CORRESPONDÊNCIA RECEBIDA

Bom dia Luiz Berto!

Leio com certa frequência esta gazeta escrota e me identifico muito com as opiniões e publicações aqui expostas.

Tem coisas que não sabemos explicar o motivo, hoje pela manhã, vasculhando algumas pastas no computador, encontrei um texto que recebi/copiei a tempos e se quer me lembrava.

No mesmo momento, ao lê-lo, me senti na obrigação de lhe enviar, para que se acaso ache válido, publique. Segue o texto tal como recebi/copiei, preferi não incluir o nome de quem o publicou, visto que se quer me lembro como ele chegou as minhas mãos:

Um grande abraço.

R. Meu caro, aqui nesta bodega que manda é o freguês.

Tudo que os nossos estimados leitores nos mandam é publicado de imediato.

Só agora, depois de editado e postado, é que vou ler o texto que você nos mandou.

Grato pela força e pela audiência.

Mande as ordens

* * *

Este artigo nos foi entregue pelo Prof. Dr. Pedro Renato Lúcio Marcelino, em classe, (4º ano do Curso de Direito da Faculdade de Direito de Salto) que recebeu em um congresso, onde foi debatido a boa fé objetiva, a eticidade e a sociabilidade, que se encontra presente no novo Código Civil. Não sabemos quem foi o autor do texto, mas merece ser lido e refletido sobre seu conteúdo. Ao autor, nossos agradecimentos e estaremos divulgando.

***

Diz uma história que numa cidade apareceu um circo, e que entre seus artistas havia um palhaço com o poder de divertir, sem medida, todas as pessoas da platéia e o riso era tão bom, tão profundo e natural que se tomou terapêutico.

Todos os que padeciam de tristezas agudas ou crônicas eram indicados pelo médico do lugar para que assistissem ao tal artista que possuía o dom de eliminar angústias.

Um dia, porém um morador desconhecido, tomado de profunda depressão, procurou o doutor. O médico então, sem relutar, indicou o circo como o lugar de cura de todos os males daquela natureza, de abrandamento de todas as dores da alma, de iluminação de todos os cantos escuros do nosso jeito perdido de ser. O homem nada disse, levantou-se, caminhou em direção á porta e quando já estava saindo, virou-se, olhou o médico nos olhos e sentenciou: “não posso procurar o circo… aí está o meu problema: eu sou o palhaço”.

Como professor vejo que, às vezes, sou esse palhaço, alguém que trabalhou para construir o outro e não vê resultado muito claro daquilo que faz. Tenho a impressão que ensino no vazio (e sei que não estou só nesse sentimento) porque depois de formados, meus ex-alunos parecem que se acostumam rapidamente com aquele mundo de iniqüidades que combatíamos juntos. Parece que quando meus meninos(as) caem no mercado de trabalho a única coisa que importa é quanto cada um vai lucrar, não importando quem vai pagar essa conta e nem se alguém vai ser lesado nesse processo.

Aprenderam rindo, mas a não querem passar o riso á frente e nem se comovem com o choro alheio. Digo isso, até em tom de desabafo, porque vejo que cada dia mais, meus alunos se gabam de desonestidades. Os que passam os outros para trás são heróis e os que protestam são otários, idiotas ou excluídos, é uma total inversão dos valores. Vejo que alguns professores partilham das mesmas idéias e as defendem em sala de aula e na sala de professores e se vangloriam disso.

Essa idéia vem me assustando cada vez mais, desde que repreendi, numa conversa com alunos, o comportamento do cantor Zeca Pagodinho, no episódio da guerra das cervejas e quase todos disseram que o cantor estava certo, tonto foram os que confiaram nele. “O importante professor é que o cara embolsou milhões”, disse-me um; outro: “daqui a pouco ninguém lembra mais, no Brasil é assim, e ele vai continuar sendo o Zeca, só que um pouco mais rico”, todos se entreolharam e riram, só eu, bobo que sou, fiquei sem graça.

A pergunta é: é possível, pela lógica, que todo mundo ganhe?

Para alguém ganhar é óbvio que alguém tem de perder.

A lógica é guardar o troco a mais recebido no caixa do supermercado; é enrolar a aula fingindo que a está sendo dada; é fingir que a apostila está aberta na matéria dada, mas usá-la como apoio enquanto se joga forca, batalha naval ou jogo da velha; é cortar a fila do cinema ou da entrada do show; é dizer que leu o livro, quando ficou só no resumo ou na conversa com quem leu; é marcar só o gabarito na prova em branco, copiado do vizinho, alegando que fez as contas de cabeça; é comprar na feira uma dúzia de quinze laranjas; é bater num carro parado e sair rápido antes que alguém perceba; é brigar para baixar o preço mínimo das refeições nos restaurantes universitários, para sobrar mais dinheiro para a cerveja da tarde; é arrancar as páginas ou escrever nos livros das bibliotecas públicas; é arrancar placas de trânsito e colocá-las de enfeite no quarto; é trocar o voto por empregos, pares de sapato ou cestas básicas; é fraudar propaganda política mostrando realizações que nunca foram feitas: a lógica da perpetuação da burrice.

Quando um pais perde, todo mundo perde. E não adianta pensar que logo bateremos no fundo do poço, porque o poço não tem fundo. Parafraseando Schopenhauer: “Não há nada tão desgraçado na vida da gente que ainda não possa ficar pior”. Se os desonestos brasileiros voassem, nós nunca veríamos o sol. Felizmente há os descontentes, os lutadores, os sonhadores, os que querem manter o sol aceso, brilhando e no alto. A luz é, e sempre foi a metáfora da inteligência. No entanto, de nada adianta o conhecimento sem o caráter. Que nas
escolas seja tão importante ensinar Literatura, Matemática ou História quanto decência, senso de coletividade, coleguismo e respeito por si e pelos outros. Acho que o mundo (e sobretudo, o Brasil) precisa mais de gente honesta do que de literatos, historiadores ou matemáticos. Ou o Brasil encontra e defende esses valores e abomina Zecas, Gérsons, Dirceus, Dudas, Rorizes todos os que chamam desonestidades flagrantes, de espertezas técnicas, ou o Brasil passa de
país do futuro para país do só furo.

De um Presidente da República espera-se mais do que choro e condecoração a garis honestos, esperam-se honestidade em forma de trabalho e de professores, espera-se mais que discurso de bons modos, espera-se que mereçam o salário que ganham (pouco ou muito) agindo como quem é honesto.

A honestidade não precisa de propaganda, nem de homenagens, precisa de exemplos. Quem plantar joio, jamais colherá trigo.

Quando reflexões assim são feitas cada um de nós se sente o palhaço perdido no palco das ilusões. A gente se sente vendendo o que não pode viver, não porque não mereça, mas porque não há ambiente para isso. Quando seria de se esperar uma vaia coletiva pelo tombo, pelo golpe dado na decência, na coerência, na credibilidade, no senso de respeito, vemos a população em coro delirante gritando “bis” e, como todos sabemos, um bis não se despreza. Então, uma pirueta, duas piruetas, bravo! bravo!

E vamos todos rindo e afinando o coro do “se eu livrar a minha cara o resto que se dane”.

Enquanto isso o Brasil de irmã Dulce, de Manuel Bandeira, do Betinho, de Clarice Lispector, de Chiquinha Gonzaga e de muitos outros heróis anônimos que diminuíram a dor desse país com a sua obra, levanta-se, caminha em silêncio até a porta, vira-se e diz:

“Esse é o problema…eu sou o palhaço”.

3 pensou em “FIDELIS GOMES DO AMARANTE JÚNIOR – BRASILIA-DF

  1. Meu caro Fidélis, o texto que você enviou, embora contenha observações pertinentes, contém uma terrível mentira, que destaco abaixo:

    “A pergunta é: é possível, pela lógica, que todo mundo ganhe?
    Para alguém ganhar é óbvio que alguém tem de perder.”

    Não, caro Fidélis, isso é completamente falso. Esse conceito é difundido pelos seguidores de Marx, que buscam conquistar o poder através da luta de classes, e para isso arrebanham seguidores apelando aos instintos mais primitivos do ser humano, como a inveja e a cobiça.

    Este pensamento é conhecido na economia como “jogo de soma zero”, e só faz sentido para aqueles que, cegados por uma ideologia, recusam-se a ver que a riqueza é fruto do trabalho e da inteligência humanas, preferindo acreditar que a única forma de obter riqueza é tomando-a dos outros.

    Imagine que você resolva plantar milho em seu quintal. Você terá que capinar a terra, jogar as sementes, talvez regar um pouquinho, e esperar. Meses depois, você colherá as espigas e oferecerá aos vizinhos. Os que gostarem de milho pagarão o preço pedido, se acharem justo. Você receberá o pagamento pelo seu trabalho.

    Alguém perdeu nesta história toda? A riqueza foi produzida, negociada e consumida. Você foi pago pelo seu trabalho. Seus vizinhos usaram o dinheiro deles, também fruto do trabalho, para adquirir algo que desejavam. Ninguém perdeu nada. Todos ganharam.

    A quantidade de riqueza no mundo não é constante. A riqueza aumenta cada vez que alguém trabalha e produz algo. Nunca haverá “falta de riqueza” que justifique essa afirmação absurda de que o ganho de um é a perda de outro.

    • Olá Marcelo

      O Fidelis se referiu ao ganho sem trabalho, fruto do logro, da desonestidade, não ganho legítimo, que vc. exemplificou.
      sds

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