Lua cheia
O jornalismo nos impulsiona às aventuras e desperta vontades inexplicáveis. Tudo por um furo, uma novidade. Nos tornamos perdigueiros sem que percebamos. E nessa busca, abandonamos o bom senso, os cuidados básicos com a vida e buscamos freneticamente as reportagens mais empolgantes.
Em 1968, ocupando cargo que ainda não existia no Banco do Brasil – Assessor de Imprensa – eu costumava cobrir inaugurações de agências pelo interior de Pernambuco, compensando meus custos com patrocínios da clientela local. Algumas vezes ultrapassava os limites e enfrentava distâncias maiores, no afã de reportar para o Diário de Pernambuco, acontecimentos que julgava importantes. No fundo, porém, estava também as perspectivas de contratar publicidade.
Os patrocínios eram o suporte para as despesas e o lucro de cada empreitada. Não raro era possível enfrentar distâncias maiores para exercer as duas atividades extra-bancárias: o jornalismo e a publicidade. Naquela vez acertei que cobriríamos a inauguração do novo prédio do Banco do Brasil em Aracaju e meti-me na estrada. Nada menos que 500 quilômetros de chão, partindo do Recife.
O momento da solenidade seria às 11 horas e partimos, no meu Fusca, ao amanhecer. O companheiro era o primo Roberto, também foca de jornalismo, membro de minha equipe. Gravamos os discursos, fotografamos os personagens e acertamos a publicidade. Às 17 horas fomos almoçar, e “pé na estrada” novamente, satisfeitos por estar finda a missão e com êxito.
Mal repousamos e já começamos a retornar. Nosso desejo era chegar no Dia dos Pais. Lá pelas 19 horas jantamos em Arapiraca e tocamos novamente. Aí começa o fuzuê.
Roberto pede o volante para que eu repousasse um pouco. No “retão” da estrada, em noite clara, vejo uma lua-cheia do meu lado. Ficou “paradona” um bocado de tempo. Mostrei ao motorista. Ficou admirado. Tempo depois, sem dar uma única curva, a lua aparece do lado esquerdo. Pensei que tivesse ficando maluco, ou como dizem os matutos quando o cidadão perde o juízo: fiquei aluado; ou seja, sob influência da lua.
Ambos ficamos, de fato, meio surpresos. Depois a lua desapareceu e pelo retrovisor notei que ela estava “paradona”, aparecendo novamente, desta vez no vidro posterior do carro. Bem, aí ficamos seriamente preocupados. Logo surgiu o pensamento que seria um Disco Voador. Pensamos simultaneamente na mesma coisa
Aí já veio o arrepio. A coisa estava ficando preta.
No exato momento em que eu estava dando um cochilo, fui acordado por um clarão ofuscante. Logo veio um terrível sopapo. Senti o corpo embolar e acordei fora da estrada. O carro havia capotado.
Depois do susto, notamos que a capota estava quase nos espremendo. Toda amassada. Suspiramos e saímos para ver o estrago. Roberto, ainda tremendo e todo urinado. disse:
– Fomos encandeados por algum caminhão!
Nosso carro após o acidente
Saímos para ver o estrago. Um carro novo seriamente danificado. Abri o motor e estava intacto. Passei uma flanela no carburador para verificar possível vazamento de combustível e nada. Uma das rodas da frente estava presa pelo paralamas. Tirei a mão-de-força do capô e soltei o pneu. Liguei e o motor funcionou normalmente.
Roberto acocorado chorava tremendo muito e todo urinado.
– Acabei com seu carro, primo!
Nisso surge um senhor, morador de um morro das proximidades e se ofereceu para nos ajudar. Fumava em seu terraço quando viu o clarão e o carro embolou duas vezes pela estrada. Nos disse que não viu caminhão nenhum nos ofuscando.
Saímos sem um arranhão sangrante. Apenas algumas pancadas, mas sem fraturas. Ficamos pensando: se não foi um veículo grande que causou o acidente, foi mesmo um Disco Voador, ou estamos mesmo amalucados. Certamente nos sentimos dois aluados.
Parece que esse disco voador tem nome: sono.
🤣🤣🤣🤣🤣
Mas o diacho é que o DV apareceu de todos os lados do carro. Depois disso, meses passados, comecei a perder os sentidos no meio da rua, fui há vários médicos daqui e me mandaram para a Beneficência Portuguesa. Nada acharam. Acho que bati com o chifre na capota. Hoje, tudo normal. Mas, peguei a mania de entrar na rota dos Discos Voadores, dos sonhos, anotava tudo, numerava, fazia estatística e hoje tenho 2.230 bem colecionados, aguardando tempo para escrever um livro. Vou preparar uma síntese para publicar no JBF. Passei a ser um sonhador inveterado. Você verá isto. Obrigado pelo pitaco, aliás, inteligentíssimo, e perdoe a demora na resposta.
Um abração, amigo.
Carlos Eduardo