CARLITO LIMA - HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA

Antigamente, na minha juventude, um idoso de 60 anos ficava numa cadeira de balanço esperando a morte chegar. Hoje a medicina e o trato com o corpo faz com que um velho de 82 anos, como eu, ainda esteja peleando, escrevendo romances, administrando eventos culturais, caminhando com certa dificuldade no calçadão da praia da Jatiúca apreciando as mais belas bundas passarem. Gosto da modernidade, não vivo sem minha televisão, sem meu computar, nem o celular. Porém, o modernismo trouxe o detestável patrulhamento, o “Politicamente Correto”. O adolescente que ainda levo em minha alma é irreverente, meio anarquista, politicamente incorreto e se choca com essa vigilância globalizada.

Durante minha juventude, fizemos muitas presepadas, éramos maloqueiros das ruas de Maceió. Com o amadurecimento nos aquietamos, o conhecimento adquirido através do tempo, nos tornaram pacatos cidadãos, como meu querido amigo, Ulisses Ávila, Chumbinho de apelido, agrônomo, diversos cargos de relevância no Estado de Alagoas, hoje cidadão pacato que leva sua vida administrando a idade provecta. Conhecendo aquele educado senhor, ninguém dirá que foi um dos jovens mais irreverentes de minha juventude na cidade de Maceió.

Naquela época era costume organizar times de futebol juvenil nos bairros. Na Avenida da Paz, foi criado o Atlântico Futebol Clube. Em cada bairro havia um time. A turma do Farol, liderada pelo Cláudio Oiticica e o Chumbinho, criou o Palmeira Futebol Clube. A sede ficava próxima à Rua Comendador Palmeira. Tinha excelentes jogadores, chegou a disputar o campeonato alagoano de futebol juvenil. Para manter a forma física, estabeleceram dois treinos na praia durante a semana. Às cinco horas da manhã nos dias de treino, a juventude do Palmeira descia o bairro do Farol para treinar na praia. Depois de muito correr, tinha a compensação, cada jogador ganhava um pão. Essa ideia partiu do Diretor Ulisses Ávila. Perguntaram com que dinheiro ele compraria o pão. Respondeu que deixasse com ele. Enquanto os jogadores desciam à praia às cinco da manhã, as sacolas de pão já haviam sido jogadas nos terraços das casas.Chumbinho com um comparsa, na maior desfaçatez, pulava o muro baixo da entrada da casa e pegava a contribuição do morador, uma sacola de pão para o time. Alguns moradores desconfiaram e mandava comprar o pão da manhã numa padaria, levava na brincadeira.

Mas um Doutor ficou revoltado, colocou um cachorro no jardim. Quando Chumbinho apareceu, foi derrotado pela brabeza do cachorro. Numa véspera de um treino Chumbinho e amigos estavam sentados no banco da praça quando notou uma cachorra vira-lata no cio e seis cachorros querendo cruzar com ela. Chumbinho se aproximou com um saco conseguiu levar a cachorra e a deixou amarrada em seu quintal. Dia seguinte cinco horas da manhã desceu para o treino com os amigos do Palmeira, levando a cachorra magra embrulhada em um saco. Ao passar na casa do Doutor percebeu o cachorro bem ao lado da sacola cheia de pão, ao aproximar-se o cachorro começou a latir, Chumbinho sacudiu a cachorra no cio dentro do quintal longe da sacola de pão. O cachorro com o olfato apuradíssimo correu e ficou cheirando, cheio de desejo, as partes íntimas da cachorra no cio. Chumbinho rapidamente pulou o muro baixo e trouxe a sacola cheia de pão. Foi aplaudido pelos colegas. O Doutor fez a reclamação aos pais dos jovens jogadores do brilhante Palmeira.

Certa vez, o Colégio Guido organizou uma corrida pelo centro de Maceió. Capixaba um amigo querido, líder entre os jovens, cheio de maloqueiragem, jogava pelo Palmeira. Era um atleta e se preparou para a semi maratona. No grande dia da corrida alguns amigos foram à Praça Deodoro torcer pelo Capixaba, levaram um buquê de flores silvestre para homenagear Capixaba, bem cotado para ganhar a corrida. A chegada era em frente ao Cine São Luiz na Rua do Comércio. Os amigos ficaram na Praça Deodoro passagem obrigatória já no final da corrida. De repente apareceu ao longe o vulto do atleta que liderava a corrida, era Capixaba que foi se aproximando se afastando cada vez mais do segundo lugar. A turma gritava torcendo: Capixaba! Capixaba! Quando o atleta, virtual campeão, passou pela estátua do Marechal, os amigos: João Moura, Mazo e Chumbinho correram abraçando Capixaba entregando a pulso o buquê, gritando è Campeão, é campeão. Capixaba quis se desvencilhar para continuar a corrida, mas os três amigos o abraçava, nisso passou o segundo lugar que foi o vencedor e mais toda tropa. Capixaba ficou na Praça Deodoro, não terminou a corrida. Chumbinho e amigos às gargalhadas, abraçados a Capixaba, foram tomar cerveja no Bar Suez do Tadeu Vasconcelos.

Assim era nossa juventude, politicamente incorreta, divertida e irreverente. Até hoje o Cláudio Oiticica e Chumbinho organizam um encontro anual dos amigos do Palmeira com os que sobraram daquela turma. Chumbinho é um senhor pacato e aposentado. Por muito tempo na vida foi um dos mais ligados assessores de Guilherme Palmeira um dos maiores homens públicos do Estado.

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