Guilherme Macalossi
O presidente Lula, em entrevista a uma rádio de Salvador (BA), em 2 de julho
A verborragia de Lula há muito vem custando um alto preço para sua própria administração. Com indicadores de popularidade crescentemente negativos, o presidente achou que redobrar a exposição com uma série de entrevistas teria efeito benéfico. A estratégia do Planalto, prestigiando emissoras de rádio do interior, visava dar publicidade a ações e projetos considerados positivos pelo governo. Mas o resultado foi o inverso. Lula retomou as críticas ao Banco Central e Roberto Campos Neto, disparando diariamente contra os juros, a política monetária e relativizando o problema das contas públicas. Ao final, conseguiu apenas parir uma crise de confiança.
No dia 26, durante conversa com o portal UOL, Lula negou a intenção de desvincular benefícios previdenciários da valorização do salário mínimo. Também afirmou que não passava por sua cabeça fazer qualquer alteração no regime previdenciário militar, que representa boa parte dos gastos da área. Segundo o Tribunal de Contas da União, o déficit estimado da previdência militar é R$ 50 bilhões ao ano, com um custo per capita de R$ 158 mil.
A um só tempo, ele desautorizou seus dois principais ministros da área econômica. Fernando Haddad, da Fazenda, e Simone Tebet, do Planejamento, trabalhavam para apresentar ao presidente um plano de contenção de gastos que, de alguma forma, englobasse exatamente essas medidas. Tebet chegou a defender isso publicamente em entrevista para o jornal O Globo: “Nós vamos mostrar para o presidente que é possível cortar gastos de privilégios. Não estou dizendo que vamos conseguir avançar com os supersalários, mas tem que estar na mesa. Uma legislação previdenciária que, ainda que de forma gradual, atinja os militares”, disse. Temendo desgaste com a base de esquerda e com os militares, Lula atirou o plano pela janela antes mesmo de ele ser apresentado.
Ao invés de anuir com a necessidade de algum tipo de corte nos gastos públicos, o presidente foi pela linha inversa. “Problema não é que tem que cortar. Problema é saber se precisa efetivamente cortar ou aumentar a arrecadação. Precisamos fazer esta discussão”, afirmou também ao UOL. O somatório da relativização fiscal com os ataques ao Banco Central alarmou o setor financeiro, que refletiu sua preocupação na subida vertiginosa do Dólar. A moeda americana lambeu os R$ 5,70. Com o risco do impacto sobre a inflação, a curva de juros futuros também se elevou.
É bem verdade que o ambiente internacional tem sido de enorme instabilidade, o que afeta diretamente o comportamento do dólar e de outros ativos globais, mas o fator Lula se impôs de forma determinante durante a semana. A palavra do presidente pesa, afinal. Os arroubos contraproducentes do petista, aliás, parecem emular o comportamento do antecessor Jair Bolsonaro. A diferença é que Lula ainda não montou um cercadinho na frente do palácio da Alvorada.
Uma força-tarefa foi montada para convencer Lula a baixar o tom. Haddad e uma turma de economistas alinhados com as teses lulopetistas foram convocados para ir ao seu encontro. Saíram de lá com a promessa de moderação. Resta saber se ela dura. O mercado deu uma clara sinalização: juros se derrubam com política fiscal, não elegendo uma Geni para bater e cuspir.