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Editorial Gazeta do Povo

nobel da paz Maria Corina Machado

María Corina Machado, em foto de arquivo durante manifestação de rua contra a ditadura de Nicolás Maduro: líder oposicionista ganhou o Nobel da Paz de 2025

O comitê que seleciona os ganhadores do Prêmio Nobel da Paz foi extremamente feliz ao escolher María Corina Machado, líder das forças democráticas da Venezuela, para receber a honraria neste ano. Este é um reconhecimento justo pela luta incansável não apenas dela, mas de todos os venezuelanos comprometidos com a democracia, e empenhados em devolvê-la ao país hoje governado pelo ditador de esquerda Nicolás Maduro. Com o prêmio, ela se junta a outros notáveis dissidentes, também perseguidos por governos autoritários e totalitários, como o alemão Carl von Ossietzky (premiado em 1935), o soviético Andrei Sakharov (1975), o argentino Adolfo Pérez Esquivel (1980), o polonês Lech Wałęsa (1983), a birmanesa Aung San Suu Kyi (1991) e o chinês Liu Xiaobo (2010).

No curto texto publicado pelos responsáveis pelo Nobel da Paz, María Corina é reconhecida por “manter acesa a chama da democracia em meio à escuridão crescente”. Uma descrição certeira do cenário da Venezuela, cujo povo vive esmagado pela ditadura bolivariana há mais de uma década. O regime de força, iniciado ainda sob Hugo Chávez, intensificou-se após sua morte e a ascensão de Nicolás Maduro ao poder, em 2013. Maduro completou o processo de silenciamento da imprensa independente e de cooptação do poder armado – o oficial e o paramilitar – e dos demais poderes, garantindo o poder absoluto.

Foi contra esse estado de coisas que María Corina e outros líderes democráticos, como Henrique Capriles, Leopoldo López, Antonio Ledezma e Juan Guaidó, têm lutado. Eles organizaram massivos protestos de rua – não raro reprimidos com violência pelo chavismo – e, em 2015, conseguiram uma vitória notável, formando maioria na Assembleia Nacional. A vitória, no entanto, não trouxe nenhum avanço significativo em direção à restauração da democracia na Venezuela, já que o Judiciário chavista barrava qualquer iniciativa do Legislativo. Depois de 2015, Maduro jamais voltou a correr o risco de sair derrotado de um pleito, fraudando sucessivas eleições presidenciais, legislativas e regionais.

María Corina foi protagonista na mais recente “eleição” presidencial venezuelana, em 2024. Escolhida nas primárias da oposição, com maioria esmagadora, e líder nas intenções de voto segundo praticamente todas as pesquisas de opinião, ela teve seu registro negado pelo Conselho Nacional Eleitoral (dominado pelos aliados de Maduro) de forma arbitrária, com uma denúncia antiga sendo requentada para produzir uma inelegibilidade de 15 anos. As justas reclamações de María Corina foram alvo de chacota de um famoso aliado de Maduro: o presidente Lula, para quem a oposicionista estava apenas “chorando”. Sem opção, as forças democráticas indicaram Edmundo González Urrutia – mesmo sendo relativamente desconhecido, ele venceria a eleição, mas não assumiria o poder, graças a mais uma fraude de Maduro.

Perseguida por Maduro e pela Justiça venezuelana, María Corina precisou se esconder por alguns meses, até reaparecer em janeiro deste ano, em um grande protesto popular em uma cidade próxima a Caracas, depois do qual foi sequestrada, sendo libertada horas depois. A ditadura de Maduro negou qualquer envolvimento com o episódio, mas a comunidade internacional não acreditou e fez cobranças duras ao regime bolivariano – já o Brasil de Lula permaneceu calado. E, se tratamos aqui do petista, é porque ele ajudou a dar legitimidade ao mesmíssimo regime que hoje persegue María Corina e seus colegas de luta pela democracia. Ainda que hoje os laços entre Lula e Maduro não sejam tão estreitos, o brasileiro não perdeu nenhuma oportunidade de limpar a barra do amigo venezuelano, recebendo-o com tapete vermelho em Brasília, afirmando que ele era vítima de “narrativas”, e recusando-se a condenar a fraude de 2024.

Em um mundo repleto de conflitos que atraem atenção global, o Nobel da Paz para María Corina Machado envia uma mensagem poderosa, recordando-nos que há muitos outros locais onde a força bruta também se impõe, produzindo catástrofes humanitárias. O chavismo não só instaurou uma ditadura na Venezuela; ele criou um povo pobre, faminto e desesperado, que foge aos milhões do inferno construído em nome do “socialismo do século 21”. O prêmio é um sinal de que os venezuelanos não serão esquecidos; que ele renove as energias de todos aqueles que se empenham em restaurar a democracia na Venezuela – e, por que não?, em outras nações latino-americanas onde a tirania também está instalada.

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