PEDRO MALTA - REPENTES, MOTES E GLOSAS

João Paraibano e Severino Feitosa glosando o mote:

O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

João Paraibano

Cada verso que o repentista faz,
para mim tá presente em toda hora,
no tinido do ferro da espora,
na passada que vem dos animais,
na cor verde que tem nos vegetais
nas estrelas que têm no firmamento,
tá na cruz do espinhaço do jumento,
e no vaqueiro correndo atrás do gado.
O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

Severino Feitosa

O poeta é um gênio que crepita
no espaço azul esmeraldino,
percorrendo as estradas do destino,
sem saber o planeta aonde habita,
sua mente pra o canto é infinita,
cada verso que faz é seu sustento,
é quem sabe cantar o parlamento,
sem ter voto pra ser um deputado.
O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

João Paraibano

Uma vida vivida no sertão,
uma fruta madura já caindo,
um relâmpago na nuvem se abrindo,
um gemido do tiro do trovão,
meia dúzia de amigos no salão,
nem precisa de um piso de cimento,
minha voz, as três cordas do instrumento,
o meu quadro de louco está pintado.
O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

Severino Feitosa

O poeta é um simples mensageiro,
que acaba uma guerra e um conflito,
ele sabe cantar o infinito,
todas pedras que têm no tabuleiro,
a passagem do fim do nevoeiro,
que ultrapassa o azul do firmamento,
que conhece o impulso desse vento,
todas as rosas que enfeitam o nosso prado.
O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

João Paraibano

Foi mamãe que me deu a luz da vida
e me ensinou a viver da humildade,
eu nasci para ter felicidade,
porque toco na lira adquirida,
poesia me serve de bebida,
um concerto me serve de alimento,
uma pedra me serve de assento
e todo rancho de palha é meu reinado.
O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

Severino Feitosa

O poeta é uma criatura
que procura mostrar, no seu caminho,
toda uva do fabrico de vinho,
e toda planta que faz nossa fartura,
é quem sabe cantar a amargura
da pessoa, que está num sofrimento,
é quem sabe cantar o regimento
do quartel, que Jesus é delegado.
O poeta é um ser iluminado
que faz verso com arte e sentimento.

* * *

Adalberto Claudino Pereira glosando o mote:

As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Fui criança e vivi muito feliz
Recebendo carinhos dos meus pais,
Os brinquedos ficaram para trás,
E também outras coisas que eu fiz,
Sempre tive tudo aquilo que eu quis,
Nunca tive momentos descontentes,
Estudei, sempre fui inteligente,
Também fui por meus pais bem educado,
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Sempre fui um exemplo na escola,
Estudando história e português,
Dava show em desenho e francês,
Pra passar nunca precisei de cola,
No esporte também fui bom de bola,
Mas agora não dou um passo à frente,
A velhice atrapalha muita gente
É por isso que sempre estou lembrado,
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Quando eu era pequeno eu vivia
Mais feliz, com amor por todo o lado,
Pelas moças eu era bajulado,
Em seus braços babava de alegria,
Dava pulos, dançava e sorria,
Pois ali eu ficava mais contente,
Mas agora, já velho e descontente,
Na bengala eu vivo escorado,
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Na infância a vida é mais gostosa,
Apesar dos momentos de castigos,
Não esqueço também os meus amigos
E mamãe cada vez mais carinhosa,
A vizinha andando bem charmosa,
Meu cachorro, pequeno mas valente
E meu pai, que falava duramente,
Parecendo estar mal humorado,
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Era bom namorar a menininha
E brincar de peteca nas calçadas,
Beliscar as meninas assanhadas
E sonhar com a filha da vizinha,
A tristeza era coisa que eu não tinha,
Apesar de ser pouco inocente,
A certeza de ser velho é patente,
Mas ninguém se declara conformado,
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Se nós somos crianças inseguras,
Nosso sonho é ganhar a liberdade,
E lutar para ter felicidade
E viver uma vida de fartura.
Não sabia que havia a amargura
De ser velho, caduco e impotente,
É melhor ser criança novamente,
Para ser outra vez paparicado,
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

Vi meu pai comentando certa vez:
“Sinto falta da minha mocidade,
Ai, meu Deus, como eu tenho saudade
Quando eu tinha apenas vinte e três,
Eu invejo esta vida de vocês,
Mas espero encontrá-los lá na frente,
Como eu, velho, fraco e impotente
E dizendo assim desesperados:
As lembranças que guardo do passado
Me confortam para viver o presente.

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