ARISTEU BEZERRA - CULTURA POPULAR

Nas minhas manhãs preciso
Além dos beijos dos ventos,
Um sol feito de sorrisos
Nos meus amanhecimentos.

Ódio da lembrança eu varro,
Rancor eu nunca guardei,
Por saber que eu vim do barro
E a ele retornarei.

Quando o sol descamba o muro
Em busca da noite fria,
O céu se veste de escuro
E assiste a morte do dia.

Quando a minha fé se cansa
Eu não lamento nem choro,
Há um bastão de esperança
Onde me firmo e me escoro.

Mesmo sem gostar de atraso
Que em nada traz vantagem,
Peço a Deus que adie o prazo
Da minha última viagem.

Saudade é como um descaso
Onde a injustiça se gera,
Fazendo aumentar o prazo
Do tempo de quem espera.

Com elaboradas frases
E o dom divino e profundo,
Os poetas são capazes
De interpretar o mundo.

Geraldo Amâncio Pereira é poeta, repentista, trovador, cordelista e contador de causos. Nascido no sítio Malhada da Areia, município do Cedro, Ceará, em 29 de abril de 1946. Cursou Faculdade de História em Fortaleza. Começou com acompanhamento de viola em 1966. Participou de centenas de festivais em todo o país conseguindo se classificar mais de 150 vezes em primeiro lugar. Organizou festivais internacionais de repentistas e trovadores, além do festival Patativa do Assaré. É autor de três antologias sobre cantoria em parceria com o poeta Vanderley Pereira. Gravou 15 CDs ao longo da carreira, além de ter publicado cordéis em livros. Apresentou o programa dominical “Ao som da Viola”, na TV Diário em Fortaleza.

12 pensou em “TROVAS DE GERALDO AMÂNCIO

  1. Admiro o repentista e poeta Geraldo Amâncio por conseguir criar em uma estrofe de quatro versos poesia de qualidade. Não há quem não se sensibilize com esta maravilhosa trova: Mesmo sem gostar de atraso/Que em nada traz vantagem,/Peço a Deus que adie o prazo/Da minha última viagem.

    • Dione,

      Grato por seu formidável comentário. Aproveito esse espaço democrático do Jornal da Besta Fubana para compartilhar Geraldo Amâncio glosando o mote:

      Sou feliz porque sou representante
      Da cultura mais bela do país

      Tenho toda razão de ser contente
      Pelo dote que Deus me ofereceu
      Eu não troco esse dom que Deus me deu
      Por riqueza, nem cargo e nem patente
      Luis Lula da Silva é presidente
      Com certeza eu sou muito mais feliz
      Que eu não troco no posto de Luis
      Estes versos que canto neste instante.
      Sou feliz porque sou representante
      Da cultura mais bela do país.

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  2. Acompanho a carreira desse repentista cearense há muito tempo. Contribuo com informações sobre esse dedicado poeta e repentista que mesmo com o sucesso é humilde e atende ao público com prazer. Geraldo Amânci nasceu no interior do Ceará e começou a cantar repente por volta dos 18 anos. Hoje, 50 anos depois, soma participação em mais de 200 festivais competitivos de cantoria em todo o Brasil, saindo vencedor de 150 deles. É membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel e da Casa do Cantador, em Fortaleza.
    O artigo sobre as trovas de Geraldo Amâncio é uma homenagem ao seu talento. Se fosse escoher a mais bela, ficaria em dúvida, entretanto a que mais me impressionou foi esta pérola: Com elaboradas frases/E o dom divino e profundo,/Os poetas são capazes/De interpretar o mundo.

    • Rafael,

      Rafael,

      É gratificante receber suas considerações a respeito da história do repentista, poeta, trovador, cordelista e contador de causos Geraldo Amâncio. Suas observações complementam o meu artigo na singela homenagem que presto a esse polivalente talento da poesia popular e do repente.
      Compartilho um episódiro poético ocorrido com Geraldo Amâncio para abrilhantar o seu ótimo comentário. O grande mestre da comunicação, Geraldo Freire, quando trabalha na rádio Jornal do Comércio em Recife, sugeriu ao poeta Geraldo Amâncio Pereira, o seguinte mote:

      Quando chove no sertão,
      Tem festa para os meninos.

      O poeta cearnse fez esta belíssima estrofe:

      Quando o nevoeiro grosso
      Manda chuva, a meninada,
      Brinca na terra molhada,
      Tibunga dentro do poço.
      Inventa curral de osso,
      Ossos grossos e ossos finos,
      Faz açudes pequeninos
      botando terra com a mão.
      Quando chove no sertão
      Tem festa para os meninos.

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  3. Estou ficando assíduo na leitura dessa coluna. O artigo sobre as trovas de Geraldo Amâncio me deixaram encantada. A poesia popular e o repente tem o dom dar o recado com versos devidamente metrificados tornando as estrofes com ritmo que agrada aos nossos ouvidos. Considero esta trova a mais significativa: Ódio da lembrança eu varro,/Rancor eu nunca guardei,/Por saber que eu vim do barro/
    E a ele retornarei.

    • Marina,

      Agradeço suas generosas palavras que me incentivam no prazeroso trabalhor de pesquisar a cultura popular e o maravilhoso mundo do repente. Geraldo Amâncio Pereira é um poeta diferenciado. Além de cantador e repentista ele é pesquisador, palestrante e profícuo divulgador da cultura nordestina, tanto em prosa quanto em versos. É autor de três antologias sobre cantoria em parceria com o poeta Vanderley Pereira. Gravou 15 CDs ao longo da carreira, além de ter publicado cordéis em livros. Apresentou o programa dominical “Ao som da Viola”, na TV Diário em Fortaleza.

      Compartilho com a prezada amiga um dos mais criativos Galope à beira-mar, que conheço, de autoria de Geraldo Amâncio:

      O mundo se encontra bastante avançado
      A ciência alcança progresso sem soma
      Na grande pesquisa que fez do genoma
      Todo o corpo humano já foi mapeado
      No mapeamento foi tudo contado
      Oitenta mil genes se podem contar
      A ciência faz chover e molhar
      Faz clone de ovelha, faz cópia completa
      Duvido a ciência fazer um poeta
      Cantando galope na beira do mar.

      Saudações fraternas,

      Aristeu

  4. O potencial do talento de Geraldo Amâncio é melhor evidenciado assistindo uma apresentação presencial ou um dos vídeo dos muitos gravados por esse fenômeno do repente. Ele possui uma qualidade excepcional de valorizar os jovens que estão iniciando no repente evitando uma disputa desnecessária entre a geração mais antiga e os futuros cantadores de viola. A postura de Geraldo Amâncio é influenciada pela formação católica que segue desde a mais tenra idade.
    O artigo com as trovas de Geraldo Amâncio dá um exemplo de criatividade, poder de síntese e beleza poética. Esta trova é uma das belas: Saudade é como um descaso/
    Onde a injustiça se gera,/Fazendo aumentar o prazo/Do tempo de quem espera.

  5. Edmilson,

    Sinto-me alegre com suas observações sobre o talentoso Geraldo Amâncio. Você descreveu muito bem a generosidade do repentista cearense com os colegas que estão iniciando a difícil arte do repente. Corporativismo existe em todas as profissões, entretanto ter um comportamento ético e assistencial é raro, principalmente, nesses tempos difíceis.

    Aproveito a oportundidade para contar um episódio sobre a admiração de Geraldo Amâncio pelo grande escritor paraibano Ariano Suassuna (1927 – 2014).
    Geraldo considerava Ariano seu professor de cultura nordestina.Então, resolveu fazer uma homenagem em versos que compartilho com o prezado amigo:

    Ariano Suassuna

    Onde a cultura é tribuna
    sua voz foi a mais alta,
    houve o primeiro mas falta
    o segundo Suassuna.
    Parte e deixa uma lacuna
    que não será preenchida.
    Sua forma definida
    na maneira de escrever,
    não tinha como dever
    mas como missão de vida.

    Com originalidade
    a sua missão cumpriu
    foi quem melhor traduziu
    nossa nordestinidade.
    Porta-voz e autoridade
    Dos valores culturais.
    das fontes originais
    um divulgador constante,
    como um cavaleiro andante
    dos tempos medievais.

    Cronista do dia a dia,
    um defensor ardoroso
    das estórias de trancoso,
    elas crenças, da remaria.
    Repórter da cantoria,
    do cordel, do desafio.
    sem ele até desconfio
    que morre a nossa memória,
    e o circo da nossa história
    poderá ficar vazio.

    Muitas vezes contestado
    ele cansou de dizer
    que a arte não pode ser
    um produto de mercado.
    Sempre que era perguntado
    dizia de forma honesta,
    sem rodeio, sem aresta,
    sem sofisma, sem engodo,
    que a arte é no seu todo:
    vocação, missão e festa.

    “Auto da compadecida”
    sua mais famosa peça,
    termina como começa
    contando os dramas da vida.
    Inspirada e extraída
    do mundo cordeliano.
    O mestre paraibano
    teatrólogo e ensaista,
    era também cordelista
    o genial Ariano.

    Nos seus trabalhos defende
    um Brasil mais brasileiro,
    contra o modismo estrangeiro
    que a mídia comprada vende.
    Brasil onde o inglês pretende
    ser o idioma oficial.
    Nos trazendo grande mal,
    fazendo morrer à míngua
    o encantamento da língua
    que herdamos de Portugal.

    Nas palestras que fazia
    com humor e fundamento
    esbanjou conhecimento,
    semeou sabedoria.
    Era quem mais conhecia
    o que o Brasil desconhece.
    Quando um astro se opaquece
    acaba-se a iluminura.
    O céu da nossa cultura
    sem esse astro escurece.

    Foi guardião da raiz
    da nossa ancestralidade,
    construiu a identidade
    cultural do meu país.
    Da terra agora distante,
    tornou-se então palestrante
    nas cortes celestiais.
    Hoje faz parte do time,
    da academia sublime
    dos mestres universais.

    Saudações fraternas,

    Aristeu

  6. Parabéns, Aristeu, pela excelente postagem TROVAS DE GERALDO AMÂNCIO!
    Gostei muito de conhecer a trajetória deste poeta repentista, trovador, cordelista e contador de causos, diferenciado e com formação acadêmica em História.

    Como você diz:

    “Começou com acompanhamento de viola em 1966. Participou de centenas de festivais em todo o país conseguindo se classificar mais de 150 vezes em primeiro lugar. Organizou festivais internacionais de repentistas e trovadores, além do festival Patativa do Assaré. É autor de três antologias sobre cantoria em parceria com o poeta Vanderley Pereira. Gravou 15 CDs ao longo da carreira, além de ter publicado cordéis em livros. Apresentou o programa dominical “Ao som da Viola”, na TV Diário em Fortaleza.”

    Sua postagem enriquece os conhecimentos do leitor e valoriza cada vez mais a cultura popular.

    Uma ótima semana, com muita saúde e Paz!

  7. Violante,

    Grato por seu competente comentário. Geraldo Amâncio afirma que seu dom de poeta é hereditário, herdou do avô paterno Manoel Amancio Pereira e do tio Amancio Pereira Lima. Ambos foram cantadores amadores. Despertou para o repente ao ouvir um programa de cantoria com os poetas Otacílio Batista e José Alves Sobrinho, na Rádio Clube do Recife – Pernambuco. Com José, seu irmão e outras crianças, faziam improvisos trabalhando na roça.

    Em 1962, surgiu o programa “Violas e Violeiros” com os poetas repentistas Pedro Bandeira de Caldas e João Alexandre Sobrinho. O último é o autor da melodia da “Triste Partida” do poeta e repentista Patativa do Assaré. Geraldo Amancio, tornou-se ouvinte assíduo do referido programa e aprendeu todas as modalidades da cantoria da época.

    Geraldo Amancio teve como primeiros parceiros na cantoria, seu tio Amancio Pereira, Zé Moacir, Francisco Batista (Azulão), Antônio Maracajá, Chico Crizanto e Pedro Bandeira. Participou de mais de 200 festivais competitivos de cantoria e ganhou mais de 150 primeiros lugares. Foi atração no Festival Mundial de poesia, nas Ilhas Baleares, região da Catalunha – Espanha, sendo o único repentista brasileiro a se fazer presente no grandioso evento, onde se apresentou com o famoso trovador Argentino, Gustavo Guichon.

    Compartilho três glosas criativas de Geraldo Amâncio sobre o seguinte mote:

    O nome de Deus tem sido
    Motivo de exploração.

    Grita o pastor e ameaça
    Com voz alta bem alerta
    Quanto maior a oferta
    Será bem maior a graça
    Eu tenho pena da raça
    Sem rumo e sem direção
    Dando dinheiro a ladrão
    Enriquecendo bandido
    O nome de Deus tem sido
    Motivo de exploração.

    Cristo pegou a pobreza
    E caridade como meta
    Mais esses falsos profetas
    Pregam progresso e nobreza
    Dizendo quer ter riqueza
    Venha ser o nosso irmão
    Quem ouvir o seu sermão
    Perde tudo e sai falido
    Que o nome de Deus tem sido
    Motivo de exploração.

    Um crente desavisado
    Vi na igreja outro dia
    Deu tudo que possuía
    A terra casa e o gado
    Deu depois que tinha dado
    O derradeiro tostão
    Calça camisa e calção
    Voltou pra casa despido
    O nome de Deus tem sido
    Motivo de exploração.

    Desejo uma semana com paz, saúde e a inspiração de sempre!

    Aristeu

  8. Obrigada, Aristeu, pela excelente explanação sobre o grande poeta cearense Geraldo Amâncio, e por compartilhar comigo estas três maravilhosas glosas da autoria dele, sobre o seguinte mote:

    “O nome de Deus tem sido
    Motivo de exploração.”

    Gostei imensamente das três.

    O talento de Geraldo Amâncio está no DNA, já que ele mesmo reconhece ter herdado dos seus ascendentes os dons da cantoria, do repente e do improviso.
    Não foi por acaso que ele “participou de mais de 200 festivais competitivos de cantoria e ganhou mais de 150 primeiros lugares”. E ainda, “foi atração no Festival Mundial de poesia, nas Ilhas Baleares, região da Catalunha – Espanha, sendo o único repentista brasileiro a se fazer presente no grandioso evento, onde se apresentou com o famoso trovador Argentino, Gustavo Guichon.”

    Considero o poeta Geraldo Amâncio um predestinado, como foi Patativa do Assaré.

    Desejo a você também uma semana com paz, saúde e inspiração!

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