JOSÉ DOMINGOS BRITO - MEMORIAL

Marie Rennotte nasceu em 11/2/1852, na Bélgica. Pedagoga e médica, veio para o Brasil aos 26 anos e foi naturalizada brasileira em 1889. Radicada em São Paulo, em fins do século XIX, foi uma das primeiras médicas obstetra e ginecologista e pioneira da medicina social no Brasil, além de pioneira, também, no incipiente movimento feminista na virada do século XIX para o XX.

Diplomada professora em Paris (1874), lecionou na Alemanha por 3 anos e veio com a família para o Brasil em 1878. No Rio de Janeiro foi professora até 1882 e mudou-se para o interior de São Paulo. Foi lecionar no Colégio Piracicabano, um inovador internato feminino, onde adotou métodos inovadores positivistas e evolucionistas baseados numa pedagogia ligada a Rousseau, Pestalozzi, Froebel, Comte e Spencer. Para isso teve o apoio de grupos progressistas: liberais, republicanos, maçônicos e abolicionistas, em especial dos irmãos ituanos Morais Barros (Manuel e Prudente, futuro presidente da República). O sucesso da escola despertou o ciúme das Irmãs de São de José, mantenedoras do Colégio de Nossa Senhora do Patrocínio, de Itu, que passam difamar as professoras da nova escola. Em sua defesa, a profª Rennotte publica artigos na Gazeta de Piracicaba e jornais da capital manifestando sua oposição às práticas obscurantistas e retrógadas vigentes no ensino tradicional, pregando uma educação feminina, necessária à emancipação da mulher.

Tais artigos levaram-na a colaborar com Josefina Álvares de Azevedo, na publicação de matérias doutrinárias no jornal feminista A Família, a partir de 1888. Assim, passou a fazer parte de uma plêiade de jovens intelectuais reunidas em torno do jornal: Anália Franco, Zalina Rolim, Narcisa Amália, Júlia Cortines, Revocata Heloísa de Melo, Maria Clara da Cunha Santos, Prisciliana Duarte de Almeida, Inês Sabino e Júlia Lopes de Almeida. Em 1889 viajou para os EUA para estudar medicina e permaneceu por 3 anos, enquanto seu amigo Prudente de Morais acelera a carreira política, torna-se integrante de junta republicana provisória e torna-se o primeiro presidente do Estado de São Paulo.

Em sua curta gestão (1890-91) e inspirado nas experiências pedagógicas do Colégio Piracicabano, ele deflagra radical reestruturação do ensino paulista. Tendo como executores iniciais os médicos Caetano de Campos e Cesário Mota, a reforma será implementada pelos governos estaduais subsequentes. Em 1892 graduou-se médica pela Woman’s Medical College of Pennsylvania. De volta ao Brasil, foi 1ª médica na capital paulista. Em 1893 foi à Paris visando se especializar em ginecologia, obstetrícia e neonatologia, com estágios nos hospitais parisienses Hôtel-Dieu e Saint Louis. Na época seu amigo Prudente de Morais foi eleito presidente da República, na gestão de 1894-98. Volta para o Brasil em 1895 e fixa-se no Rio de Janeiro, obtendo a validação do seu diploma francês. Para isso, foi submetida a uma banca examinadora com a tese Influência da educação da mulher sobre a medicina social. De volta à capital paulista em meados do ano, foi admitida na recém-instituída Sociedade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, dirigida pelo cirurgião Luís Pereira Barreto.

Na capital paulista, em franca expansão, passou trabalhar no atendimento às mulheres mais abonadas, a domicílio e no consultório, e às desfavorecidas em ambulatórios e enfermarias hospitalares. Sua participação com artigos na imprensa foi ampliada, como o apoio que deu à profª Leolinda Daltro, em 1896, em sua proposta de assistir os povos indígenas ameaçados de extinção. Foi marcante sua atuação no periódico A Mensageira, revista literária dedicada à mulher brasileira, dirigida pela poeta Prisciliana Duarte de Almeida. Com seu envolvimento na vida cultural e política da cidade, foi a primeira mulher admitida no IHGSP-Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, em 1901. Pouco depois tornou-se sócia efetiva da Associação Médica Beneficente de São Paulo, presidida por Arnaldo Vieira de Carvalho, em 1905.

No mesmo ano recebeu o diploma de sócia benemérita do Asilo e Creche da Associação Feminina Beneficente e Instrutiva, fundada e dirigida por sua amiga, a pedagoga espírita Anália Franco. Quando foi oficializada a Cruz Vermelha Brasileira, em 1908, comandada por Pérola Byington, a entidade teve Oswaldo Cruz como presidente de honra e a Dra. Rennotte como organizadora da regional paulista. Em 1918, durante a gripe espanhola, trabalhou intensamente no socorro aos paulistas. No levante militar tenentista de 1924, a cidade foi sitiada e teve cerca de 500 mortos e 5000 feridos. A Santa Casa ficou lotada com mais de 3 mil pessoas, e ela teve que comandar uma enfermaria improvisada nas dependências do antigo Teatro Colombo, no Brás.

Em 1929 proferiu concorrida palestra no IHGSP, sobre “A mulher brasileira na história”, lembrando a figura de Joana d’Arc, contrapondo-a com heroica atuação de Anita Garibaldi e Ana Néri. Pouco depois, na Revolução Constitucionalista de 1932, aos 80 anos já não podia atuar e foi substituída por sua jovem colega Dra. Carlota Pereira de Queiroz, que se coloca a frente da Cruz Vermelha no atendimento ao grande número de feridos. Em meados da década de 1930, ela encontra-se muda, quase cega e desprovida de recursos para se manter. Em decorrência de uma campanha para ajudá-la, coordenada pelo jornalista Mario Guastini, o interventor paulista José Joaquim de Melo Neto concede-lhe uma pensão mensal equivalente a mil cruzeiros para uma manutenção condigna.

Faleceu em 21/11/1942, em plena II Guerra Mundial, foi sepultada no Cemitério da Consolação e recebeu a gratidão e homenagens da Cruz Vermelha Brasileira e do IHGSP, que realizou sessão solene em 2001 comemorando o centenário de admissão da ilustre médica no Instituto, onde é mantido seu arquivo. Biografia ainda não temos, mas contamos um alentado artigo publicado na revista História, Ciências e Saúde, da Fiocruz, (vol. 10, nº 2) de agosto de 2003, publicado por Leonora De Luca e João Bosco Assis De Luca em 2003, disponível na Internet: Marie Rennotte, pedagoga e médica: subsídios para um estudo histórico-biográfico e médico-social

3 pensou em “AS BRASILEIRAS: Marie Rennotte

  1. Excelente homenagem, meu caro bibliográfico, por esse retrato irretocável de Marie Rennotte, estudiosa de duas áreas sensíveis à humanidade: medicina e educadora.

    Peguei uma gripe da porra que me dói até os ossos.

    Forte abraço e bom dia.

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