ROQUE NUNES – AI, QUE PREGUIÇA!

Nos últimos vinte e oito dias aqui em Pindorama, neste ano de 447 d. S. (depois de Sardinha) tenho assuntado as fofocas mais quentes que os arariboias de plantão e o bando de caciques falam sobre a Taba grande. É cada despautério que às vezes penso que bebi cauim demais, ou fumei casca de jequitibá, em vez de fumo de corda. O mais interessante nessas conversas sem futuro é que, quanto menos se entende de um assunto, mais opinião com profundidade se dá sobre ele. Profundidade que quase chega a molhar a sola do pé, mas com uma ênfase que chega a encher os olhos de lágrimas e de ufanismo o curiboca nacional.

O assunto mais em pauta, que eu acompanhei, pratrasmente de duas semanas foi o tal Mercado. Ah!, que o Mercado é mal, só pensa em arrancar dinheiro dos pobres, que é impatriota, que investe na miséria de quem veve de comer calangro e farinha de puba, que só tem interesse no lucro, sem se importar com os 120 milhões de famintos que existem em Pindorama.

Mas, afinal de contas, o que é esse Mercado draculesco? Para um desavisado pode parecer a reencarnação do senhor Hide, o mesmo o monstro do doutor Frankstein que se levantou das trevas, com seu olhar cúpido sobre os caraminguás que tupinambás ainda guardam em seus picuás e bocós amarrados na cintura. Maurício Assuero, grande Potiguara que é versado em numerários, contas, finanças e dinheiros, acredito eu, fica até com urticária quando um pseudo pajé vem falar sobre esse tal Mercado e não entende “niente” do que está falando.

Adam Smith, com uma paciência de Jó tentou explicar aos habitantes da grande taba chamada planeta Terra o que vem a ser esse tal de Mercado e como as nações se enriquecem, tentando apontar o seu dedo para as causas e as origens da riqueza das nações. Obviamente, depois de mais de duzentos anos, os conceitos evoluíram, mas o cerne continua o mesmo. Mas, ainda não nem cheguei a dizer que diabos é esse tal Mercado.

Primeiro ponto. Mercado é e não é aquele lugar onde a indiaiada vai fazer compras todos os dias, toda a semana e todos os meses. Digo que não é, porque seria reduzir muito o conceito a apenas algo palpável. Mas também é, já que é uma engrenagem de uma máquina com milhões de outras engrenagens que percisam se movimentar em conjunto para que a sociedade funcione.

O conceito da palavra Mercado, infelizmente está deturpada em Pindorama. Quando se ouve agentes do governo falarem em mercado, botam no chifre dessa palavra o adjetivo financeiro. Assim, para o leitor pouco coisa menos bidu, seria mercado apenas um grupo seleto de pessoas engravatadas, nos desvão de bancos, de empresas de investimentos, de corretoras, com garfos e facas nas mãos, e pagando latagões a serviço da bolacha, para afastar os demais caetés e eles ficarem com as melhores partes do Sardinha, e não querendo deixar nem os ossos e cartilagens para os demais.

Essa visão emburrecedora e safadista foi criada e amamentada nos desvãos de universidades e escolas de economia e martelada nas escolas de educação básica a fim de que o Bororo nacional tivesse ojeriza a essa palavra e a tudo o que ela significa, enquanto aqueles que sabem o seu real significado ficam ricos e bamburram operando nesse tal Mercado.

Pare e pense, meu caro curiboca nesse tal mercado, e se questione: você faz parte desse Mercado? Sem necessidade de titubear eu te respondo: Sim. Você faz parte dele. Pense assim comigo. Dona Januária, lá do interior da Paraíba, ou mesmo Nhá Velina, socada no interior do Pantanal, sem energia, sem água encanada, sem televisão, sem telefone celular, mas ambas têm um gosto em comum. Ambas gostam de naquear um pedaço de tabaco todos os dias, o popular mascar fumo. Todo mês elas vão até um armazém e compram um pedaço de meio metro de fumo de corda e vão para as suas casas. Pode parecer um gesto simples, quase desimportante. Mas, o fato é que não é.

Pense que aquele pedaço de fumo precisou ser plantado em algum lugar. Quem o plantou precisou arar a terra, adubar, semear o tabaco, cuidar do seu crescimento, aplicar os defensivos – o que os aiatolinhos do politicamente correto chamam de agrotóxicos -, colher, secar, enviar para a indústria de transformação, que por sua vez também faz movimentar outras engrenagens como a fornecedora de energia, da água, dos insumos aplicados no beneficiamento daquela folha de fumo. Depois a distribuição que movimenta outras engrenagens como transporte, combustíveis, a indústria alimentar, até chegar no buteco onde dona Januária, ou Nhá Velina compraram seu pedaço de fumo para mascar durante o mês.

Isso apenas em um pedaço de fumo de corda. Agora pense em uma criança que gosta de jujuba e os pais lhe dão um saquinho toda a semana. Como será que aquela guloseima chegou até às mãos daquela criança. Pensem onde ela se originou, quais as indústrias que participaram direta e indiretamente na confecção daquele doce. Eu sei, parece coisa de maluco, mas é assim que esse tal Mercado funciona.

Agora volte ao mercadinho do bairro e pense em cada produto que está exposto ali. Quantas outras indústrias, produtores, atravessadores, atacadistas, transporte, armazenamento, controle de qualidade e sanidade foram movimentados para que você, meu caro caeté pudesse chegar e pegar um pacote de biscoito na prateleira e saísse comendo despreocupadamente.

Mas esse exemplo é apenas uma faceta desse tal Mercado. Agora pense. Tudo o que você faz. O coletivo que você pega, o tanque de seu carro que você abastece, a roupa que você compra, o dinheiro vadio no seu bolso e que você resolve depositar em um banco, o seu FGTS, essa estrovenga malandra criada para tomar na mão grande o seu dinheiro, a sua poupança, o dinheiro que você pede emprestado em um banco, o empréstimo que você faz a um parente, ou a um amigo, a reforma de sua casa, o material escolar que todo ano você compra para seus filhos. Tudo isso faz parte do que se chama mercado, pois essas ações movimentam engrenagens que possibilitam que esses bens cheguem às suas mãos.

Mas e o Estado não seria parte desse Mercado? A resposta mais límpida possível é NÃO. Estado não produz, não gera riqueza. Ele apenas toma a riqueza de quem produz. E como Pindorama possui um Estado inchado, cada vez mais ele precisa tomar riqueza de quem produz. Veja que em Pindorama 97% do orçamento público vai para despesas como pagamento de aposentadorias, de bolsas, de salário de funcionários. Obviamente que, lá na ponta esses aposentados e assalariados do Estado também vão movimentar as engrenagens do Mercado, mas o dito momentum de maior força das engrenagens já se dissipou.

E o Estado toma o dinheiro de quem produz e faz a engrenagem do Mercado se movimentar de duas formas: através de impostos, contribuições e tributos, ou através da emissão de título de dívida pública. Como Pindorama é uma taba em que se gasta mais do que se arrecada, o Estado veve lançando títulos da dívida pública com juros cada vez maiores para que alguém tenha interesse em comprá-los. Só que esse dinheiro não vai para a produção. Ele não vira uma força motriz que movimenta essas engrenagens. Mas, como oferece gordos retornos, então o dinheiro é sugado dessa movimentação e vai para outros fins, não descontando o desvio, a safadagem, a roubalheira e outros etcéteras. Afinal ninguém é burro para deixar dinheiro vadio no fundo do gavetão, quando se pode ganhar outros tantos, sem fazer absolutamente nada. Apenas esperando o Estado devolver o que pegou de você mais os juros.

Quando eu ouço falar em mercado, sempre com o adjetivo “financeiro” atarrachado nos cornos dele eu tenho um pensamento pendular: ou essa gente é muito burra e fala daquilo que não sabe, ou e esperta demais e fala muito bem daquilo que sabe e está tentando enganar a patuleia. Como não sou de me deixar enganar por papel pintado, sempre vou na segunda opção. São pessoas que sabem muito bem o que estão falando, mas estão dando um passa moleque na taba toda para lucrar e muito.

Assim, meu caro caeté, quando você ouvir qualquer curiboca falando sobre mercado, faça igual a mim. Fico pubo por dentro, fofo igual a lá de carneiro. Deixo o indivíduo falar, afinal isso é de seu ofício e depois vou cuidar de minha vida, dando uma banana para o falastrão que veio tentar me engrupir.

11 pensou em “AH! MERCADO

  1. Caramba!!!! E o doutorado desse Caeté não é em economia. Haddad estudou dois meses de economia pra passar na anpec. Perdeu essa aula de Roque!!!!! Fico puto mesmo com as distorções, mais puto do que Sancho, Dr Honoris com coco, quando botam um acento circunflexo em qualquer um desses “o”s…. Valeu Caeté

    • “Gardecido” meu caro Maurício. Diletantismo de um caeté que deve estar entre os 120 milhões de famintos da nossa ministra aparentada com extraterrestre.

  2. Tai um texto pra se copiar e…gravar pra explicar aos doutos ou simples mortais, a cadeia ou efeito cascata que um produto provoca na tal engrenagem “mercado”, Seja ele industrializado ou até artesanal.

    Parabéns, mestre Roque!

  3. Quem entende, entende. Quem não entende vira até ministro.
    Meu guru Roque, entendedor de todas as costelas e cartilagens do Reverendíssimo Sardinha, melhor aula não poderia ser dada. Apesar de simples e clara, não tenho certeza de que a mente microscópica de um Hadad poderia entender uma unha sequer do que foi dito.
    Um grande abraço, bom final de semana e um bom pacú com banana da terra.
    Magnovaldo

    • O pacú será bem vindo… até me deu água na boca. Mas, sardinhisticamente, me caro Magnovaldo, deixar a economia nas mãos de um completo incapaz é o melhor caminho para adiantar a tragédia que se arma sobre Pindorama.

  4. Adorei o “pratrasmente”, Roque, que me lembrou “Odorico Paraguaçu, personagem criado por Dias Gomes, e vivido por Paulo Gracindo no antigo programa O Bem-Amado, da TV Globo.

    De mercado, só entendo o que se passou “pratrasmente”, pois há 56 anos, “tocaram fogo” no Mercado Público de Natal, num ato criminoso, pondo fim à fonte de renda de comerciantes, donos de locais, , que dali tiravam o sustento de suas famílias. Foi revoltante. O poder público municipal levou a culpa..
    No local do Mercado, foi construída a Agência Centro do Banco do Brasil,

    Sobre o Mercado de que trata o seu excelente texto, não me proponho a falar, pois não domino a matéria.
    Achei ótimo o vocabulário tupi-guarani usado por você, pois me obrigou a pesquisar o significado de algumas palavras..

    .O negócio é pensar no “prafrentemente” e esquecer o pratrasmente., .

    Grande abraço e desculpe as mal traçadas linhas!…
    Um ótimo domingo!,

    • Ah, Violante, você deixa este caeté pubo de orgulho pelas suas lisonjas. Mas, pratrasmente e prafrentemente só consigo ver tragédia. Não tem o menor risco de Pindorama dar certo com os políticos que temos.

  5. O que esperar de um ministro da Economia que não sabe a diferença entre CVM e CMN e admitiu que não sabe porra nenhuma de ECONOMIA? Nós os “curibocas” estamos é lascados!

  6. Pingback: ADAIL AUGUSTO AGOSTINI – ALEGRETE-RS | JORNAL DA BESTA FUBANA

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