Entender economia não deveria ser difícil. Basta observar o comportamento humano em relação a tudo que chamamos “bens” ou “riqueza” e aplicar a lógica. O problema é que no mundo moderno existe muito poder e dinheiro em jogo, e acaba sendo vantajoso para alguns confundir as coisas. Graças ao controle dos donos do poder sobre a mídia e a escola, a confusão acaba sendo tão grande que alguns acabam acreditando nas mentiras que eles mesmos inventaram.
Por exemplo: o Japão é um país com uma economia estagnada há mais de vinte anos. Sua dívida é uma das maiores do mundo: 266% do PIB (se fosse uma pessoa, seria equivalente a ter uma dívida 30 vezes maior que o salário mensal). Outro problema é que os gastos do governo representam 45% do PIB, o que significa que o “PIB real” é apenas a metade do que parece ser, porque o governo não produz riqueza, apenas toma de quem produz e repassa.
A lógica diria que o primeiro passo para resolver um problema de dívida é parar de se endividar, mas parece que o governo do Japão não acredita nisso. No final de novembro foi aprovada uma emenda adicionando ao orçamento do governo a quantia de 92 bilhões de dólares. De onde virá esse dinheiro? Do aumento da dívida. E para que será usado? Para bancar auxílios a famílias de baixa renda, subsídios aos combustíveis e outras “bondades” do tipo.
Ao anunciar a medida, o primeiro-ministro Shigeru Ishiba defendeu a atual política de subsídios e de aumento do salário mínimo dizendo ““Precisamos que os salários aumentem mais rapidamente do que a taxa de inflação para tornar as famílias mais ricas”. É o tipo de frase que merece o comentário “seria cômico se não fosse trágico”, e tem tudo a ver com a charge lá do início.
O mais irônico é que o governo japonês, como praticamente todos, segue uma porção de dogmas econômicos que incluem acreditar em algo chamado “inflação de demanda”, que diz que o aumento de preços é causado por um aumento de consumo. É um dogma inútil porque não explica como o poder de consumo pode simplesmente aumentar de uma hora para outra. Mas quem acredita nele não deveria ao mesmo tempo dizer que acredita que é possível aumentar os salários via canetada sem causar inflação. O que pode aumentar os salários é o aumento de produtividade, e a coisa mais importante que o governo pode fazer para ajudar é não atrapalhar, reduzindo impostos, burocracias e restrições populistas e eleitoreiras.
Outro dogma comum aos governos é falar em “equilíbrio fiscal” como eufemismo para “aumento de impostos”. Em visita ao Japão no ano passado, a vice-diretora do FMI Gita Gopinath disse: “Nossa mensagem geral é que qualquer aumento nos gastos deve ser enfrentado com um aumento nas receitas.” Não é preciso dizer que falar em aumento de impostos em uma economia estagnada é como oferecer um copo d´água a alguém que está se afogando, mas o mundo financeiro se esforça para não perceber isso.
A tara por impostos leva a um terceiro dogma: na maioria dos artigos sobre a economia do Japão, é dado como certo que a maior causa da estagnação da economia é o “baixo consumo” e que o governo deve tomar providências para estimulá-lo. Ora, um país como o Japão, altamente industrializado e com uma população de excelente nível educacional, tem tudo para ser muito produtivo. E o que enriquece um país é produzir riqueza, não consumir, até porque aquilo que não é consumido internamente pode ser exportado. Mas o problema é outro: é muito mais fácil tributar consumo interno do que exportação, e é mais útil em termos eleitorais subsidiar crédito para consumo. Daí a importância para o governo do pacote de 92 bilhões recém-aprovado.
O caso do Japão é apenas mais um entre tantos países (quase todos, na verdade) que se metem a inventar dogmas econômicos para justificar suas burradas. A longo prazo, porém, todos descobrirão a verdade de um velho adágio: “É possível ignorar a realidade, mas não é possível ignorar as consequências de ignorar a realidade”.