Consultórios médicos, como sabemos, são o inferno em vida de um paciente que reclama os incômodos de hemorroidas. A cirurgia nem é tão infernizante porque a anestesia evita dores. Porém o pós-operatório é lasca.
Certa feita fui acompanhar o amigo Marcelino que estava nervosíssimo diante do “bicho” que se fazia sobre a aplicação de um medicamento conhecido como “Nitrato de Prata”, destinado a limpeza da ferida hemorroidal após as cirurgias.
Tive o cuidado de lhe transmitir certos detalhes, para dar a entender que era coisa parecida com um supositório de glicerina, desses que usamos na infância para resolver prisão de ventre.
Mas, no caso, eu sabia tratar-se de um cauterizante químico que acelera a cicatrização e tenta evitar defeitos nas feridas, possibilitando retardamento na solução da enfermidade.
Quando o boato correu na rua em que ele mora, e ficou sabendo que iria ser medicado com “Nitrato de Prata”, tremeu mais do que vara verde.
Alias, pelo pouco que sabia, enquanto aguardávamos na sala de espera a chamada para o atendimento, lhe informei alguma coisa sobre o medicamento, porque ele teria sido informado que o produto ardia muito.
Disse-lhe que sua composição era simples. Tudo para tranquilizá-lo.
O farmacêutico havia me falado que se preparava a fórmula com certa dose de prata metálica em ácido nítrico concentrado e a medicação já estaria pronta. Mas foi apavorante.
– Ácido? Tô lascado. Vai comer minhas entranhas!
Deixei que ele se acalmasse e puxei conversa com um senhor moreno, corpulento, que estava com os olhos arregalados e ouvidos atentos à nossa conversa. E de seus lábios vieram as perguntas:
– É a primeira vez dele? Dizem que arde um bocado! E quando o ácido entra neguinho estribucha na maca. Fui estivador quase 20 anos, enfrentei sacos de cimento nas costas e nunca senti dor, mas essa tal de hemorroida está sendo meu inferno. Vou ter que enfrentar e mostrar que sou homem, agora.
Para acalmá-lo naquele instante em que parecia que ele também iria para a forca, argumentei:
Arde tanto não! Isso é “bicho de sete cabeças” que fazem de um medicamento simples. É só uma pomadinha, duas ou três vezes introduzida no seu ânus e pronto.
O cidadão seria atendido antes de Marcílio. Notamos sua inquietude, coitado. Tão corpulento e tão frouxo.
A gentil enfermeira, com ar angelical, chamou:
– Seu Severino, venha!
O morenão de repente ficou branco. Notei que ele entrou na sala com palidez cadavérica. Um momento Impressionante.
Algum tempo depois, ao sair da “sala-de-suplício”, indagamos como teria sido a aplicação.
– Aguentei porque sou macho! Mas esse tal de Nitrato de Prata arde que só a peste. Nunca mais voltarei aqui! Deixar que metam ácido nítrico em meu forever, nunca mais! Foi o mesmo que sentir fogo no rabo!…
Carlos, depois dessa opinião Marcílio encarou?
Coitado!
Ainda hoje quando houve falar no metal ouro vai logo advertindo o interlocutor:
– Por favor não me fale de prata pois me lembro logo da dor provocada pelo infame do Nitrato.
Abração,
Carlos Eduardo