Guilherme Macalossi
Inconformada com o Nobel da Paz, Telesur acusou María Corina Machado de fomentar a violência na Venezuela e as sanções contra o país
A Venezuela já havia mergulhado numa ditadura militar de esquerda quando, numa sessão do simulacro legislativo que havia restado, a então deputada Maria Corina Machado, agora ganhadora do Nobel da Paz, se levantou para contestar as mentiras em série e o cinismo de Hugo Chávez, que já falara sem parar por horas consecutivas sobre um país que existia apenas na propaganda bolivariana, mas que, na prática, se fechava na perseguição a oposição, restringia o direito de propriedade e condenava o povo a carestia e a miséria.
Levantou-se, dando de ombros para as vaias, os gritos e o deboche dos áulicos e sicários do regime. Olhou nos olhos do ditador e disse em tom firme, sem tergiversar: “A Venezuela decente é aquela que não quer, definitivamente, avançar em direção ao comunismo, quer respeito pela propriedade, e queremos uma Venezuela solidária, uma Venezuela de justiça, uma Venezuela de melhorias. (…) Diga a verdade à Venezuela. Aqui está uma Venezuela decente, que quer uma transformação profunda e é hora de enfrentar o desafio histórico com seriedade e responsabilidade, que está a nossa frente. O seu tempo acabou. É hora de uma nova Venezuela”.
Essa sua disposição ao enfrentamento, evidenciada incontáveis vezes na luta contra o arbítrio de burocratas sanguinolentos, apenas ressalta a fibra moral que lhe fez a representante maior de um movimento político de resistência a um dos regimes mais brutais e corruptos do mundo. A longa trajetória de heroísmo e destemor foi reconhecida nessa sexta, dia 10 de outubro, com um merecido prêmio Nobel da Paz.
O Nobel que ela recebeu serve não apenas de reconhecimento ao seu trabalho em prol da liberdade, mas também para denunciar os crimes contra a humanidade cometidos que se tornaram o verdadeiro plano de governo do chamado “socialismo do Século XXI”, hoje liderado por Nicolás Maduro, discípulo menos sofisticado, mas não menos celerado de Chávez.
Em seu comunicado de oficialização do prêmio, o Comitê Nobel Norueguês ressaltou que “a democracia é uma condição prévia para a paz duradoura”, e que “quando líderes autoritários tomam o poder, é essencial reconhecer os defensores da liberdade que se erguem e resistem”.
Ao receber, via telefone, a informação de que seria agraciada com o Nobel, Maria Corina, que hoje vive na clandestinidade, reagiu emocionada, sem encontrar as palavras necessárias para expressar o que sentia. Mas não era necessário dizer coisa alguma. Afinal, o que lhe fez ganhadora do Nobel da Paz já havia sido dito na cara do tirano que inaugurou um regime que oprime e marginaliza seus compatriotas na Venezuela. O Nobel dá proporção às coisas. Celebra uma heroína da América Latina e destaca a podridão de uma ditadura condenada desde já ao lixo da história.