Santa Luzia, cadê tu?
Não sou esses balai todo, sou meio disleriado”, mas sábado eu amanheci decidido a por em prática um plano religioso.
É assim: 12 de dezembro, pensei, é véspera do dia de Santa Luzia e, como eu ando com às vistas meia “rumbuda”, comecei o dia emendando pavios de velas e passei uns minutos frente ao fogaréu com meus joelhos alquebrados deitados sobre o cimento frio e antiderrapante da minha choupana, rezando e procurando uma maneira de engabelar a santa.
Na verdade, tudo isso deriva do fato dos meus óculos encontrarem-se em petição de miséria, me deixando sem condições de apreciar, também, a minha amada literatura de cordel e o corrimento desta gazeta fuleira.
E pedia: Santa Luzia, minha idolatrada santa, padroeira dos cegos e seus guias, olhe meus olhos, eles estão embasados, quase tapados, cataratados. Me ajude aí, na vaquinha pros meus para-brisa que eu lhe “agarântio” pavios acesos até o final do ano, me ampare que eu sustento o fogo na pira.
À noite, desencavei do baú uns trapos seminovos, naftalinizaos, meti o brasante com o fundo de metal brilhante no linho, me enfatiotei, caprichei no desinfetante suvacal, me excedi no istrato de litros comprados na feira, escovei a carapinha e parti no rumo da capela, e foi aí, em lá chegando, que a minha devoção foi pro beleléu.
Quando me aprocheguei da entrada do templo vi no andor uma imagem diferente, sem a bandeja cuns zóios dentro sem nada.
Destravei a língua enrolada pelo choque e perguntei ao distribuidor de Álcool 70: Zifio, cadê a estátua de Santa Luzia? Venho de longe em missão de promessa para assistir missa, comer hóstia, pagar dízimo e tudo.
E ele: meu senhor eu acho que o senhor se enganou, está correndo missa, sim, mas em homenagem a Nossa Senhora de Guadalupe.
“Voltei pra casa triste demais, o que a santa fez não se faz”.
Depois pensei: menos mau, pior que isso, quem sabe o que eu passei no Panamá deve estar dando gaitadas e dizendo ser eu um homem de sorte.
Moral da história: fiquei sem óculos e sem fé.
Dedé Varella, o Basileu do Manicômio.
Obrigado, Berto, pela publicação…