FERNANDO ANTÔNIO GONÇALVES - SEM OXENTES NEM MAIS OU MENOS

Num almoço cabidelístico, sem máscaras, caprichado, no alpendre do João Silvino da Conceição, repleto de louras suadíssimas e muita risadagem, consequência de anedotas para maiores de sessenta anos, uma mocinha da redondeza, chegada a um pescoço de galinha de capoeira, embora distanciada da filha da patroa do anfitrião por questões existenciais – só gosta de trabalhar deitada e de pernões sempre para cima – indagou ao dono da casa se ele possuía amizades de gente grande.

O Silvino, percebendo que o interesse era mais comercial que investigatório, não se fez de rogado e se pronunciou alto e bom som: – Menininha, a amizade é a coisa mais importante que a gente pode ter, depois da Fé no Homem, aquele pregador muito arretado de ótimo, que de Nazaré se fez Senhor, a partir da flagelação e morte no madeiro.

Recebendo entusiásticos aplausos dos da comunidade ali presente, o João resolveu eleger um dos amigos como protótipo de fina flor, explicitando seu pensar, ao invés de enumerar sua trajetória histórica. E mandou ver:

– Gente amiga, dentre os meus amigos de fora do Recife, escolher um daqui daria um fuzuê dos infernos. Gostaria de colocar no pódio o notável Edgar Morin, um centenário arretado de ótimo, pensante francês na ativa, um gota serena, que outro dia foi homenageado, no Brasil, com o livro EDGAR MORIN, HOMEM DE MUITOS SÉCULOS: UM OLHAR LATINO-AMERICANO, Elimar Pinheiro do Nascimento, Maurício Amazonas e AlfredoPena-Veja (orgs), São Paulo, Edições SESC, 2021, 360 p. E o que parecia ser um sarapatel daqueles, os mini-ensaios provocaram uma baita binoculidade existencial, de fazer gosto aos mais desassistidos intelectualmente que nem eu, que sou muito peba, se comparado com o notável Zé Paulinho Cavalcanti Filho, por exemplo, aquele talento pernambucano ouro de lei, que se faz sempre presente nos meios mais cultos da capital pernambucana, atualmente debaixo de muita chuva, assustando os irmãos dos córregos, morros e alagados.

Os textos sobre Morin revelam o seu pensar sempre lúcido, a favorecer um novo humanismo para um mundo pós pandemia, onde todos possam ter vida e vida em abundância, desapetrechando-se em definitivo dos paradigmas superados dos ontens que não mais retornarão, salvo sob viéses mais condizentes com as exigências de um contexto planetário mais fraterno e distributivista. E disse mais o Morin: “Um dos principais fatores de estresse hoje é o paradoxo entre o ritmo alucinado das comunicações, que nos trazem fatos e mensagens em tempo real, e as limitações de nossa mente e de nosso corpo.”

Entendamos, como Edgar Morin, que a ciência é filha da verdade e não da autoridade. E que pelo fato de não entender isso pelos caminhos de um efetivo diálogo, inúmeros assassinam milhões, rejeitando um monte de estudos comprobtórios. E Morin ainda faz um alerta bastante necessário para os que continuam lendo pouco: “Deve-se ter cuidado para não querer transformar nossas mais recentes descobertas em monumentos petrificados.”

Dona Conceição, mulher do Silvino, sete arrobas bem distribuídas e com ainda muito reduzida elasticidade mamária, setentona experiente, mente livre e sempre solta, nenhuma flacidez abdominal, muitos quilômetros bem dados, serenidade lindona, sem as louracidades artificiais que só raciocinam rabolatricamente, resolveu encerrar o falatório do João Silvino, declarando que tinha muita Fé e que sua Fé tinha dados bons frutos, cada um deles fundo, forte, farto e fértil, arrancando ânimos gerais, ampliados pela chegada de mais uma rodada cabidelística, desta vez acrescentada de uma farofa de deixar caveira babando de inveja.

Sentado na ponta da mesa com a Sissa, agradeci ao Chefe conhecer a turma do João Silvino da Conceição. Família sem lero-lero, nem fuxicaria, cada um sabendo seu samba de cor, a esperança toda calibrada num Brasil que chegará lá, apesar dos chupa-cabras adesistas que se fingem de alavancadores de primeira hora, quando não passam de oportunistas disfarçados de salvadores de um Estado que necessita urgentemente abandonar sua condição de país sempre do futuro. Bem muito antes de, sem soberania alguma, se findar no brejo, onde tudo vai dar mel…

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