Silvestre Péricles era um governador honesto, trabalhador, contudo, arbitrário, um caudilho, às vezes violento em suas imposições políticas. No dia 3 de outubro de 1950 estavam marcadas eleições gerais. Silvestre lançou seu candidato a governador, Campos Teixeira. Naquela época não havia pesquisa, mas ele dizia ter mais de 80% dos votos. Os caciques da oposição, da UDN, com eleição garantida para deputado, não se arriscaram a candidatar-se contra Campos Teixeira. Foi quando apareceu um jovem jornalista, com ousadia e audácia topou a candidatura afirmando que ganharia a eleição para governador do Estado. Arnon de Mello entrava assim para história das Alagoas. Candidato à Constituinte de 1945, Arnon perdeu; teve 1.300 votos. Atrás de Silvestre (6.105), Rui Palmeira (3.232), Freitas Cavalcanti (2.388). Na frente de Carlos Prestes (1.093), Graciliano Ramos (62).
A campanha eleitoral de 1950 foi uma das mais violentas na história das Alagoas. Como todo déspota, Silvestre não admitia crítica. Quando os jornalistas da oposição criticavam o governo com veemência, ele ficava possesso e dava o troco. Mandou dar surra no jornalista Donizete Calheiros, empastelar um jornal, tocar fogo no caminhão dos estudantes que pichavam os muros com propaganda de Arnon. A campanha foi um período de tiros, mortes, chacina na cidade de Mata Grande, várias pessoas de uma família morreram. O irmão de Silvestre, Senador Ismar de Góes Monteiro, seu inimigo político, levou três tiros numa tentativa de assassinato. O clima era de total intranquilidade.
Numa noite de brisa de agosto, eu estava em minha casa lendo revistas em quadrinhos, menino de 10 anos, experto, maloqueiro da praia da Avenida da Paz, quando bateram palmas no portão. Atendi e me surpreendi com um grupo de político, em torno de uma dúzia, a maioria com paletó branco e apenas uma mulher. Perguntaram-me pelo Coronel Mário Lima, comandante do 20º Batalhão de Caçadores. De repente meu pai chegou cumprimentando os visitantes, seus amigos. Era a cúpula da UDN que pedia abrigo para realizar uma reunião, o único local que acharam seguro para discutirem as estratégias de campanha e denunciar o clima de intranquilidade foi minha casa. Meu pai os recebeu, deixou-os à vontade na sala.
Os membros da oposição, que Silvestre chama de “udeno-comunistas”, discutiram durante toda noite. Eu, menino curioso fiquei admirando, prestando maior atenção ao debate sobre as medidas a serem tomadas. O que mais me impressionou foi a atuação determinada e cheia de opiniões da única mulher do grupo, Dona Leda, esposa de Arnon de Mello; naquela época lugar de mulher era na cozinha. Fui dormir e deixei os políticos, Rui Palmeira, Freitas Cavalcanti, Melo Mota, Carlos e Mário Gomes de Barros, Ezequias da Rocha, Oséas Cardoso, entre outros discutindo até a madrugada, com o apoio da água gelada, cafezinho, doce de mangaba, bolo, e refresco de cajá de Dona Zeca.
Essas reuniões se repetiram. Meu pai, tomou essa posição em receber seus amigos políticos na nossa residência para evitar mais violências. Ele comunicou o fato ao governador e ao General Comandante da 7ª Região. Ele se responsabilizava pela acolhida aos políticos receosos de uma reprimenda.
Arnon de Mello estava crescendo eleitoralmente na capital e no interior, o que levava os governistas ao desespero. A eleição se aproximava e a garantia das tropas do Exército solicitada pela oposição não chegava ao 20º BC. O General Góes Monteiro, irmão de Silvestre, eminência parda da República, candidato a Senador em Alagoas, segurou a ordem de envio de tropas para garantir a eleição no interior.
Foram expedidos radiogramas para a 7ª Região Militar–Recife, informando que estavam sendo preparadas fraudes e violências durante a eleição. Eram duas horas da manhã do dia 3 de outubro, quando chegou a ordem para garantir as eleições em Alagoas. O 20º BC permanecia de prontidão com a tropa organizada para ser distribuída nos municípios. Havia um problema: não existia viatura suficiente para o deslocamento imediato dos soldados para todo Estado. O coronel Mário Lima requisitou caminhões, camionetes que passavam em frente ao quartel; embarcaram todos os soldados para o interior. O Exército garantiu a eleição. Apurados os votos, Arnon teve 56.962 votos contra 36.338 de Campos Teixeira. O general Góes Monteiro candidato a senador, pensou ser uma eleição fácil para ele, não fez campanha, perdeu para um médico, obscuro político de Sertãozinho (hoje Major Izidoro), Ezequias da Rocha.
No mês de novembro, em uma inspeção do general comandante da 7ª Região à guarnição de Maceió, o coronel Mário Lima acompanhou o general comandante em visita de praxe ao governador. Depois da rápida conversa quando retornavam pela sala, Dona Constança, mãe de Silvestre, sentada em uma cadeira de balança, provocou: “Esse Exército de merda fez meu filho perder a eleição”. Os militares fingiram não ouvir. Sorrindo desceram as escadas do Palácio dos Martírios.
Fragmento histórico fantástico, Carlito.
Lido de um fôlego só.
Vou copiar o link e espalhar pelo oco do mundo.
Os sessenta e dois votos de Graciliano me atormentando o quengo.
Obigado Jesus.
Carlito, grato pela aula. Valeu.
Obrigado Antônio. Eu fui testemunha ocular da história.