MAGNOVALDO BEZERRA - EXCRESCÊNCIAS

Avião da antiga VASP

Um dos grandes amigos, daqueles “brothers” mesmo, Benjamim H., era conhecido entre nós como o “Besouro”, tal a intensidade e baixa frequência de sua voz. Não existia nenhuma maneira de ignorá-la quando Benjamim falava.

Éramos colegas de trabalho em uma empresa metalúrgica em São Paulo, ele na área comercial e eu na industrial.

Em meados do ano de 1990 fomos instruídos a ver um Cliente em Joinville, SC, onde algumas questões técnico-comerciais reclamavam nossa presença. No dia marcado, uma segunda-feira, já estávamos dentro do avião da VASP às 8 horas, esperando a decolagem que deveria ocorrer às 8:30. Para matar o tempo, Benjamim vasculhava a seção de autos no jornal do domingo para decidir o preço a pedir pelo seu Opala, que seria posto à venda no final de semana seguinte.

E nada de o avião decolar.

Atrás de nós um casalzinho recém casado estava indo em lua-de-mel para o sul, pombinhos arrulhando suaves murmúrios preparatórios para os doces embates a serem travados nos aconchegantes rincões sulistas.

E nada de o avião decolar.

Os passageiros começavam a ficar nervosos.

Imaginávamos que o tempo fechado era a causa da demora na partida, mas uma comissária, aperreada com as queixas dos passageiros e pedindo desculpas, informou que a causa da demora era a falta da tripulação técnica. Era, na verdade, a falta do comandante, que estava atrasado para o voo.

Bem, depois de mais de meia hora chegou a tal tripulação técnica: era um baixinho enfezado, com a cara trancada, que subiu a escada do avião de quatro em quatro degraus, não cumprimentou ninguém, entrou direto na cabine, já ligou os motores enquanto a porta era fechada e nem esperou que eles esquentassem. O avião foi direto para a cabeceira da pista, começou a acelerar antes de fazer a curva do início da pista, engatou uma quinta e embicou para as nuvens com toda a potência. Cinco minutos depois o avião entrou em uma nuvem de tempestade exatamente quando deixou de subir e nivelou o voo, passando a sofrer forte turbulência. Com tudo isso acontecendo o silêncio dentro do avião ficou estrondoso.

Quero dizer, silêncio total até quando o Benjamim, sabendo do preço declinante do seu Opala, disparou seu vozeirão e apregoou alto em bom som:

– Ih, Magno, está caindo!

O casalzinho atrás esbugalhou os olhos e a jovem recém casada dirigiu-se para meu colega e, mais branca que bunda de norueguês, perguntou quase chorando:

– Moço, é sério que o avião está caindo?

Claro, meu colega e amigo estava se referindo ao preço dos Opalas usados, mas sua voz poderosa, em função das circunstâncias, ressoou com um sentido diferente. Após a explicação, houve um suspiro generalizado de alívio. Chegamos a Joinville sem maiores problemas.

Tenho certeza de que a lua de mel do jovem casal ocorreu da maneira mais feliz possível.

4 pensou em “UM VOO DA VASP PARA JOINVILLE, SC

    • Maurício: obrigado pela sua gentileza.
      Pela cara do rapaz, lembro-me perfeitamente, a lua de mel teria sido consumada ali mesmo no avião se o próprio estivesse caindo!
      Tenha um ótimo final de semana.

  1. Com a ameaça de queda da aeronave, o que também deve ter caído foi um apetrecho do noivo, para tristeza da moça recém-casada. Para o bem de todos e felicidade geral do casal, a queda foi apenas um susto.

    • Oi Francisco:
      Acho que o apetrecho não caiu porque havia se transformado em uma pequena larva de borboleta que ficou grudada no casulo!!!

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