Conseguir o apoio da maioria dos parlamentares para aprovar os projetos de lei do interesse do governo, assim, exigiria uma figura com notável habilidade para sair da própria bolha e conversar com líderes e figuras influentes de outros partidos. Se em condições normais um ministro de Relações Institucionais precisaria ser um conciliador, um construtor de pontes, mais ainda teria de sê-lo em um momento delicado para o governo diante da opinião pública. Gleisi Hoffmann, no entanto, é exatamente o oposto disso.
A nova ministra não tem postura conciliadora nem mesmo dentro do partido que ela preside, aproveitando toda chance possível para torpedear outros companheiros de legenda, especialmente o ministro da Fazenda, Fernando Haddad – as pífias medidas fiscais patrocinadas por ele já foram chamadas por Gleisi de “austericídio”. Se ela age assim com os próprios correligionários, o que não fará com quem é “de fora”? A resposta até já se sabe, a julgar pelo destempero da até agora deputada petista contra “a Faria Lima”, ou o Banco Central e seu ex-presidente Roberto Campos Neto. Como há quem diga que as críticas de Gleisi refletem exatamente o que Lula pensa, mas não pode dizer para não piorar ainda mais sua situação, a escolha da parlamentar passa a fazer sentido – embora, paradoxalmente, continue sendo totalmente ilógica.
Lula, que vive em eterna campanha, parece ter parado em 2022, quando havia reunido uma “frente ampla”, ignorando que esses inocentes úteis estavam congregados em torno do petista mais por ojeriza a seu adversário que por entusiasmo em relação a um ex-condenado por corrupção e amigo de ditadores. Essa coalizão circunstancial já se desfez, e muitos dos que “fizeram o L” agora reclamam – embora não se possa dizer de quase nenhum deles que ignorasse o que estaria por vir se Lula vencesse. Se não quiser se tornar um “pato manco” por quase metade do mandato, e inclusive se quiser ser um candidato viável em 2026, Lula tem de sair da bolha de petistas e bajuladores – esse é o trabalho para o qual Gleisi Hoffmann foi escalada. Mas, como há males que vêm para o bem, é possível que o Brasil, no fim das contas, saia beneficiado caso Gleisi mantenha no ministério o estilo confrontador que tem como deputada e presidente do PT. Como as pautas do petismo raríssimas vezes coincidem com os interesses do país, quanto menos apoio parlamentar Gleisi for capaz de conseguir fora da esquerda para projetos nocivos ao Brasil, melhor.