CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Estivesse entre nós, a cafetina mais famosa da Zona da Mata Norte de Carpina (PE), do início do Século XX, Maria Bago Mole, que transformou a famosa Vila dos Vinténs, local de embarques e desembarques de cortadores e transportadores de cana de açúcar do Centro Comercial de Floresta dos Leões, em um paraíso sexual para deleite dos homens, com a construção do famoso cabaré homônimo, teria se juntado à prostituta Gabriela Leite para homenagear todas as raparigas do Brasil e do mundo, se essa também estivesse entre nós.

Mas o espírito revolucionário das duas vagueia por aí inspirando outras call girls a serem o que são sem medo de serem felizes. Maria Bago Mole, assim como Gabriela Leite, era uma prostituta avançada para o seu tempo. As duas souberam agregar adereços sexuais e fantasias nos homens, adereços sexuais muito além da profissão mais antigas do mundo e deram status hierarquizado à categoria, como conceitua o sociólogo Max Weber. Status social é o prestígio que a prostituta possui na sociedade capitalista.

Maria Bago Mole, bem como Gabriela Leite, conscientemente, romperam as barreiras do conservadorismo sexual, quebraram tabus, rasgaram o véu da hipocrisia, disseram sim ao não e fizeram histórias com suas ousadas ofensivas extras sexuais e disseram aos homens que suas vaidades eram o prazer e o prazer estava ali dentro do cabaré: As meninas!

Ao longo dos seus mais de 30 anos de trabalho duro, Gabriela Leite se tornou uma importante referência no debate moderno sobre prostituição no Brasil e no mundo. Se Maria Bago Mole existisse certamente estaria representando esse ativismo junto à Gabriela Leite com outras putas, fortalecendo o movimento que se evidenciou da necessidade de repensar não só a prostituição e a forma como a sociedade a via, mas também a sexualidade e as relações de gênero.

Perceberam logo que era preciso publicizar as questões das prostitutas e conclamar que a prostituição fosse compreendida pelo viés dos direitos humanos, laborais e sexuais e não da doença, do transtorno, da anomalia.

Maria Bago Mole tornou revolucionária essa questão de forma silenciosa, mas com ação, sem contar nem com o homem que ela amava e estava disposto a ajudá-la de todas as maneiras, Bitônio Coelho. Ela preferiu avançar com as suas próprias pernas e fazer sua revolução à sua maneira. A publicidade do seu cabaré, de boca em boca, estava na sua competência de chamar a atenção de todos os homens que naquela casa havia sexo, prazer e diversão e esse sexo, prazer e diversão estavam à disposição deles ao vivo e em cores.

Maria Bago Mole foi um ícone do prazer pelo prazer; por ajudar meninas carentes da região a se valorizarem e terem sua independência financeira vendendo o boca de macaco, único trabalho mais acessível da época; ter construído um cabaré num canto onde só havia mata, miséria e morte; e ter conquistado o fazendeiro mais temido e poderoso da Zona da Mata Norte com retidão e trabalho, sem dele exigir ajuda financeira nem cobrar lealdade. Gabriela Leite foi um ícone da valoração das prostitutas na luta diária pelo reconhecimento da profissão, sem em troca, se promover.
Ambas foram importantes a seu tempo porque deixaram um legado a ser seguido.

Está faltando uma líder que se habilite nesse espólio.

Em 2012 a prostituta Gabriela Leite, já com câncer, concede uma entrevista elegante e reveladora à Revista TRIP. Clique aqui para acessar.

5 pensou em “MARIA BAGO MOLE REENCARNOU EM GABRIELA LEITE

  1. Caríssimo amigo Ciço.

    Parafraseando o seu texto, é valido e de direito, que cada um possa usar a boca
    do macaco como quiser, ou precisar, devido não somente as preferências pessoais, mais outrossim às necessidades inevitáveis.
    Entretanto, entre as duas posições expostas pelo amigo, prefiro continuar
    amante da nossa Maria Bago Mole. Assim sendo, confirmo o que me é sempre
    dito pelo colega Sancho , que sempre me coloca em seus comentários, como amante fascinado pela nossa querida Maria.

    Como assim , se ela existisse ? Claro que existe pois foi uma criação sua, uma personagem de grande personalidade , aceita e cultuada por grande parte dos seus leitores. Meu Caro Ciço, acredite, não é nada fácil criar um personagem
    em qualquer texto literário ou não, que perdure e seja alvo de constantes
    citações dos seus leitores, e quando assim o fazem, eles se tornam parte
    integrante do mundo criado e idealizado pelos leitores de qualquer gênero criativo.
    Fique certo, nem só de Bitônio Coelho é feito o mundo idealizado que existe
    naquele Cabaré, existem muitos outros e como acho que também sou filho
    de Deus, escrevo o meu nome na longa lista de admiradores, que sem dúvida
    encontrarei na longa lista, inúmeros nomes que se revelam assíduos
    frequentadores e amantes das lindas moçoilas . Gente que mantém a
    cabeça sob o capuz, sem a coragem de revelar a sua verdadeira identidade.
    Não é verdade, meu Caro Sancho ?

    Na minha humilde opinião, acho que foi a Gabriela Leite que se inspirou
    na Maria Bago Mole.

    • Estimado comentarista do coração D.Matt.,

      No texto, quando eu me refiro à existência de Maria Bago Mole, mulher revolucionária, estadista do sexo, quero dizer que: se ela não tivesse se encantado e houvesse uma substituta à sua altura, seu legado estava vivo.

      Mas mesmo ante sua ausência, ela continua viva até hoje a vai continuar porque o que fez o tempo não apagará.

      Forte abraço estimado amigo do coração.

  2. Belo texto, Mestre Cícero.
    O contexto orientador, sério e didático na abordagem do tema, é digno de elogios.

    Sempre verifiquei que, em cidades ou distritos onde existisse uma “Casa de Recursos”, o índice de criminalidade era inferior aos demais. Qualquer estudo sociológico ou antropológico honesto, me dará razão.
    A serena e destemida entrevista da Gabriela, revela um universo a ser estudado e explorado sobre o apaixonante tema.

    Parabéns, compadre Cícero.

  3. Estimado comentarista do coração Marcos André Cavalcanti:

    O nobre causídico tem razão. Um cachorro castrado não tem a mesma fúria canina de um cachorro não castrado. A testosterona aumenta-lhe a agressividade. O mesmo se pode atribuir ao homem, uns muito; outros pouco. Mas todos tem. Daí o fato de existirem muita agressividade masculina principalmente em uma determina idade.

    Concordo plenamente com os Estados Unidos quando autoriza a “capação” de todos os pedófilos. Eles deixam de ser um mau à sociedade.

    Fiz essa introduçãozinha para deixar bem claro que na época do Cabaré de Maria Bago Mole dificilmente os homens se digladiavam e se matavam, por que à medida que frequentavam o cabaré despejavam sua fúria lá por meio do prazer sexual.

    Isso era fato.

    Por isso é que Maria Bago Mole, intuitivamente, sempre saía à procura de “meninas novas” nos sítios para suprir as que “arranjavam maridos e se mandavam”.

    O Cabaré não poderia ficar vazio porque era o cano de escape masculino. E Maria Bago Mole, intuitivamente, tinha consciência disso.

    Era ela a Sociologia e a Antropologia na carne!

  4. Parabéns pela perfeição do texto, querido cronista Cícero Tavares!

    Essas duas personagens, de espírito revolucionário e personalidade forte, merecem permanecer vivas nos seus escritos, lustrando suas excelentes crônicas.
    A vida de “Maria Bago Mole” merece uma Saga, com sucesso garantido!

    Grande abraço, e uma ótima semana!

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