MAURÍCIO ASSUERO - PARE, OLHE E ESCUTE

No início desse século o OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico teve a brilhante ideia de promover um teste de conhecimento para estudantes de, aproximadamente, 80 países, dentre os quais o Brasil. Surgiu o exame do PISA – Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, que exige conhecimento em Matemática, Ciências e Leitura. O exame é aplicado para estudantes com até 15 anos.

Desde os primeiros resultados, o Brasil tem ocupado uma sofrível posição dentre os participantes e quando a gente olha o que aconteceu em 2022 dá vergonha. Basta dizer que 50% dos nossos alunos não leem mais do que três páginas de texto… por ano. Menos de 10% conseguem ler mais de cem páginas e o resultado nos colocou em posição distante de países vizinhos como Argentina e Chile.

Nitidamente, o modelo educacional que temos é falho. Fui aluno de escola pública, localizada no interior do estado, no sertão, e meus professores eram mais dedicados a nos ensinar do que meus colegas de escola pública quando passei a ensinar. O tempo entre o término do meu ensino fundamental e minha experiência como professor foi inferior a dez anos e numa década eu não conseguia entender o que aconteceu com a educação.

Dois casos curiosos aconteceram: o primeiro é que não havia as escolas de referência como há hoje – tempo integral – e tínhamos 5 aulas de Matemática por semana em cada turma. Então, numa reunião de planejamento eu propus que dessas 5 aulas a gente reservasse duas, por semana, para ensinar geometria porque era os últimos capítulos do livro e não dava tempo de abordar. Nenhum dos demais professores aceitou e o motivo, soube depois, era que eles não sabiam geometria.

O segundo caso aconteceu quando postulamos colocar o ensino médio nessa escola. Precisávamos garantir que não teria disciplina sem professor e aí eu pedi para assumir as disciplinas de Física e Matemática, no ensino médio. Um professor insistiu pra ficar com uma turma de Física e não vi problema. O fato é que um aluno dele me procurava com frequência para ajudar a resolver a lista de exercícios e depois de tanta “ajuda” eu perguntei: “por que você não pede a teu professor para resolver?” e o aluno respondeu: “prof. não comente com ele, nem com ninguém, mas ele pega essa lista do livro e me pede para falar com o sr. O sr. resolve, eu passo para ele e copia as respostas no quadro”.

É por essa razão que me choquei quando vi que a qualidade dos professores que ensinavam no colégio onde trabalhei era muito inferior à qualidade dos professores que tive. Não preciso dizer que ao longo do tempo isso só piorou e fico estupefato quando vejo alguém defender esse modelo educacional que não produz nada, ou melhor, produz uma maioria de analfabetos. Quando vemos os resultados obtidos na prova do PISA em leitura é que percebemos que não há incentivo para se fazer diferente.

Essa semana, num grupo de zap, um dos colegas afirmou que a escola pública só melhoraria se o filho do governador estudasse nela. Na escola que ensinei, durante uma reunião de pais e mestres eu pedi a diretora da escola que dissesse o nome da escola que os filhos dela estudavam. Ela não disse, claro, mas eu não deixei de dizer que a escola pública que estava era para filho se miseráveis e nenhum professor tinha filho estudando em escola público.

Cabe lembrar que essa ideia de filho de político estudar em escola pública foi dita, exaustivamente, por Eduardo Campos, agora ele nunca tirou os filhos dele de escolas privadas para matricular na escola pública. Deveria ter aproveitado a ocasião e ter dado um bom exemplo. Não fez, porque tudo isso é pura demagogia e o governo, para suprir sua deficiência acerbada, criou um sistema de cotas onde, logicamente, se entende os fins. O sistema de cotas não passa disso: o reconhecimento da falência múltipla dos nossos órgãos governamentais.

De certa forma não soubemos aproveitar o desenvolvimento tecnológico do mundo. Pelo contrário, caímos um pouco mais. Recentemente puseram um anúncio no grupo de professores do meu departamento onde ofertava-se monografias para os concluintes da graduação. Isso mesmo: pague X reais e você não precisa se preocupar para fazer uma monografia com 30 páginas, sem precisar pesquisar nada. Francamente, não condeno quem vende esse tipo de produto e nem quem o compra afinal esse cara que está comprado é só o retrato do que foi feito com ele ao longo de 4 anos de graduação, ou seja, não teve ensinamento necessário para se envolver com uma pesquisa, escrever um texto e defender sua ideia.

O Brasil cometeu um erro crasso: colocou muita política na educação e pouca educação na política. Por isso, externa para o mundo seu alto nível de burrice. Vamos continuar levando PISA e não vamos aprender.

6 pensou em “LEVANDO PISA

  1. Maurício. Eu sempre digo, com 32 anos de experiência na Educação Básica pública, que nas nossas escolas está faltando muito Mises e sobrando Marx. Essa deficiência sistêmica que você aborda não é incidental. Ao seu contrário. É planejada, arquitetada e executada para esse mesmo fim. Vivemos, desde o fim da década de 1970 um processo de desmonte do processo educacional brasileiro. Um investimento na ignorância, no analfabetismo funcional e no orgulho da burrice. Isso é paulofreiarianismo puro. A escola não ensina, mas incute na cabeça da criança e do adolescente que o sistema capitalista é perverso. Esse mesmo aluno sai da escola com pouca, ou quase nenhuma bagagem instrucional e cultural, vira mão de obra desqualificada e se revolta com o sistema, sendo cooptado por aqueles que querem destruir o capitalismo, para ser mais um soldado na luta contra o sistema opressor. Isso tem método. Isso tem objetivo. Isso tem propósito. Os resultados que se colhem agora pelo PISA é só um reflexo, um pálido reflexo da tragédia que é a educação, principalmente a pública, no Brasil em todos os seus quadrantes.

    • Roque, coberto de razão. E enquanto a coisa continua assim abre-se espaço sempre para doutrinar pedindo qualidade na educação, sem que observe que essa qualidade é inerente a quem ensina também.

  2. Uma questão inevitável: até que ponto o “efeito Paulo Freire” — das políticas esquerdistas voltadas para a educação — tem a ver com esse estado de coisas? Ou estou muito enganado e essa “metodologia” não é tão perversa como sempre imaginei?

    • Roberto, francamente eu penso igual ao que Roque falou. No meu ponto de vista, a coisa vem de longe e Paulo Freire saiu do país em 64 e seu método era voltado para alfabetização de adultos. Acredito que o pior veio com a abertura porque aí deu-se espaço para discutir ideologia e trouxeram, de fato, Paulo Freire para sala de aula. Como estudante eu assisti duas palestras dele na universidade e não vesti a camisa….

  3. Prezado Maurício: não sou da área educacional, mas vou dar meu pitaco. Toda a minha vida de estudante foi feita em escolas públicas, desde o primário até a Engenharia (Poli USP). Mas uma amostra de toda essa aberração chamada educação brasileira, promovida pela maldita esquerda, foi uma entrevista que eu fazia com um candidato a um cargo de Engenheiro Junior em uma empresa para a qual trabalhei (uma posição em uma indústria que produzia equipamentos térmicos). Valha-me Deus!: o jovem não tinha nenhuma idéia de como transformar graus Fahrenheit em graus Celsius.

    • Meu mestre, eu não sei se já comentei isso com você. Eu fiz uma lista de equações diferenciais com três questões e cada questão tinha dez itens (a, b, c… ). Na primeira questão eu coloquei: Resolva as equações diferenciais (e logo abaixo os dez exemplos). Na segunda questão eu coloquei Resolva e logo abaixo os dez exemplos….. uma garota mandou me perguntou o que era para resolver na segunda questão porque na primeira eu escrevi Resolva as equações diferenciais e na segunda eu coloquei apenas Resolva…..Meu caro, francamente, se eu tivesse oportunidade estaria fazendo outra coisa, não dando aula. Hoje, de manhã duas orientações, agora a tarde, fechamento de um artigo para um e-book, um apostilamento de um contrato e tem mais para daqui a pouco…..

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