JOSÉ DOMINGOS BRITO - MEMORIAL

Gilda de Abreu nasceu em Paris, França, em 23/9/1904. Cineasta, radialista, escritora, atriz e cantora. Ganhou medalha de ouro com o canto lírico, mas o que queria fazer mesmo era teatro, algo proibitivo para uma família burguesa da época. Porém, dedicou-se ao cinema, realizou 6 filmes incluindo O Ébrio em 1946, campeão de bilheteria, e atuou como atriz em algumas peças e operetas, como roteirista e na literatura como escritora.

Filha da cantora lírica Nícia Silva de Abreu e do médico e diplomata João de Abreu, esteve no Brasil aos 4 anos e aos 10 passou a viver no Rio de Janeiro. Teve os primeiros estudos em Paris e foi educada em colégios da elite carioca. Em 1922, aos 18 anos, ingressou no Instituto Nacional de Música e formou-se em 1927 em canto lírico. Em 1933 estreou a primeira opereta, A Canção Brasileira, e escreveu um ato “A princesa maltrapilha”, acrescido a opereta.

Neste ano casou-se com o cantor Vicente Celestino, com quem contracenou A Canção Brasileira, e não tiveram filhos. Pouco depois estreou no cinema com o filme Bonequinha de seda, em 1936, dirigido por Oduvaldo Vianna. Um filme visto como ponto de retomada dos filmes de qualidades feitos no Brasil. Foi visto por mais de 200 mil pessoas e exibido nos países do cone sul e em Portugal. Na década de 1940, com o sucesso das radionovelas, passou a escrevê-las para a Rádio Nacional (“Mestiça”, “Aleluia”, “A Cigana”, “Pinguinho de gente”), e Radio Tamoio (“Alma de palhaço”). Em 1945 começou a trabalhar no filme, do qual foi diretora, “O Ébrio” com Vicente Celestino, um dos filmes mais visto da história do cinema brasileiro. Foi a terceira mulher a dirigir um filme no Brasil.

Hernani Heffner, da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, testemunhou a emoção do público na faixa dos 60 e 70 anos. “Quando você vê o filme numa sala grande e todo mundo começa a soluçar, é um acontecimento… De fato, O Ébrio calou fundo no coração das pessoas.” No entanto, a autora do filme ficou pouco conhecida, ofuscada pela fama de Vicente Celestino, que além de protagonista do filme era compositor e intérprete da canção que inspirou o roteiro. Pouco depois, junto com o marido, abriu a “Companhia Vicente Celestino e Gilda Abreu” e passou a dedicar-se mais a carreira de autora teatral.

Em 1944 escreveu a peça “Olhos de Veludo”, em parceria com Luiz Iglesias e retornou ao cinema, em 1951, dirigindo o filme “Coração Materno”, outro filme extraído de uma música de Vicente Celestino. O filme não foi tão bem sucedido como “O Ébrio” e ela passou a se envolver com a escrita de poemas, radionovelas e roteiros. Durante longo tempo foi empresária do marido e não há dúvida que o sucesso popular alcançado pelo tenor foi decorrente de sua potente voz. No entanto, atribui-se a ela um papel fundamental na carreira artística do marido, agenciando contratos e apresentações.

Em 1968 Vicente Celestino faleceu de um infarto fulminante e em 1977 ela filmou “Coração de Amor”, um curta metragem em homenagem ao falecido marido. Em seguida casou-se com o prof. José Spinto e fundou o Centro Cultural Artístico Nícia Silva, em homenagem a sua mãe. Em maio de 1979, aos 75 anos, foi internada numa clínica e veio a falecer, vitimada por uma trombose cerebral, em 4/7/1979. Além da produção literária, Gilda atuou como atriz em dois filmes e como diretora em seis filmes numa época bem mais patriarcal do que hoje, onde poucos acreditavam que uma mulher pudesse dirigir uma equipe cinematográfica.

Numa entrevista à imprensa, contou ter usado calças compridas, algo pouco comum para mulheres da época, na tentativa de ser respeitada pelos técnicos. Pouco antes de falecer, publicou o livro Minha vida com Vicente Celestino, uma biografia focada mais na vida do marido. Num momento de saúde frágil, sentiu que “ainda era necessário viver” para cumprir a promessa que fizera no altar: “Elevar Vicente ao lugar que merecia ocupar”. No lugar de uma biografia sua, temos uma dissertação de mestrado de Lucilene Pizoquero: “Cinema e gênero: a trajetória de Gilda de Abreu (1904-1979)”, defendida na UNICAMP-Universidade Estadual de Campinas.

4 pensou em “AS BRASILEIRAS: Gilda Abreu

  1. Muito bom, Brito. Mais um extraordinário resgate de uma biografia personalíssima e valorosa que a história insiste em deixar à sombra do marido genial.
    Obrigado. Abraço

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *