CÍCERO TAVARES - CRÔNICA E COMENTÁRIOS

Em 1946, Andy Dufresne, um banqueiro jovem, inteligente e bem sucedido, tem a sua vida devastada, ao ser condenado à prisão perpétua por dois crimes que nunca cometeu: o homicídio de sua esposa e do amante dela. Ele é mandado à Penitenciária Estadual de Shawshank, no Maine, prisão que é o pesadelo de qualquer detendo. Lá ele irá cumprir a duas prisões perpétuas por cada crime cometido. Andy logo será apresentado a Warden Norton, o corrupto e cruel agente penitenciário, que usa a Bíblia como arma de controle e ao capitão Byron Hadley, que trata os internos como animais. Andy faz amizade com Ellis Boyd Redding – Red (Morgan Freemen), um prisioneiro que cumpre pena de 20 anos e controla o mercado negro dentro da instituição.

O cotidiano da prisão de Shawshank e as relações de seus presos são o mote para uma comovente e impactante história sobre o poder da esperança e da LIBERDADE no íntimo dos seres humanos.

Na produção em questão, o drama emerge da luta de um homem contra as prisões física e simbólica que se erguem ao seu redor e em seu interior.

Tudo começa com o conto ‘Rita Hayhorth e a Redenção de Shawshank’ publicado no livro ‘Quatro Estações.’ Na narrativa, o bem sucedido banqueiro Andy Dufresne (Tim Robbins) é condenado injustamente pelo assassinato da esposa e do amante dela e levado para a penitenciária de Shawshank, no Maine. Sua pena: a prisão perpétua em um lugar que é o pesadelo dos detentos. A rotina é terrível por conta da crueldade do diretor e dos guardas, mas também pode oferecer a amizade com Red (Morgan Freeman), preso que lidera um dos grupos da prisão e arranja clandestinamente objetos pedidos pelos colegas.

Os males do encarceramento são rapidamente identificados como obstáculos à plena liberdade de Andy Dufresne e dos demais. O isolamento em relação à sociedade, as punições severas representadas pelas penas longas ou pela prisão perpétua e o confinamento garantidos pelos muros, cercas e guardas já são suficientes para expressar a adversidade dos presos.

Porém, o filme vai além e também expõe o autoritarismo do diretor Warden (Bob Gunton), quando se apresenta aos novos detentos como um administrador apegado à disciplina e à sua própria compreensão da Bíblia, e a truculência do guarda Hadley (Clance Brown), quando espanca um recém-chegado até a morte por chorar à noite na cela. Personagens e espectadores não só se sentem intimidados, como também sentem a ameaça de Shawshank nas tomadas áreas do pátio e no enquadramento engrandecedor do local durante a chegada do protagonista.

Além das figuras de autoridade, os próprios residentes da penitenciária também representam algum tipo de ameaça. O costume dos presos mais antigos de provocar os novos eleva a situação de tensão já existente, como se percebe na sequência em que apostam quem seria o primeiro a ceder às pressões da primeira noite. Seguindo o mesmo sentido, a tradição de formar diferentes grupos que protegem seus membros e intimidam ou agridem os outros detentos é outra prática feita pelos condenados que desestabilizam o enclausuramento. Quem não se encaixa em algum dos grupos eventualmente passa por problemas sérios. É isso que acontece com Andy, inicialmente um solitário violentado pelo grupo dos homossexuais, até se aproximar de Red e fazer parte de seu grupo.

A prisão de Shawshank ainda afeta aqueles que cumprem sua pena em uma dimensão inconsciente e intimista. Um longo período aprisionado faz com que os homens vivenciem e naturalizem uma rotina que dá alguma regularidade, alguma certeza às suas vidas (mesmo que seja ruim e adversa): passam bastante tempo nas celas, tomam banho de sol, interagem com os outros presos, se alimentam nos salões nos salões de refeição e enfrentam as autoridades do lugar.

Estar muito tempo encarcerado e consolidar essa rotina como um hábito cria o que Red chama de preso “institucionalizado”, isto é, alguém que não sobreviveria fora da prisão por não conseguir se adaptar a um ambiente de liberdade. Brooks e Red, os presos mais antigos da penitenciária, sintetizam as sensações de um ex-preso que recupera a liberdade, mas não reconhece mais o mundo lá fora nem sabe como agir nele – daí, vem um vazio que os faz preferir a familiaridade que a prisão desperta.

É possível enfrentar o mal gerado pela penitenciária através da sociabilidade entre os criminosos. O sentimento de coletividade confere alguma força para lidar com a privação da liberdade ao ajudar no compartilhamento de experiências, além de humanizar os personagens: são brincadeiras e interações entre eles e que promovem a identificação junto ao público, apesar de serem homens condenados por crimes violentos.

Desse modo, a atuação de Morgan Freeman é fundamental para tornar Red uma forte base emocional da narrativa, sendo o sujeito extrovertido e astucioso que contrabandeia objetos para a prisão, desfruta de alguns privilégios e ainda estabelece uma rica amizade com Andy.

Andy é o oposto de Red: silencioso, cultíssimo, observador, taciturno, por vezes, frio e incompatível com a prisão onde está. Mas, à medida que sua personalidade e suas virtudes se revelam, surge outra possibilidade para enfrentar as pressões do encarceramento: a força interior do homem – é ela que faz o protagonista conquistar privilégios ao fazer o imposto de renda dos guardas e do diretor e organizar a biblioteca. É uma força tão marcante que o próprio homem explica ao amigo o porquê de ter tantas esperanças e Red em uma narração em off comenta como Andy sempre precisa ocupar sua cabeça com algo normal e corriqueiro. Tamanha complexidade não seria possível sem a performance contida e poderosa de Tim Robbins.

Jamais soando apelativo, “Um Sonho de Liberdade” é uma belíssima experiência cinematográfica sobre a luta do homem pela esperança e pela liberdade, mesmo em meio às injustiças e à opressão do sistema prisional. De tão poderoso que é, o filme não precisa utilizar elementos fantásticos, no sentido de sobrenatural, para ser chamado de fantástico. Ele é assim graças à excelência que carrega em sua humanidade.

Um sonho de liberdade – trailer legendado

UM SONHO DE LIBERDADE (The Shawshank Redemption, 1994) – Ocupe-se vivendo…

4 pensou em “UM SONHO DE LIBERDADE (1994), UM CLÁSSICO

  1. Tem algumas cenas neste excelente filme que eu nunca esqueço. Aliás, três.
    A primeira delas, é quando o personagem Brooks Hatlem, sai da prisão em condicional e vai morar em um apartamento; Trabalhando, ele descreve em uma carta, a situação em que está vivendo. Infelizmente, comete suicídio, enforcando-se. Na prisão, os amigos estão lendo a carta que ele deixou.
    Red, simplesmente diz que ele, o Brooks, era importante lá na prisão e que ele havia se institucionalizado, pois a vida dele foi toda ali dentro; Outra cena, no diálogo de Dufrasne com o Red, ele faz Red prometer que quando sair, procure um certo lugar, no estado americano do Maine. Lá, há algo para ele. Após esse diálogo, os amigos conversando, Red, diz que está preocupado pois o amigo não apareceu e aí ele declara que todo homem tem um limite. E o limite do Andy, já tinha se esgotado.
    A terceira situação é quando Andy começa a quebrar o cano do esgoto, sob a narração de Red; O desfecho é que o Red diz: “Andy Dufrasne!! Atravessou 400 metros de um cano cheio de fezes e saiu limpo do outro lado.” Nesta hora, vê-se Andy com os braços levantados e a chuva o está limpando.
    Este é um clássico que todos os que amam cinema, devem assistir.
    Outra cena icônica é quando Andy coloca uma ópera e todos no presídio param para ouvir aquilo. Ali sim, foi um momento de liberdade ímpar. Passou mais de 30 dias na solitária, mas estava acompanhado de Mozart e tantos outros gênios da música, pois disse que mesmo aprisionado lá, ninguém consegue tirar a música do coração de um homem. Perfeito.

  2. Bom dia, mauriniojunior: Um Sonho de Liberdade!

    É tipo do filme que tem uma história incrível, com excelentes atuações e desenvolvimento dos personagens. O cenário ambientado no presidio é realmente incrível. E mostrar o lado humano de alguns presidiários. Foi sensacional. Conseguiu mostrar as injustiças e mafias que acontecem dentro de presídios. E os maléficos e problemas a punição de uma prisão perpetua com uma legislação falha, que muitas vezes acontece de forma totalmente errada e inocentes são condenados. E mostra a falta de preocupação da inserção dos presidiário na sociedade. A falta de estimulo e incentivo! É um filme com personagens bem peculiares, atuações convincente e ótimos diálogos. E o final é incrível, a genialidade de Andy é impressionante.

    E saber que esse foi o primeiro filme dirigido por Frank Darabont.

  3. Caro amigo Ciço.

    Escrevo e estudo sobre cinema há mais de 50 anos, e acho que tenho autoridade suficiente para parabenizar o amigo por esse
    excelente trabalho.
    Eu não o faria melhor, apesar da minha grande experiência no assunto.
    O seu trabalho descrevendo o filme é tão perfeito que, confesso, já vi esse filme talvez umas 10 vezes e fiquei tão empolgado com o seu
    artigo que voltei a assistir o filme novamente.
    Só peço ao amigo, que modestamente me autorize a assinar embaixo,
    dessa análise sobre o filme, o que me faria muito orgulhoso de participar novamente de um artigo seu, pois me lembro que o
    amigo começou a escrever sobre filmes, num passado não muito remoto.
    quando me convidou a participar com alguns comentários sobre
    cinema, o que fizemos com algum sucesso, creio eu.
    Depois não perdi nenhuma crônica sua sobre filmes e fiquei muito
    feliz quando o amigo escreveu aquele excelente artigo sobre o
    filme ganhador do Oscar ” OS IMPERDOÁVEIS “, UMA OBRA PRIMA
    CINEMATOGRÁFICA, DIRIGIDO PELO TALENTOSO CLINT EASTWOOD.
    ESTOU CERTO QUE O AMIGO ENCONTROU O CAMINHO CERTO PARA AS SUAS CRÔNICAS, e peço que continue pois o seu
    trabalho é de excelente qualidade.
    Aconselho ao amigo procurar o filme COMO ERA VERDE O MEU VALE, um clássico filme em preto e branco dirigido pelo mestre John Ford e que ganhou o Oscar de melhor filme do ano.
    Abraços.

  4. Estimado comentarista D.Matt.,

    Boa tarde e muito obrigado pela participação.

    Curiosidades dos bastidores de Um Sonho de Liberdade.
    Um Sonho de Liberdade foi o primeiro filme dirigido por Frank Darabont.
    A intenção inicial dos produtores era que o ator Brad Pitt interpretasse o personagem Tommy Williams, o que acabou não ocorrendo. Uma decisão sensata, pois iria estragar o filme como todo.
    Na história de Stephen King em que Um Sonho de Liberdade foi baseado, o personagem Ellis Boyd Redding era irlandês. Este detalhe foi retirado do filme após a contratação de Morgan Freeman para interpretar o personagem.
    Boa parte de Um Sonho de Liberdade foi rodado na Penitenciária Estadual de Mansfield, em Ohio, que estava desativada na época das filmagens. Como a penitenciária estava em péssimas condições, foi necessário que se fizesse uma pequena reforma que deixasse o local em condições para que se pudesse ali rodar um filme.
    Prêmios
    OSCAR
    1995
    Indicações
    Melhor Filme
    Melhor Ator – Morgan Freeman
    Melhor Roteiro Adaptado
    Melhor Fotografia
    Melhor Edição
    Melhor Trilha Sonora Original
    Melhor Som.
    GLOBO DE OURO
    1995
    Indicações
    Melhor Ator – Drama – Morgan Freeman
    Melhor Roteiro.

    Tudo isso só engrandece mais ainda Um Sonho de Liberdade, tornando-se o clássico dos clássicos.

    Prometo para para daqui a 15 dias uma resenha sobre Como Era Verde o Meu Vale – do genial John Ford. Outro clássico.

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